PERFIL - O grupo tornou-se lendário por várias sobreviventes terem testemunhado que continuou a tocar, não só enquanto o Titanic se afundava, mas até no preciso instante em que uma grande vaga varreu três deles do convés.
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Sabem qual é a segunda maior banda musical saída de Liverpool e a mais famosa da pandemia da covid-19? Desde a semana passada contei 17 menções, entre notícias e artigos de opinião, à orquestra do Titanic, nove delas como metáfora à demora do Comité Olímpico Internacional em adiar Tóquio"2020 e as restantes sobre governos, direções-gerais e políticos diferentes.
O grupo tornou-se lendário por várias sobreviventes terem testemunhado que continuou a tocar, não só enquanto o transatlântico se afundava, mas até no preciso instante em que uma grande vaga varreu três deles do convés. Os cinco restantes foram levados, logo depois, para o fundo do Atlântico pelo navio que se afundava. O líder terá proferido, perante a morte iminente, a famosa frase: "Cavalheiros, ofereço-vos as minhas despedidas."
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Na verdade, a "orquestra" do Titanic consistia em dois conjuntos musicais, um terceto e um quinteto, este último dirigido pelo violinista Wallace Hartley, de 33 anos. Os primeiros tocavam no restaurante e no café do barco, os segundos animavam a hora do chá e os serviços religiosos. Quando a catástrofe aconteceu, Hartley (que havia pedido recentemente em casamento a menina Maria Robinson) juntou os companheiros e foram colocar-se num ponto central do convés principal do navio, tocando alegres canções - ainda segundo testemunhas - de "ragtime". A lenda diz que a última terá sido, no entanto, uma música religiosa: "Nearer, My God, to Thee" ("Mais perto, Senhor, de Ti").
Hartley era o mais velho dos oito elementos, que incluía um violoncelista francês de 20 anos, Roger Marie Bricoux, e um violinista belga de Spa, George Alexandre Krins, de 23 anos. No total, havia três violinistas, três violoncelistas, um baixista e um pianista. Todos faleceram, mas só três cadáveres foram encontrados, sendo um deles o de Wallace Hartley, a tempo de ser sepultado em Colne, a sua terra natal, com honras de Estado e perante, rezam as crónicas, 40 mil pessoas.
O naufrágio deu-se a 15 de abril de 1912. Noventa e quatro anos (2006) depois, foi encontrado num sótão um violino com manchas de água que precisou de uma década de verificação para se comprovar que era, misteriosamente, o que Hartley tocava no momento da morte. Em 2017, foi vendido num leilão de dez minutos por cerca de um milhão de euros. Com o tempo, a "orquestra" do Titanic tornou-se uma metáfora contraditória e muito injusta para a inércia ou indecisão em momentos de catástrofe. O Comité Olímpico Internacional não merecia o elogio, e muito menos Bolsonaro, presidente do Brasil.