OS INFIÉIS DEFUNTOS (episódio 1) - Uns mais gigantes e outros mais modestos que mirraram, sobrevivem ou se extinguiram. Episódios do desporto com história e protagonistas
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Esta é uma história sobre a vida, a morte e a segunda vida do New York Cosmos, mas que O JOGO começa por contá-la a partir do Moxico, em Angola, com uma passagem lustrosa pelo Porto, até ao outro lado do Atlântico.
Pretendia-se um superclube, uma marca comparável em Nova Iorque aos Giants e aos Jets
Na sua terra, mas a cumprir serviço militar durante a Guerra do Ultramar, um extremo-direito emprestado pelo FC Porto à filial angolana Futebol Clube do Moxico não contactava com o inimigo durante a comissão, mas tinha dentro de si todos os medos da altura. Talvez por isso Joaquim Arsénio Rodrigues Jardim - o Seninho -, jogasse com a rapidez de quem fugia de um sítio ao qual nunca mais queria voltar.
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Seninho deixaria a guerra e a sua Angola natal vencedor da liga local para se afirmar com pinta e faixa de campeão num FC Porto histórico, entre gente grande como Octávio, Rodolfo, Oliveira e Gomes, mas seria um jogo de estalo do extremo contra o Manchester United a mudar-lhe a vida. Recebeu um telefonema de Pelé, foi viver para Manhattan e fez-se ainda mais craque entre o Rei, Beckenbauer, Carlos Alberto Torres, Neeskens, Chinaglia e outros astros. Seninho foi o português do New York Cosmos, uma lenda que desapareceu e reapareceu.
Apostada em fazer do desporto-rei mais do que prática quase exclusiva das comunidades imigrantes, foi criada a NASL (North American Soccer League), uma liga profissional que também comportava futebol indoor e cujos nomes de várias equipas tinham alusões à história dos Estados Unidos - Boston Minutemen, Caribous of Colorado, Jacksonville Tea Men, Connecticut Bicentennials, etc.
Tudo recomeçou bem em campo, com o Cosmos a jogar futebol atraente, mas a jogar na segunda divisão...
Em 1971, entendeu-se que era necessário infundir glamour na liga. Qualquer coisa global nos Estados Unidos não podia passar sem um toque de Nova Iorque e os Cosmos nasceram dessa inevitabilidade. A ideia era mais cosmopolita, daí a designação: pretendia-se um superclube, uma marca comparável em Nova Iorque aos Giants e aos Jets (futebol americano); aos Yankees e aos Mets (basebol) e aos Knicks (basquetebol).
Com bolsos fundos, a franquia tinha o financiamento da Warner Communications e contratou o rei do jogo, Pelé, com mais um punhado de craques europeus e o Cosmos colocou, de facto, o "soccer" no mapa, mas os alicerces eram frágeis, pese todo o aparato. Das centenas de jogos que o Cosmos efetuou durante os primeiros anos da sua existência, o clube de Nova Iorque enfrentou várias equipas de renome, quer da Europa, quer da América do Sul, mas não passavam de amigáveis com pouca substância.
Criou-se a Trans-Atlantic Challenge Cup para justificar e medir a força do Cosmos perante a nata do exterior, mas a supremacia interna (cinco títulos da NASL entre 1972 e 1982), o "glitz and glam" que os americanos empregavam a publicitar jogos e eventos e os inúmeros "publicity stunts", com Pelé à cabeça, não salvaram o Cosmos nem a própria NASL, que se degradou e desmantelou.
Em 1977, Pelé já tinha dito adeus com honras... de estado. Em 1982, Seninho deixava a equipa. Em 1984, a NASL dissolvia-se e morria uma primeira morte. O Cosmos aguentou-se por pouco tempo: primeiro atuou na Major Indoor Soccer League e acabou a jogar de forma independente e avulsa, até dissipar-se por completo em 1985. Sobre o assunto, deixamos um mini-documentário no vídeo em baixo.
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Uma empresa start-up... com imensa história
Peppe Pinton fora diretor-geral do New York Cosmos na sua primeira encarnação e ficou detentor do nome e dos direitos de imagem do clube, agora absolutamente inativo. Após muita pressão para que o Cosmos fosse reintroduzido na nova liga, a Major League Soccer (MLS), Pinton decidiu vender os direitos a Paul Kemsley, antigo vice-presidente do Tottenham.
Em 2010, o regresso do Cosmos foi anunciado com pompa e circunstância por Pelé, nomeado presidente honorário daquele que, mesmo desaparecido, nunca deixara de ser o mais popular clube de futebol norte-americano. A publicidade ao renascimento foi estratosférica, com Cantona a ter também um papel de destaque.
Tudo recomeçou bem em campo, com o Cosmos a jogar futebol atraente, mas a jogar na segunda divisão... da segunda versão da NASL. O objetivo era entrar na MLS. Mas problemas financeiros furaram os planos do emblema de Nova Iorque e nem a fama o voltou a salvar no plano competitivo ou lhe devolveu apoio nas bancadas - esse desaparecera durante a hibernação.
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Entretanto, a NASL voltou a falecer e o Cosmos vive na irrelevância, ocupando hoje na National Premier Soccer League , oficiosamente o quarto escalão da pirâmide do soccer, cujas ligas não estão ligadas entre si por um sistema subidas e descidas. Para muitos, o Cosmos nunca devia ter deixado a própria sepultura.
https://www.ojogo.pt/futebol/1a-liga/porto/noticias/astucia-de-mourinho-deu-em-castigo-a-historia-da-suspensao-contada-por-vitor-baia-11403417.html?target=conteudo_fechado