Guarda-redes passou pelo estado de alerta após os cerca de 200 mísseis lançados pelo Irão e percorre, nesta entrevista, o antes e depois de 7 outubro de 2023, quando Israel foi atacado pelo Hamas. Adora o país e quer continuar no Beitar
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Como caracterizar o susto generalizado em Israel após o ataque lançado pelo Irão?
-Foram horas difíceis desde o momento em que nos cancelaram o jogo, porque só daí já dava para perceber que algo se ia passar. Depois recebemos aviso do clube a dizer que podia haver alarmes em Jerusalém, coisa rara; então já sabíamos que, se viesse algo, vinha do Irão e quando vem de lá não é brincadeira. Ficámos logo preocupados, a inquietação começou a meio da tarde e foi já durante a noite que recebemos o alerta de emergência no telefone, para que nos dirigíssemos ao bunker. Toda a tensão começou nessa altura, estávamos no bunker e começaram a tocar as sirenes e ouvimos explosões sem parar. Creio que estivemos cerca de 40 minutos lá dentro a rezar para que tudo parasse e a tentar esconder toda a situação dos miúdos, tentando distraí-los com os smartphones a ver os bonecos.
Como um estrangeiro rebobina os últimos meses, isto é, se a experiência desportiva tem compensado a insegurança com a escalada do conflito?
-É algo difícil de explicar, mas só quem está aqui é que entende. São situações complicadas, no fundo foram dois ataques do Irão que nos sobressaltaram, quanto ao resto tenho tido uma vida normal em Jerusalém e em outros sítios do país. Faz umas semanas, o problema estava centrado em Gaza e, na parte norte do país, zonas para onde não vamos. Por isso, tudo perfeitamente normal no meu meio, a experiência desportiva tem compensado porque tem tudo corrido bem e eu sinto-me realmente muito bem no clube. Sou feliz e, por essas razões, também decidi renovar o meu contrato mesmo sabendo as preocupações que temos em Israel. O que encontrei aqui é muito difícil de encontrar, foi a primeira vez na minha carreira que me deparei com um cenário assim e não há como dizer não a isto.
Face a este ataque do Irão, qual é a visão interna sobre o sucedido, o que é reportado aos olhos de Israel?
-O que nos é passado do que aconteceu foi que houve apenas uma morte de um palestiniano em West Bank, que estava na rua e levou com um pedaço de um míssil em cima. De resto, os estragos foram mínimos, sei de uma escola atingida sem grande proporção.
Este momento pode marcar uma viragem quanto à sua permanência em Israel?
-Para já, não. Estamos apenas a aguardar o que vai acontecer nos próximos dias, porque supostamente só foi adiada uma jornada. Já voltaram a abrir tudo, por isso temos novamente vida normal por cá e, então, não há razões, nem tenho permissão do clube para sair. Agora se isto piorar, claro, a história é outra e aí certas decisões vão ter de ser tomadas.
Estava em Israel por altura do ataque do Hamas que veio espoletar tudo isto... Há, claramente, um antes e depois também repercutido no futebol?
-Sim, claro que se sente um antes e depois. A vida é totalmente diferente e feita com outras preocupações, como saber bem para onde vamos e se é seguro ir, se há risco de alguma coisa acontecer. Juntam-se jogos adiados, jogos sem público, tudo isso, sem dúvida, faz haver esse antes e depois. Em termos de sobressaltos e deslocações para um bunker, isso aconteceu só nos ataques do Irão. Em Jerusalém não senti mais nada até hoje.
Com a permanência em Israel num período tão conturbado, pergunto se têm surgido apelos de outros clubes, outros campeonatos e até da família para que possa jogar em lugar mais seguro?
-Pela família, claro, face às notícias que vão aparecendo em Portugal, pensam que estou a jogar no fim do mundo. Mas não estou! Ninguém entende o porquê de eu querer continuar por aqui, porque só estando cá se pode entender Israel. É espetacular, tem muita qualidade de vida e, mesmo acontecendo alguns episódios difíceis, no resto dos dias este país é um paraíso. No sentido contrário, há muita gente que vem ter comigo a agradecer-me por ter continuado no clube, depois de tudo o que tem acontecido. Mostram muita compaixão por mim e pela minha família, ao sentirem que apoiamos Israel numa situação tão complicada, quando a maior parte do mundo está contra eles.
Nos estádios aplaude-se a intervenção ou apela-se à paz?
-Há imensas mensagens. Antes dos jogos homenageiam quem salvou pessoas no dia 7 de outubro de 2023 ou aqueles que perderam familiares. Podem entrar connosco no campo. Mostram nos estádios imagens dos soldados que faleceram, dependendo do clube de que eram fãs. Nas bancadas não faltam bandeiras com fotos de reféns, apelos a que os tragam de volta. No final, quando é caso de festejar alguma vitória com os adeptos, ficamos todos sentados e abraçados e à nossa frente estão essas bandeiras com as fotos. O Beitar fez uma cerimónia a homenagear os adeptos que tinham falecido no dia 7. Eu próprio me emocionei porque um adepto veio ter comigo a dizer que o filho dele tinha morrido nesse dia num bunker para o qual foi atirada uma granada pelos terroristas. Ele atirou-se para cima da granada para salvar a namorada. Ela está viva e o pai, orgulhoso, pediu-me para vestir uma camisola com a foto do filho. Comoveu-me muito.
Pena terem saído Jota e Mangas
O Vitória aquece o coração de Miguel Silva, um ferrenho adepto, nunca o escondeu. “Estou contente com este arranque, estão a jogar bom futebol, com organização. Podem fazer um excelente campeonato. Gostava muito do Jota e do Mangas, uma pena terem saído. Agora é o Bruno Gaspar o preferido”, nota, destacando as qualidades de Bruno Varela no posto. “Estive com ele na seleção, conheço a sua qualidade. Foi uma boa aposta do Vitória e é um guarda-redes que tem mostrado estar no clube certo”, vinca Miguel, satisfeito com Rui Borges.