Central icónico dos Estados Unidos, Alexi Lalas era apenas um amador que estudava música quando chegou à seleção. Saiu do anonimato com o seu estilo roqueiro e tornou-se um símbolo
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Não há conversas sobre a participação dos Estados Unidos no seu Mundial que não se alimentem do visual icónico de Alexi Lalas, de uma longa barba e um farto cabelo que o remeteram, por estereótipo, para palcos mais musicais do que futebolísticos. Sendo certo que o antigo defesa foi sempre um apaixonado pela música - estudava em Rutgers essa vocação quando foi identificado por Milutinovic para o processo de 1994 - por diferentes construções sonoras e bandas mais ruidosas, inclusive, nunca foi despiciente olhar aos seus recursos no campo, impondo-se como um central de porte atlético, exigente na marcação e com níveis de concentração que rapidamente o identificaram, após o Mundial de 1994, como escolha do Pádova, uma humilde equipa que acabara de regressar ao Calcio em 1994/95. O defesa, então com 25 anos, beneficiara dos seus grandes jogos pela seleção, cotando-se uma revelação na prova, pois meses antes constava apenas das fileiras do Rutgers Scarlet Knights, equipa associada a uma universidade eclética mas de pouco peso no futebol. É uma vida que se transforma e Lalas também patrocina, visionário na época ao perceber o futebol como uma indústria capaz de potenciar largos mediáticos através da imagem.
O defesa roqueiro treparia e atingiria patamar de exceção dentro do universo norte-americano. Entre o que significou e os proveitos que rendeu, Lalas é categórico sobre 1994. “Vivi, de forma inequívoca, o poder de um Mundial. Se estou a dar esta entrevista é por causa disso! Mudou a minha vida para sempre, passei de perfeito desconhecido a ídolo em toda a parte do mundo. Abriu e gerou imensas oportunidades, dentro e fora do campo. Nunca teria tido essas oportunidades crescendo nas décadas de setenta e oitenta”, admite e foca-se numa influência mais alargada. “Mudou fundamentalmente a perceção das pessoas sobre o desporto e fez mudar o cenário. Foi um momento seminal, esse verão de 1994 mantém uma influência determinante nos dias de hoje”, acrescenta, viajando ao processo que conduziu ao seu recrutamento como ator e figura do elenco, já que foi prematuramente colocado num grupo evolutivo que trabalhou meses para entrar em cena na competição. “O Bora Milutinovic foi extremamente importante para o meu desenvolvimento como jogador e como pessoa. Ele era exaustivo em tudo, meio louco também, fez-me melhorar muito. Forçou-me a olhar o jogo e o mundo de forma diferente”, reconhece o antigo defesa, que experimentara em 1992 testes sem sucesso no Arsenal.
Lalas sai do Mundial de 1994 e de toda a geração de 90 como um dos grandes embaixadores da primeira vaga de futebol norte-americano para o mundo. “Quase todos os jogadores de 1994 tiveram carreiras de sucesso depois da competição. Ainda hoje estamos envolvidos pelo jogo e pelo desporto. Temos esse vínculo muito especial que partilhamos. Juntos conseguimos ajudar o futebol no país e também no mundo. Somos pais orgulhosos do futebol norte-americano”, sustenta Alexi Lalas, debruçando-se sobre impactos gloriosos e trágicos da prova de sonho.
“A vitória sobre a Colômbia no Rose Bowl foi um momento incrível na minha vida. A alegria por todo o país, celebrando uma vitória histórica, é algo que nunca esquecerei. Obviamente, a tragédia de Andrés Escobar faz parte dessa história, mas tudo faz parte da história do futebol na América. Ter participado em jogos tão marcantes foi muito especial”, destaca, não esquecendo os temores cénicos com os craques da canarinha nos oitavos de final da prova.
“Esses jogadores podiam liquidar-te de tantas e tantas formas. Tinhas de estar alerta para qualquer possibilidade. Romário, em particular, tinha um incrível e baixo centro de gravidade e podia cortar e fazer de pivô num breve instante. Um fantástico jogador que fez nesse Mundial uma notável parceria com Bebeto”, recua Panayotis Alexander Lalas, mais tarde responsável pela chegada de Beckham ao futebol americano, como responsável do Los Angeles Galaxy.
"Fui uma espécie de performer"
O loiro cabeludo rebobina com franqueza os estímulos que carregava, guiado pelas tais paisagens sonoras da infância e os visuais atrevidos, fazendo com que fosse repetidamente falado, mencionado ou destacado.
“Devo confessar que foi tudo um pouco calculado. Sempre cresci e aprendi muito com a indústria musical. Falo da aparência, do nosso tipo de apresentação, o cuidado estético. Eram aspetos importantes para mim. Nessa época, além de jogador, também me considerava uma espécie de performer. A forma como me vestia, como me apresentava foram situações projetadas por mim para despertar atenções. Mas também garanto que era genuíno e autêntico. Fiquei sempre muito confortável, mas hoje reconheço que foram alguns exageros que deram mais força ao nome e facilitaram o destaque”, escalpeliza Lalas.
“Hoje chamariam isso de criar uma marca. Naquela época, apenas sabia que o Mundial seria uma plataforma que me daria uma incrível oportunidade de vender uma imagem para o mundo. Usei isso a meu favor e aproveitei ao máximo, dentro e fora do campo”, exorta. O trecho musical da vida do antigo central é uma constante descoberta, embora a imagem barbuda o associe a decibéis generosos e um rock denso. Além de bom ouvinte, Lalas também é músico, entretém-se com acordes. “Eu ainda continuo a escrever, a gravar e a lançar músicas. É algo que adoro e em que sou bom”, conta o antigo central.