LEÇA FC - Regressar aos gloriosos anos 90 não é fácil, mas o momento é de grande otimismo em enterrar de vez os problemas do passado
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Os anos 90 foram de ouro para o Leça. Ao cabo de quatro anos na então Liga de Honra, sagrou-se campeão em 1995 e subiu à I Liga, onde se manteve até 1998 - depois de já ter lá estado na época de 1941/42 -, e de onde só saiu por decisão administrativa, que o atirou para as profundezas do futebol nacional. Muito duro tem sido a vida do histórico clube de Leça da Palmeira, que só agora começa a sair de uma dívida tremenda, mas que ainda não está resolvida. Mas são felizes os dias de hoje no Leça. A equipa está no comando da Série B do Campeonato de Portugal, só com vitórias nos cinco jogos realizados, feito só igualado por Vizela e Louletano entre as 72 equipas que nele competem. O clube não fez uma equipa para subir, mas para fazer um campeonato tranquilo. "Na época passada foi muito desgastante, porque tivemos de travar uma luta muito árdua para nos aguentarmos no Campeonato de Portugal. Fizemos uma segunda volta fantástica, que nos permitiu a permanência. É para fazermos um campeonato mais tranquilo que nos preparamos, com um plantel semiprofissional, com um misto e juventude e experiência". Quem assim fala é o treinador Domingos Barros, 37 anos, um filho da terra, que fez toda a formação como jogador no clube, e praticamente toda a carreira.
É um dos rostos deste reerguido Leça. Nesta época, Domingos Barros abraçou o profissionalismo... "A minha vida mudou um bocadinho, naturalmente. Passei a ter mais tempo para ver os adversários, para preparar os jogos, e mais conforto psicológico e físico para dar os treinos. Tinha uma profissão que me levava muitas horas do dia [trabalhava num transitário] e isso retirava-me tranquilidade. Agora as coisas mudaram". E estão a correr muito bem... "Sim, é verdade, estamos a ter um bom início de época. Pessoalmente, também é bom, porque se chegar ao fim da época e alguém quiser o Domingos, é sinal que as coisas correram bem para o Leça. E isso é tudo o que quero". Ser de Leça e ser do Leça traz vantagens, mas "às vezes também traz desvantagens". "As pessoas exigem muito, e nós gostamos dessa exigência".
Cantam os Expensive Soul que Leça da Palmeira é a terra mais bonita de Portugal. Para os leceiros, o Leça é o melhor clube do mundo e vive um momento de alegria: cinco jogos, cinco vitórias no campeonato!
Mas, afinal, até onde é que este Leça pode ir? "Nesta fase, é muito complicado dizer. O campeonato é muito longo e difícil. Já defrontámos alguns adversários com pretensões à subida, como o Espinho e o Lusitano de Vildemoinhos, mas teremos em breve jogos com o Lourosa e o Arouca, que são candidatos à subida. Por outro lado, admito que o facto de estarmos em primeiro vai levar as equipas a redobrarem os cuidados quando nos defrontam, e isso tornará a nossa tarefa mais complicada. Este plantel foi preparado para fazer um campeonato tranquilo, que não nos faça sofrer como na época passada".
Domingos acredita que pelo menos a tranquilidade vai ser uma realidade, mas reforça que "todos nós estamos conscientes de que ainda não ganhamos nada. Este campeonato é uma maratona, que devia ter outro tipo de final que não fosse um play-off. Devia haver subidas diretas, julgo que seria mais justo, porque um jogo mau pode deitar a perder todo o trabalho de uma época". Domingos tem um desejo confesso: "Quero muito voltar a ver o Leça entre os grandes, mas sabemos que esse é um desejo difícil de satisfazer, mas é para isso que as pessoas do clube trabalham. Há uma estrutura muito unida e que gosta muito do clube".
Neste domingo, o Leça vai defrontar a Oliveirense, da II Liga, na Taça de Portugal. "É um desafio diferente, em que as nossas responsabilidades não são tão grandes, porque vamos jogar com uma equipa de uma divisão superior, mas vamos dar tudo para continuarmos na Taça de Portugal. Estamos a preparar o jogo nesse sentido e contamos também com o apoio dos nossos adeptos, que têm estado sempre do nosso lado, nas horas boas e nas más, e são uma importante ajuda".
