Tempo extra não mostrou reflexo significativo no tempo útil e desgaste é residual
Arranque da I Liga mostrou que os descontos alargados não tiveram reflexo significativo no tempo útil. Entre as quatro equipas "europeias", Sporting foi a que registou maior aumento no aproveitamento do tempo de jogo: pouco mais de um minuto. No caso do FC Porto, por exemplo, até desceu.
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O alargamento dos períodos de compensação nos jogos da I Liga apresentou-se como uma das grandes novidades do futebol nacional para 2023/24 e, ao cabo de quatro jornadas, não têm faltado opiniões divergentes sobre o tema. Um dos principais focos de discussão está relacionado com o real aproveitamento desse tempo extra, ou seja, se o aumento dos descontos contribuiu para a melhoria do tempo útil de jogo em termos absolutos.
Ora, comparando as médias obtidas pelos clubes primodivisionários nas quatro rondas já disputadas esta época com as da temporada transata, concluímos que 15 dos 18 emblemas registaram um aumento do tempo útil de jogo [ver infografia].
Contudo, tendo em conta que a maioria dos jogos passou a ter uma duração superior a 100 minutos, essa variação acaba por ser residual: só seis equipas viram o tempo útil subir mais de dois minutos. Quer isto dizer que, a menos de uma semana do início das fases de grupos da Liga dos Campeões e da Liga Europa, o desgaste decorrente do alargamento dos descontos não se pressupõe expressivo.
Nesse sentido, e restringindo a análise aos quatro clubes que vão participar nas provas europeias - Benfica, FC Porto, Braga (Champions) e Sporting (Liga Europa) -, os leões foram os que viram a média de tempo útil subir: um minuto e dois segundos a mais com a bola a rolar. Os aumentos de arsenalistas (29 segundos) e águias (11 segundos) são residuais e os dragões foram mesmo uma das três equipas do campeonato - Casa Pia e Rio Ave foram as outras - que viram o valor cair: 27 segundos.
No entanto, porque todos os pormenores contam no futebol, o facto de as variações no tempo útil não se traduzirem, necessariamente, num aumento do cansaço dos jogadores, pode levar a reajustamentos nos planos de treino, com o intuito de evitar eventuais sequelas.
Dragões com o menor aproveitamento
Se olharmos para a percentagem de aproveitamento do tempo total de jogo, o FC Porto é, até ver, o "lanterna vermelha" da I Liga 2023/24. Apesar de ter a segunda maior média de tempo total (107 minutos e 46 segundos), a percentagem média de tempo útil é de 49,64%. Ou seja, a tendência nos jogos dos dragões é que a bola esteja em jogo durante menos de metade da duração do encontro.
Dados que mereceram comentários de Sérgio Conceição na conferência de Imprensa de antevisão à partida desta sexta-feira, frente ao Estrela. "A compensação que é dada é justa. Era o que todos andavam a pedir, porque o tempo útil de jogo de Portugal era dos mais baixos da Europa. Mas há aqui uma situação muito engraçada. Nós, FC Porto, temos uma média de tempo [total] de jogo que é das mais altas, mas somos a equipa com pior tempo útil de jogo verdadeiro. Não estou a dizer que as equipas fazem antijogo contra nós, mas tudo aquilo que queremos, ritmo alto, intensidade e velocidade, é difícil. Se há 10, 15 ou 20 minutos de compensação, é preciso perceber quantos é que são jogados. Porque estamos a falar de duas coisas que parecem antagónicas, mas que estão associadas. Cabe a cada um de nós, intervenientes diretos, perceber o que está a acontecer", referiu o técnico.
Famalicão no topo da tabela
Se há equipa que tem aproveitado de forma produtiva o aumento das compensações, é o Famalicão. Comparando a média de tempo útil da temporada passada com a atual, a equipa de João Pedro Sousa registou uma subida de três minutos e 38 segundos, superando em cinco segundos o registo do Portimonense. Já o Rio Ave teve a maior quebra: três minutos e dois segundos.
Três questões a David Rosa, fisiologista
"Desconforto inicial torna-se um hábito"
1 - As variações no tempo útil de jogo são residuais. Ainda assim, podem ter impacto ao nível físico?
-Apesar de não se terem verificado grandes variações do tempo útil de jogo, sabemos que a maior parte das lesões acontece nos últimos 15 minutos de cada parte. Uma vez que este tempo é estendido, podemos estar perante uma maior probabilidade de ocorrer uma lesão. Aquilo que acontece muitas vezes é o jogo ficar "partido" na parte final. Assim, os jogadores têm de estar fisicamente preparados para atingir velocidades perto das máximas nesta fase do jogo. Um trabalho que pode ser implementado é a utilização da corrida intervalada na fase final do treino, procurando dar um estímulo semelhante ao que os jogadores vão estar sujeitos nos últimos minutos de jogo.
2 -É possível que o desgaste seja mais acentuado ao nível psicológico?
-Daquilo que tenho falado com alguns jogadores, os primeiros jogos foram mais difíceis. A partir do momento em que se torna um hábito, também o jogador se prepara psicologicamente para isso. Portanto, aquilo que era novidade, e que causava algum desconforto, passa a ser natural.
3 - Compensações maiores acentuam o problema da sobrecarga de calendário?
-Falar das equipas que, potencialmente, terão um calendário sobrecarregado, é falar de cerca de cerca de 20 por cento dos clubes da I Liga, fruto da participação nas provas europeias. Não considero que os restantes 80 por cento tenham um calendário competitivo sobrecarregado.