"Rúben Amorim tem uma força mental espetacular para os poucos anos que leva como treinador"
De saída do Sporting, o guarda-redes Adán deu uma última entrevista à Sporting TV, despedindo-se do clube e dos adeptos
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Alguma vez imaginou que o Sporting tinha esta grandeza? "A nível da história, eu sabia que chegava a um grande clube. Eu acho que a história deste clube é enorme, a quantidade de troféus que existem nesta sala representam isso mesmo. A quantidade de adeptos que se movem, tanto em Portugal como na Europa, eu acho que só conseguem isso em poucos clubes, e o Sporting é um deles. Eu tinha essa noção do que era o clube, do que vinha a representar, mas é verdade que não tinha a noção de que íamos conseguir tanto como conseguimos durante estes quatro anos. Eu sabia que íamos lutar, que o clube estava praticamente com um projeto novo, que era para crescer, para voltar a unir o plantel com os adeptos, e pouco a pouco, durante estes quatro anos, foi muito melhor do que eu esperava."
Fica ligado à história do Sporting... "Eu acho que é especial poder estar entre tantos nomes importantes da história deste clube. Eu lembro-me que quando cheguei aqui, uma das primeiras coisas que fiz foi vir a este museu, e surpreendeu-me conhecer a quantidade de nomes importantes que tem nesta história. Eu via o nome de Schmeichel, e contaram-me um pouco de sua trajetória aqui, antes do meu caminho no Sporting. E agora poder estar entre eles me parece algo incrível, algo espetacular. Eu estou orgulhoso de ter conseguido isto durante estes anos, da importância que tenho tido para o clube durante estes anos. E é um orgulho tremendo poder ser campeão duas vezes com este clube."
É estranha a sensação de que é uma referência aqui? "É estranho porque, apesar de ter levado muitos anos nisto, ainda sou futebolista e não tenho essa noção do que representa, ou representa para a história do clube. Espero que daqui a 20, 25 anos haja muitos nomes como o meu que possam dizer que foram campeões neste clube. Estou orgulhoso de ficar na história deste clube."
A braçadeira de capitão tem peso? "Tem. Já havia sido capitão nutros clubes. No Bétis fui capitão. Para mim foi uma grande responsabilidade, porque passas a ter uma importância especial também no funcionamento do guarda-redes, no funcionamento do clube. E isso para mim foi importante. Que o míster, apesar de ter outros jogadores que tinham mais experiência no clube, apostasse em mim para ser um dos capitães foi uma responsabilidade e ao mesmo tempo um orgulho enorme poder ser capitão deste clube."
Treinadores de guarda-redes: "Eu acho que tanto Vital como Tiago fazem um trabalho espetacular com todos estes guarda-redes que vão chegando da formação. E da minha parte, eu sempre fui de poucas palavras com eles. Só me concentrava em trabalhar no dia-a-dia."
Peso da camisola: "Acho que nestes quatro anos, eu poucas vezes faltei a um treino. Eu acho que essa era a minha forma de mostrar-lhes o trabalho diário, o esforço e a disciplina que se tem a representar este clube e em que em nenhum dia podes falhar. É muito importante, uma camisola que pesa muito e tem que estar todos os dias no topo. Espero que algum deles tenha pegado alguma dessas coisas e que rapidamente estejam nesta cadeira."
Quatro anos chegaram para perceber os valores do clube? "Mesmo no primeiro ano, mesmo sem adeptos nas bancadas, quando ninguém acreditava em nós, um projeto praticamente novo com o míster, com a chegada do míster, em que ninguém acreditava na quantidade de jogos que ganhávamos nos minutos finais. Nesse primeiro ano já deu para perceber esses valores, que é a luta até o fim, o orgulho e deixar tudo no campo para conseguir a vitória. Acho que nesse ano já deu para perceber tudo o que este clube nos ia dar nos próximos três anos."
