Declarações de Daniel Sousa, novo treinador do Braga, no podcast "O princípio era a bola", de Rui Malheiro e Tomás da Cunha, no evento Future Stage, organizado pelo clube minhoto. O guarda-redes Matheus e o árbitro João Gonçalves também estiveram presentes
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Desafios de um treinador: "O que vejo como tarefa mais difícil de um treinador é a construção do plantel e os seus ajustes. A configuração do plantel é extramamente importante. Apanhando um projeto de início há essa possibilidade de ir ao encontro da ideia e da visão que se tem para o clube. Quando se entra a meio da época, como ocorreu no passado, há todo um ajuste meu ao momento, existem condicionantes no entendimento do jogo e no que é a matéria humana disponível. Há aqui ajustes que se podem fazer, há uma margem de olhar para o mercado."
Ajustes à identidade: "A equipa serão sempre os jogadores. Cabe-me só tornar a equipa mais eclética, ter uma certa variedade que pode não ter, serei eu a achar que pode haver essa variedade em situações de jogo. Podemos procurar outro tipo de soluções para acrescentar à qualidade já existente."
Já visualiza um Braga a construir a partir do Matheus e vendo as diferenças num Arouca onde havia essa procura do Mujica? "Basicamente vamos procurar ter variabilidade na forma de jogar, na construção curta ou longa. Como se prepara uma segunda bola. Havia Mujica a dar sensação de profundidade no Arouca. Aqui temos de trabalhar outras soluções, a partir das decisões de saída curta do Matheus. Temos de deixar ao critério de quem está no campo as decisões. Apenas transmitimos as tarefas básicas. Há tarefas que, depois, queremos acrescentar na construção do jogo e no controlo da profundidade. Sabemos da qualidade dos atletas, não vamos pedir coisas incompatíveis para eles."
Caminho para o golo: "É uma frase recorrente que tenho de pensar o jogo a partir do golo. É uma forma de desmontar o próprio treino. Se olharmos a um treino-conjunto, de configuração coletiva, é natural que acabe com dois ou três golos. Isso sempre me fez confusão. Em termos de dinâmica semanal, espero sempre um certo número de golos, que resultem da repetição de tarefas. Por isso tento que se faça um pouco mais de finalização com avançados e médios, procurando esses caminhos para o golo."
Perfil atrativo: "Fico mais confortável se a bola estiver junto da baliza rival. Mas temos coisas acauteladas, embora os intérpretes e qualidades são diferentes. Isto tem mais a ver com jogadores, com a realidade que temos. Quer no Gil Vicente e Arouca, quer no Braga, há momentos do jogo que vamos à procura de ter grande qualidade. Já visualizei algumas coisas da época passada e o que posso dizer é que queremos fazer com que aconteça de forma mais regular. "
Plantel: "Construção do plantel não é só escolha do perfil, é o número de jogadores. Procuro aqueles que não têm medo de errar, o erro faz parte, temos de o minimizar com equilíbrios e pela forma como se antecipam determinadas perdas. Com mais posse de bola, sabemos que a vamos perder mais vezes e, mais vale, perdê-la arriscando qualquer coisa. Os jogadores devem arriscar, vão errar e devem aprender com os erros."
Tem plano A e plano B neste salto para Braga? "Aqui a dimensão do Braga exige maior variabilidade nos processos, no que são soluções para atacar, abrir alas, isto além da parte estrutural, que pode ser de continuidade ou de mudança. É algo que terá de ser consolidado para nos dar capacidade de surpreender."
Intervenção do treinador dentro do jogo: "Há uma gestão emocional que se deve fazer do jogo, uma interpretação do que ele está a pedir, é uma gestão que pertence aos atletas. É algo que tem de estar trabalhado e assimilado previamente. Se a saída curta não funciona, temos de ir na longa de uma certa forma. Os jogadores têm de ter essa capacidade, não os podemos bloquear."
Exigência em Braga: "A fasquia tem de ser elevada num clube como o Braga. Como profissional sempre a tive, como adjunto do André [Villas-Boas] e agora. Tento fazer sempre melhor que no passado. O fazer melhor tem sempre uma abrangência muito grande, pode estar relacionada com golos, tabela, resultados. Quem me contratou agora, ou no passado, sabe que o que me carateriza é o trabalho. Acredito que as coisas só acontecem com o trabalho."
Como um treinador olha hoje para a vida dos jogadores: "Uma das coisas que fui compreendendo é o que é ser jogador, os sacrifícios que se fazem, mesmo com salários acima da média. A vida não é tão fácil quanto isso, anda-se com a casa às costas para todo o lado. Mesmo quem não sai para fora, falta a festas de filhos, falta a momentos importantes de quem lhe é próximo."
O que sente um treinador ao trabalhar na China: "Senti uma realidade muito diferente, o futebol jogado é diferente. Lembro-me de ter ido ver a final da Taça da China com o André para percebermos o que nos esperava. Ficamos assustados com o futebol, com o jogo, vimos coisas que não eram concebíveis. Lá era uma normalidade, mudar aquilo não era de um dia para o outro. Havia resistência e era difícil mudar esses comportamentos. Há também a barreira linguística, perde-se a emoção na mensagem."