O FC Porto pode igualar hoje o melhor percurso de sempre na fase de grupos da Liga dos Campeões, ocorrido na temporada de 1996/97. O treinador Sérgio Conceição era um dos donos da lateral direita da equipa orientada, na altura, por António Oliveira. Foi no terceiro ano do Penta.
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11 de setembro de 1996. No dia em que o FC Porto ia defrontar o Milan, para a Liga dos Campeões, o primeiro jogo da fase de grupos, os repórteres de O JOGO - Carlos Machado (atual chefe de Redação), Fernando Rola e Jorge Monteiro (fotografia) - davam conta, em meia dúzia de linhas semi-escondidas em quatro páginas de reportagem, de que a ansiedade dos jogadores e da equipa técnica se ajudava a matar, pela manhã, com as fotocópias do jornal.
E como chegavam a Milão as fotocópias? É sempre bom recordar que ainda não havia mundo digital como hoje. Apenas dava os primeiros passos. As páginas dos jornais seguiam por fax para as receções dos hotéis onde se hospedavam os jogadores e os jornalistas. E estes ofereciam-nas às equipas.
E o que se leu nesse dia? Desde logo, o treinador António Oliveira dava conta do seu otimismo: "O FC Porto vai jogar ao ataque", titulou-se, ao mesmo tempo que Artur, avançado brasileiro, confessava: "Tenho o moral elevado". Marcou um golo, ele, e Jardel, que se estreou na prova, marcou dois.
Os dragões saíram da primeira ronda do Grupo D com uma histórica vitória por 3-2 e assim deram início ao melhor desempenho de sempre na fase de grupos da competição. O triunfo foi conseguido contra uma equipa com nomes sonantes e poderosos de então: Baggio, Maldini, Costacurta, Baresi, Edgar Davids, Weah e Boban, entre outros.
Na quinta-feira, a manchete de O JOGO foi "Show em Milão", destacando ainda que "Jardel apagou Weah", o liberiano que era estrela dos transalpinos. "A ousadia tática de António Oliveira neutralizou as estrelas milanesas", escreveu-se na primeira página, que remetia ainda para um perdão do Sporting a Dominguez, que se queixava por não ser titular, e à primeira convocatória de Marinho no Benfica, que nesse dia ia defrontar os polacos do Chorzow, para a primeira mão da primeira eliminatória da Taça dos Vencedores das Taças, entretanto extinta.
Duas semanas depois, a 25 de setembro, nas páginas de O JOGO reportavam-se notícias da competição - dia de receção aos suecos do Gotemburgo, segunda jornada da Champions - e a demissão de Óscar Cruz, que era vice-presidente do clube (não havia SAD, ainda) para as instalações. O presidente portista, Jorge Nuno Pinto da Costa, esclarecia a audiência sobre as declarações, nos dias anteriores, do seu "vice" demissionário: "Nenhum dos elementos do departamento colocou a possibilidade de abandonar o clube, e, na presença de Óscar Cruz, reiteraram toda a vontade em continuar".
Sobre a receção aos milaneses, António Oliveira, ainda com o sabor do sucesso em Milão, afirmava: "Vamos manter-nos coerentes ao esquema que vimos utilizando". Ou seja, um 3x4x3 muito versátil, mas já com Artur e Jardel como dupla titular. Nesse dia brilhou Artur, com dois golos, no antigo Estádio das Antas. Jardel ficou em branco, muito graças às defesas do já quase quarentão Thomas Ravelli.
Mas o brasileiro marcou na terceira jornada, a 16 de outubro, na casa dos noruegueses do Rosenborg, ao minuto 89, num dia em que brilhou outro português, mas pelos holandeses do Ajax: Dani, com dois tentos frente ao Glasgow Rangers. "Jardel é ouro" foi a manchete de O JOGO. No onze, como nas duas partidas anteriores, estava Sérgio Conceição. Três jogos, nove pontos.
Jardel não foi parco em palavras: "Weah tem de ser preso, foi uma cobardia".
A 30 de outubro, para a receção aos noruegueses, o atual treinador do FC Porto esteve em dúvida até à hora do jogo. Ele, Artur e Edmilson. "Recuperou", mas ficou no banco, tal como Jardel. Ambos entraram apenas na segunda parte. Zahovic, Drulovic e Artur fizeram o 3-0 final. Em manchete: "1,2 milhões de contos garantidos". Cerca de seis milhões de euros, "traduza-se" para a moeda de hoje. Tudo porque "Drulovic tinha a chave do castelo", escreveu-se ainda na capa, que trazia outros títulos: o adeus do Sporting à Taça UEFA, o Caso Guímaro que devia acabar sem condenações e a vontade do Barcelona em contratar Rui Costa. Quatro jogos, 12 pontos.
A 20 de novembro, dia da receção ao Milan, a manchete era: "50 mil nas bancadas", título assistido com declarações do assistente-mor da equipa, Drulovic: "Podemos vencer qualquer equipa do mundo". Mas ninguém triunfou. O empate a uma bola (golo de Edmilson, aos 71 minutos, contra o de Davids, aos 56) ficou marcado pelo desentendimento entre Jorge Costa e Georges Weah. Das picardias do relvado à cabeçada no regresso aos balneários, um episódio que correu o mundo. Jardel não foi parco em palavras: "Weah tem de ser preso, foi uma cobardia".
Oliveira, por sua vez, queixou-se da arbitragem do austríaco Gerd Grabher: "O FC Porto só não venceu porque não teve um árbitro à altura". Verdade ou não, foram os dois pontos que faltaram aos dragões para fazerem o pleno na fase de grupos da Liga dos Campeões, pois acabariam por vencer o sexto encontro.
Na Suécia, em casa do Gotemburgo, Edmilson e Jardel "selaram", na segunda parte, um percurso invicto: cinco jogos, 16 pontos, 12 golos marcados e quatro sofridos. Seguiu-se o Manchester United, a contar para os quartos-de-final, em março de 1997: derrota por 4-0 no jogo fora e empate sem golos nas Antas.
Caído na Champions, o FC Porto venceu o campeonato pelo terceiro ano consecutivo. Nos dois anteriores, Bobby Robson, com José Mourinho entre os adjuntos, deu início à caminhada do Penta. Foi o primeiro ano de António Oliveira, que repetiria o triunfo caseiro em 97/98, caminhada que terminou com Fernando Santos, o "engenheiro" do Penta.