Pulmão do meio campo aos 40 anos
Bem se pode dizer que teve uma vida ligada ao Varzim. Aos 40 anos, Nelsinho aceitou a proposta do Leça, "porque senti que as pessoas me queriam e fizeram força para eu vir. Não foi muito agradável a maneira como saí do Varzim, mas já passou. São coisas do futebol". O médio diz que não há nenhum segredo para estar a jogar com 40 anos de idade. "Trabalho, muito trabalho. Foi sempre esse o meu lema". A experiência de Nelsinho tem sido ótima para o Leça. "Estou aqui para ajudar e estou feliz, porque fiz uma excelente opção para continuar a carreira. Este clube é como um família".
"Quem sabe se um dia ainda não vão jogar ao lado do pai..."
Aos 10 anos, Paulo Lopes era um dos apanha-bolas do clube, estava o Leça na II Liga. "Já então sonhava um dia vestir esta camisola", recorda. Mas o trajeto futebolístico levou-o para o Boavista, onde fez toda a formação. Hoje, olhando para trás, Paulo Lopes, leceiro de nascença e capitão de equipa, sente que poderia ter feito uma carreira profissional. "Se calhar, se tivesse dado ouvidos aos meus treinadores, talvez isso tivesse acontecido. Tive sempre muita relutância em jogar como defesa esquerdo e fiz mal..." Hoje, é essa a posição que ocupa no seu Leça, veste com orgulho enorme a camisola do clube do coração e fala da facilidade que é ser capitão: "É fácil, porque o grupo é excelente. Apesar de ter jogadores mais velhos e experientes, num plantel também com muita juventude, todos somos um e, portanto, as facilidades são muitas. São grandes trabalhadores e essa característica fortalece muito o grupo."
"É um dos plantéis mais fortes com que já trabalhei". A opinião é de Paulo Lopes, capitão do Leça FC, que fez toda a formação no Boavista e atribui ao trabalho e ao excelente grupo o bom arranque
Paulo Lopes não tem dúvidas. "Este é um dos plantéis mais fortes em que já trabalhei. Sabemos que todas as equipas vão dar mais agora contra nós, porque somos o primeiro. E não me importava nada de chegar ao fim em primeiro, mas é um campeonato muito difícil e estamos conscientes disso". Na época passada, o Leça, no regresso ao Campeonato de Portugal, viu-se e desejou-se para se aguentar. "A primeira parte do campeonato foi muito dura, alguns pensavam em desistir, para muitos já tínhamos descido de divisão, mas houve ali um momento, um jantar que fizemos e e em que ficámos depois a conversar mais de duas horas, principalmente sobre o que estava mal, que funcionou. Coincidência ou não, a partir daí fizemos um campeonato fantástico". Os filhos, os gémeos Santiago e Diego, que completam este sábado seis anos, já jogam no clube e, diz Paulo com um sorriso, "quem sabe se um dia ainda não vão jogar ao lado do pai..."
Arena para salvar o clube
António Pinho leva quase nove anos como presidente, uma dedicação enorme ao clube, que já vem do tempo em que era futebolista. "Cresci aqui, não soube nunca dizer que não ao Leça", diz o presidente, alertando para as dificuldades que o clube ainda vive. "Neste ano fizemos uma parceria com o Miguel Fradinho, Filipe Serrano e Miguel Salvador, que nos ajudaram a fazer uma equipa mais de acordo com as necessidades do campeonato e segundo as ideias do Domingos. Procurámos satisfazer os pedidos, mas não é fácil manter esta equipa, tudo por causa das dívidas do passado, das quais o Leça ainda não se livrou. Fizemos um PER que nos permitiu negociar as dívidas, mas não conseguimos receber os subsídios tão desejados da autarquia, por muito que nos queiram ajudar. As receitas vêm da publicidade e dos associados, mas não é fácil fazer face às despesas deste plantel". A salvação do Leça, a curto prazo, passa por um projeto que já existe, que é do conhecimento da Câmara de Matosinhos, e passa pela construção de uma Arena para espetáculos e para o futebol, "que irá dar uma nova vida ao Leça e condições para ficar de novo confortável, sempre respeitando a história do clube e sempre de acordo com a vontade dos sócios". "Em breve poderá haver novidades. A Câmara de Matosinhos está alinhada connosco e acreditamos que é este o caminho da salvação do clube".