Há histórias que valem a pena ser contadas, recontadas e relembradas. O trajeto de Fábio Faria é um hino à vida e ao que de melhor podemos aprender com ela. Mesmo depois de ter visto a morte bem de perto. Uma história recuperada para a atualidade perante o que sucedeu com Iker Casillas
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Dia 4 de fevereiro de 2012. Dois minutos depois dos 90 de um Moreirense-Rio Ave, a contar para a Taça da Liga, o defesa, que tinha acabado de regressar a Vila do Conde cedido pelo Benfica, caiu em campo e iniciou um processo que lhe colocou a vida em risco e o obrigaria a abandonar o futebol um ano mais tarde.
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Esse momento ainda hoje dói a Fábio Faria que, mais de sete anos depois, não consegue disfarçar uma ou outra lágrima que teima em saltar, num misto de tristeza, por a vida com que sempre sonhou ter terminado tão cedo, e de felicidade e agradecimento, por continuar por cá.
"Era jogador do Benfica, tinha 22 anos, e um percurso profissional que me alegra muito. Tudo me corria bem. Estava contente com tudo o que tinha conseguido... Até aquele dia em que a minha vida mudou completamente", começou a relembrar o ex-jogador.
Aqueles minutos de indisposição encarados com calma
Dentro do relvado, aqueles minutos de indisposição foram encarados com alguma calma, uma vez que Fábio Faria acreditava que tudo aquilo não passava de uma quebra de tensão. Nessa altura, nenhum cenário pior passou pela cabeça do atleta e dos que o rodeavam.
Mas o pior estava para acontecer. Depois de no balneário ter-se confirmado a gravidade da situação, com o jogador a deixar de sentir o corpo e a desmaiar, foi no caminho para a ambulância - que chegou 30 minutos depois, porque tinha ido para o estádio errado - que o pai de Fábio Faria, Chico Faria, também ele ex-jogador e referência do Rio Ave, correu em direção ao filho para perceber o que se passava. "Então baixinho, como é que estás?", disse numa instintiva esperança de pai em ouvir o que se quer. Mas a resposta deixou todos em pânico e com uma incerteza dolorosa se alguma vez voltariam a ver Fábio com vida. "Já fui".
Mas não foi. O percurso foi complicado, incerto e doloroso. A gravidade da situação, que posteriormente foi assinalada como cardíaca, nunca foi escondida ou desvalorizada. Durante um ano Fábio manteve a secreta esperança de que um dia poderia regressar a pisar o relvado e fazer o que mais gostava na vida. Mas o coração assim não quis. E depois de mais três ou quatro "sustos" a consciência de que não poderia seguir por ali foi mais forte.
A vida, em determinada altura do seu percurso, fechou-lhe uma porta, cobriu-lhe todos os sonhos de tons escuros, mas Fábio Faria levantou-se firme permitindo ao destino abrir janelas que hoje fazem dele um homem feliz e realizado
O caminho teve que ser feito com um desvio e, nesse processo, Carla Balhinha, atual companheira de Fábio, teve um papel importante. A jovem designer chegou à vida do atleta para lhe trazer esse novo ânimo. Juntos fizeram planos de vida e juntos decidiram seguir profissionalmente. Criaram uma marca de roupas e mais tarde uma fábrica familiar de biquínis.
Tudo começava a encaminhar-se para Fábio mas o futebol continuava-lhe a correr no sangue, mesmo que o afastamento lhe tenha tolhido qualquer aspiração de regressar de alguma forma.
O regresso acabou mesmo por acontecer. No clube onde teve o pior momento da sua vida, o Rio Ave, orienta agora os jovens da equipa B, como adjunto de Zé Gomes.
A vida, em determinada altura do seu percurso, fechou-lhe uma porta, cobriu-lhe todos os sonhos de tons escuros, mas Fábio Faria levantou-se firme permitindo ao destino abrir janelas que hoje fazem dele um homem feliz e realizado.