Mudava alguma palavra, alguma vírgula, desta história que escreveu no Sporting ao longo de quatro temporadas? "Eu acho que, obviamente, algumas vezes errei também, pessoalmente, com os meus colegas, que partilhamos o dia-a-dia. Desportivamente, obviamente, cometi erros, mas é difícil tirar algo, porque mesmo nesses momentos mais complicados, e apesar da minha idade, muitas vezes pensam que já sabemos tudo. Mas deu para aprender muito, para estar aí em cada luta com meus colegas e não poder baixar os braços."
Aprendeu muito também com eles, com cada um deles, mesmo até com os mais novos? "Sim. Muitas vezes, quando já tens certa idade, uma das coisas que mais custa, e é preciso reconhecê-lo, é a parte mental. Ir a treinar cada dia, com a vontade como no primeiro dia, às vezes custa, mas vê-los também é uma motivação para mim.
Eles são jovens, que tem uma vontade tremenda, e eu sou competitivo, não poderiam ter mais do que eu. Então isso também era um aprendizagem quase contínua."
Sempre teve essa ambição? "Foi muita ambição pelas palavras que recebi do clube, tanto do míster, como do Hugo Viana, como do presidente, do grupo que estava a formar-se, do projeto que estava a formar-se, e queria ser parte desse projeto, desse processo. E desde o primeiro ano correu bem, mas também queria viver todo esse processo. Estes títulos são muitos, mas também se foram conseguindo pequenas conquistas. Competimos na Champions League dois anos de seguida, este vai ser o terceiro para a próxima época. Pequenas coisas que a equipa também não conseguia fazer há vários anos... foi importante fazer parte disto."
Como é que descreve também a liderança do míster Rubén Amorim? "Acho que ele é uma pessoa muito inteligente para o mundo do futebol. Sabe gerir o balneário na perfeição. Sabe gerir os seus próprios colegas de equipa técnica. E é uma voz com um mensagem muito clara, tanto para dentro como para fora do clube. E com uma força mental também espetacular para os poucos anos que leva no futebol como treinador. Ao nível pessoal, foi uma relação espetacular com ele, de confiança, de nos mudar todas as coisas que passavam no dia a dia. Eu acho que é um treinador espetacular e que vai continuar a ter conquistas."
Como vê o resto da equipa técnica? "É óbvio que, eu sempre digo, que o mérito de um guarda-redes, tanto para bem como para mal, tem de ser dividido em 50-50. Eu coloco a minha qualidade, a minha forma de defender e eles têm a parte que nos falta, que é o treino diário, o dia a dia, estarmos preparados tanto fisicamente quanto mentalmente... como as análises de cada vídeo, de cada jogo, de cada jogada. Eu acho que isso é importante numa relação entre treinadores de guarda-redes e, neste caso, foram quatro anos de aprendizagem enorme com eles. O Vital tem uma experiência no treino de guarda-redes como poucos. O Tiago complementa de uma forma espetacular. Se um é duro, o outro dá o carinho que às vezes o Vital não consegue dar."
A conquista de 2020/21 estava escrita nas estrelas? "Eu acho que, como disse antes, desde o princípio notávamos algo especial. No balneário, vitória após vitória, chegava a momentos em que a equipa também tinha dificuldades em conseguir essas vitórias, e sempre aparecia alguém no último minuto para nos dar esse golo da vitória. Fomos acreditando que era possível. Eu lembro-me de ir ao Porto e estávamos com sete, oito pontos de distância. Eu disse aos meus colegas que era impossível que alguém nos tirasse oito pontos de distância. Isso não se pode escapar das mãos. E foi assim. Foi especial, porque não tínhamos adeptos nas bancadas, mais no último dia, ir ao Marquês, e mesmo com a Covid, estava toda a gente na rua. Foi espetacular aquela imagem. Na Avenida da Liberdade, olhava para baixo e não conseguia ver nada mais do que verde. Aquele ano foi especial por tudo isso."