"Na Luz, o FC Porto passou por cima do Benfica com uma grande facilidade mental"
ENTREVISTA - Herói do título de 2012/13 aponta as chaves da recuperação pontual dessa época e revê a mesma mentalidade na equipa atual. Em entrevista a O JOGO, Kelvin, agora jogador do Ryukyu, do Japão, recorda que o FC Porto tinha "uma equipa muito forte" na altura. Recente vitória na Luz mostrou dragões superiores a "nível mental".
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Em 2012/13, o FC Porto anulou uma desvantagem de quatro pontos em relação ao Benfica para resgatar o título nacional. O herói dessa época, Kelvin, falou em exclusivo a O JOGO sobre os fatores decisivos para a recuperação e torce por um desfecho semelhante nas próximas semanas.
É impossível falar do Kelvin e não recordar o golo ao Benfica aos 90"+2", em 2012/13. Como recorda o momento?
-Não marcou só a minha vida profissional, marcou também a pessoal. Ainda tinha 19 anos... Trago esse momento comigo até hoje, foi um momento de superação da equipa e dos jogadores. Passámos de estar tudo acabado a sermos capazes de mudar a história. Lembro-me de cada detalhe, desde a hora em que chegámos ao estádio até ao minuto em que entrei em campo. Era um dia diferente, o FC Porto-Benfica é um clássico mundial e especial. Foi um dia maravilhoso, fechado com chave de ouro, com o meu golo aos 92". Fiquei muito feliz por marcá-lo, porque sei que fiz parte de um grande clube, de um grande campeonato e de um grande título. Era um sonho meu ser campeão na Europa, ainda mais no FC Porto, conhecido no Brasil e que acompanhei desde a infância. Foi um sonho realizado.
Quais os segredos dessa recuperação que culminou na conquista do título?
-Tínhamos uma equipa muito forte e concentrada. Toda a gente tinha a sua importância dentro do plantel. Não só os que eram titulares absolutos, mas também os que jogavam menos. Todos estavam sempre preparados. Eu, por exemplo, tinha de mostrar sempre alguma coisa para ajudar. Claro que também tinha os meus objetivos pessoais, que passavam por assegurar a titularidade, mas era algo muito difícil naquela altura. James Rodríguez, Varela, Jackson Martínez, Christian Atsu... Tudo jogadores de seleção. E eu tinha de estar nesse nível, tinha de mostrar nos treinos, quando jogava na equipa B... Não foi só o golo ao Benfica, foram também os dois que marquei ao Braga, que acabaram por ser muito importantes para a época. Entrávamos em campo a saber que tínhamos de manter aquele nível altíssimo, preparados para jogar a qualquer momento. Essa reviravolta foi mais pelo potencial da nossa equipa, o saber que a qualquer tropeção do Benfica nós tínhamos de passar por cima deles. A chave foi a concentração total no objetivo de ganhar o título.
Sente que a atual equipa tem capacidade para repetir a façanha?
-Penso que sim. O FC Porto sempre conseguiu montar equipas fortes, conseguiu ganhar no Estádio da Luz e isso é algo que dá logo uma confiança diferente à equipa. Ao mesmo tempo, baixa a confiança do adversário, que, neste caso, é o líder. Isso pode mudar muita coisa. Os jogadores pensam assim, de certeza, venceram os jogos seguintes e agora é uma guerra. Jogo após jogo, o pensamento do FC Porto não muda: é ser campeão. E isso é meio caminho andado. As coisas vão acontecer naturalmente. Com muito trabalho, claro, mas a mentalidade é, por si só, muito forte, de campeão.
Um tipo de mentalidade muitas vezes associado ao FC Porto...
-A mentalidade é muito forte, o pensamento de vitória. E começa já pelo treinador [Sérgio Conceição], que é um vencedor nato e já entra em cada ano com o triplo da vontade de vencer. Isso contagia os jogadores e viu-se no clássico da Luz, em que a equipa do FC Porto passou por cima do Benfica com uma grande facilidade mental. Num jogo dificílimo, contra uma grande equipa! Mas a parte psicológica do FC Porto foi mais forte e fundamental para virar o jogo e, quem sabe, o campeonato. Eu, como portista, tenho de torcer por uma escorregadela do Benfica e para que o FC Porto vença todos os jogos.
"Aquela cabeça de adolescente" à chegada
Kelvin aterrou no Porto em 2011, com apenas 18 anos e, reconhece, numa fase de alguma imaturidade. "Aconteceu tudo muito rápido, e aquela cabeça de adolescente... Passei da Série B para uma liga europeia, nem tudo foram vitórias, mas fui mostrando o meu futebol", conta o extremo, que chegou a ser cedido ao Rio Ave. "Todos os momentos serviram para crescer, serei sempre grato ao FC Porto", afirma.
O clique que não se deu: "a motivação quebrou"
O icónico golo ao Benfica podia ter sido o clique para a "afirmação definitiva", mas o destino assim não quis. "Senti que era o meu momento, mas o treinador mudou [entrou Paulo Fonseca] e não tive as oportunidades que esperava. Houve ali um travão à minha evolução e a motivação quebrou. Nunca deixei de ser profissional, mas faltou um pouco da minha parte", admite Kelvin.