OS INFIÉIS DEFUNTOS (episódio 3) - Conhece algum clube que tenha aderido a uma fusão para sair da mesma mais de 40 anos depois e voltar a ser o clube que fora? Então vai passar a conhecer: eis a história dos Leões de Santarém.
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É verdade que acusam o Ribatejo de muita coisa boa: de ser campo e lezíria, de cavalos e fandangos, de vimes e festas bravas, mas não se pode acusar em demasia o Ribatejo dos seus futebóis. Tirando o União de Tomar e o quase fronteiro a Lisboa Alverca, a presença ribatejana no mapa do futebol tem sido marginal, no máximo.
Quem se lembra deles, escusa de viver na saudade: os leões evadiram-se da morte e afiam, unha por unha, as garras no capital do Ribatejo
Mais: no maior dos lugares ribatejanos havia um clube, ou antes - e o leitor fica já a saber - , voltou a haver um clube que arranhou alçapão de acesso à divisão maior do nosso futebol, mas nunca o chegou a abrir. Chamava-se, perdão, voltou a chamar-se Grupo Scalabitano "Os Leões". Eram, quer dizer..., são Os Leões de Santarém. Quem se lembra deles, escusa de viver na saudade: os leões evadiram-se da morte e afiam, unha por unha, as garras no capital do Ribatejo.
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Fundado em 1911, feito de amarelo e preto nas camisolas e filho do ideal desportivo de um grupo de estudantes, o emblema do sudeste de Santarém foi um dos baluartes desportivos da capital ribatejana, ao lado do Sport Grupo União Operária (mais conhecido por Operário), da Associação Académica de Santarém e Grupo de Futebol dos Empregados no Comércio. Os leões rampantes tinham campo próprio, atraíam bastante público e cativavam muitos jovens escalabitanos para a prática de desporto. Por duas vezes os Leões disputaram a liguilha de acesso à I Divisão, chegando também por uma ocasião aos quartos de final da Taça de Portugal. Durante os anos 1960, os leões ganharam o seu único título nacional (campeões da III Divisão em 1962/63) e chegaram a contar com um esquadrão de respeito, com o ex-internacional António Botelho, responsável no futuro pelas balizas de Sporting (duas passagens), Benfica (outras tantas passagens entre formação e profissionais) e Boavista (emblema pelo qual chegou à Seleção Nacional).
Contudo, a lenda dos Leões terminou aos pés de uma ideia do Governo Civil de Santarém e da edilidade local. Foi criado um projeto desportivo para Santarém, que previa um complexo desportivo ambicioso para a cidade, entre vários outros desígnios ao nível de infraestruturas. Para aderir ao projeto, 97% dos associados dos Leões aprovaram a fusão com todos os outros emblemas locais, exceção feita à Académica. Nascia a União de Santarém, em documento assinado a 22 de agosto de 1969. Nesse mesmo instante, os Leões de Santarém passariam a descansar em paz... mas não muito.
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A União de Santarém construiu a sua história, mas os alicerces da fusão, que pareciam sólidos como rocha, eram afinal bem mais frágeis - algo rugia por dentro, algo querer sair.
Membros da Comissão de Estudos e Coordenação do acordo ratificado em 1969 concluíram, 42 anos depois, que as promessas de construção de infraestruturas não foram cumpridas, sustentando, portanto, a reativação tanto da atividade dos Leões como a do Operário. Os Leões afinal estavam apenas suspensos da vida e não defuntos. A extinção ficava extinta.
Com as mesmas cores, símbolo e estatutos, os Leões de Santarém ressurgiram oficialmente a 30 de março de 2012 e a cidade não ficou indiferente à segunda vida de uma das suas bandeiras.
Hoje, os Leões têm patinagem artística e futsal, que começou pelos veteranos. O plano passa por voltar a ter futebol, isto é, passa por os leões continuarem a ir ao reencontro consigo mesmos. É que custa acordar de mais de quarenta anos de hibernação...
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