Manuel José, que tem uma “relação afetiva muito grande e longa” com as panteras, está “chocado e triste”. Ainda “há esperança”, diz, mas a descida é “praticamente inevitável”
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Após a derrota, no Bessa, com o FC Porto, o Boavista necessita, para evitar a despromoção à II Liga, de ganhar em Arouca e esperar que Farense e Aves SAD percam, em casa, contra Santa Clara e Moreirense. “Se descer, os patrocinadores desaparecem todos e, sinceramente, não sei qual será o caminho do Boavista”, afirmou Manuel José a O JOGO. “Já foi o quarto maior clube do país, uma equipa de um bairro do Porto, o da Boavista, que fez o que fez no futebol nacional e internacional... Estar nesta situação é muito triste. O buraco onde o Boavista certamente vai cair é negro”, considerou o treinador que orientou os axadrezados entre 1991 e 1996. “Este momento é o reflexo dos últimos anos do clube. Tem vindo sempre a descer, a perder qualidade, com dificuldades de toda a ordem, a nível diretivo e de treinadores. Stuart Baxter é o terceiro treinador, veio com muito pouco conhecimento do futebol do Boavista; os jogadores é que tiveram de se adaptar. A maior parte deles são estrangeiros [19 nacionalidades diferentes], a descida é quase uma inevitabilidade”, lamentou o segundo treinador da lista com mais jogos pelos axadrezados (211), atrás de Jaime Pacheco (358).
A “lenda do Egito”, após conquistas de sonho pelo Al-Ahly, reconheceu que “o futebol tem muitas surpresas”. “Ninguém imaginava que o Farense, que está com a corda na garganta, mas um pouco mais folgada, ia ganhar a Guimarães. O Boavista tem um historial enorme e uma vivência na I Liga de imensos anos [62 épocas]. Enquanto há vida, há esperança, mas, sejamos realistas, é muito reduzida. Está numa situação precária e, mesmo ganhando o jogo que lhe falta, isso pode ser insuficiente”, acrescentou o técnico de 79 anos, que conseguiu, em 1993/94, conduzir a equipa axadrezada a uma histórica presença nos quartos de final da então Taça UEFA. “A minha relação afetiva com o clube foi muito grande e muito longa, continuo a ser adepto do Boavista e, por isso, choca-me ver o clube nesta situação. Não conheço em profundidade a situação financeira, mas sei que tem tido muitos problemas e uma instabilidade muito grande em termos diretivos. Com todo o respeito pelo Fary [presidente da SAD], é um bocadinho o reflexo do que tem sido este trilho descendente em que o Boavista entrou e que, inevitavelmente, vai acabar mal”, defende. “Ou aparece um patrocinador qualquer que resolve investir no clube com um grande historial e revitalizá-lo para o trazer de volta à I Liga com melhores condições e com os problemas financeiros também resolvidos ou não se augura nada de bom”, perspetivou o treinador.
Muitas decisões em cima do joelho
Após um período em que esteve impedido de inscrever jogadores, o Boavista contratou, já depois do fecho de mercado em janeiro, uma dezena de jogadores desempregados “Em casa onde não há pão, todos ralham e ninguém tem razão. Muitas decisões foram, de certeza, tomadas à pressa, em cima do joelho”, aponta Manuel José. “Contrataram dez jogadores que vieram para ajudar a equipa a manter-se na I Liga. A maioria nunca jogou em Portugal, não tinha ritmo, eram desempregados. Se estavam sem clube, tinham um nível que normalmente não seria aceitável pelo Boavista, mas a SAD teve de o fazer. Apesar de toda a boa vontade e do profissionalismo que possam ter – e têm, com certeza – foram incapazes de tirar o Boavista do fundo”, avaliou.