FORA DE JOGO - Entrevista a Inês Gonçalves, jornalista da RTP
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Termina hoje a Volta a Portugal. Inês Gonçalves volta a casa, depois de duas semanas no pelotão português. Uma cara linda, que é um pouco a cara da RTP nesta Volta, há 16 anos. Uma jornalista, que também podia ser modelo, com muito para contar.
Afinal, conta lá à gente, percebes alguma coisa de ciclismo?
Percebo e adoro, tive os melhores professores que alguém pode querer. O Marco Chagas, o Ricardo Scheidecker e o Miguel Barroso foram as pessoas que mais me ensinaram. Em 2005, quando fiz a Volta a Portugal pela primeira vez, conheci o Marco, era uma delícia ouvir um dos maiores nomes da história do desporto português, poder fazer-lhe todas as perguntas, tirar todas as dúvidas. Na altura, o Miguel Barroso era meu diretor, ele foi sempre um apaixonado pelo ciclismo, tanto que pensou, desenhou e coordenou a transmissão da Volta durante anos, ninguém na RTP sabe tanto de ciclismo e de televisão como ele. No ano seguinte, em 2006, conheci o Ricardo Scheidecker, nesse tempo fazia parte da organização da Volta. Entretanto, a competência levou-o a trabalhar em algumas das melhores equipas do World Tour, a Liga dos Campeões do ciclismo. Não há nenhuma grande prova que não seja motivo de conversa diária com o Miguel e com o Ricardo, é assim há vários anos.
E como foste parar ao ciclismo?
Aconteceu de uma forma simples, perguntaram-me se me sentiria confortável a fazer a Volta a Portugal, isto em 2005. Respondi nesse instante que gostava de ciclismo, costumava ver e, embora não fosse uma especialista, tinha a certeza que queria aprender. Foi assim que começou, depois vieram muitas, só não fiz a Volta a Portugal em 2016 porque fui destacada para a cobertura dos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro. E com isto já vou na 16.ª Volta.
Já te sentiste discriminada no meio de um pelotão repleto de homens?
Não, nunca me senti descriminada. O ciclismo português, o pelotão nacional, que conheço bem, tem algumas das características que mais aprecio: o respeito, a humildade, o reconhecimento. Cruzo-me com eles há muitos anos, há uma grande proximidade e sobretudo uma grande admiração.
Não há muitas colegas jornalistas a fazer o que tu fazes. Gostavas de ter mais concorrência?
Hoje já há muitas mulheres a fazer o que eu faço, quando comecei éramos realmente poucas. Vejo com grande satisfação mais mulheres nestes lugares, mas ainda há um grande caminho a percorrer. O reconhecimento do trabalho das mulheres em áreas dominadas por homens nem sempre é fácil, a história está cheia de exemplos. Há uma montanha grande para escalar, não falta tudo, mas ainda falta muito.
Desde sempre trabalhaste em desporto na televisão. Isso foi uma opção ou foi por acaso?
Foi uma opção desde o início. Sempre quis ser jornalista nesta área, desde pequena. Cresci a praticar desporto, este é aliás um hábito de família. A isto juntei o gosto pela leitura e por contar histórias.
E onde é que te sentes na tua cadeira de sonho, a apresentar um jornal ou a fazer reportagem?
Sempre consegui conciliar a apresentação com a reportagem. Em 20 anos passei mais tempo no estúdio, é verdade, mas poder fazer as duas coisas é um privilégio. Todos os jornais que apresentei, todos os debates, nove anos a apresentar a Liga dos Campeões, 15 anos na Volta a Portugal, sete anos a coordenar, todas as reportagens e tantas experiências profissionais, deixam-me satisfeita.
O que tens a dizer a quem acha que o jornalismo desportivo é uma coisa menor dentro da comunicação?
Achar isso é sinal de ignorância.
Com a cara bonita que tens, nunca pensastes em ser modelo?
Esse é um bom elogio. A resposta à pergunta é não, nunca.
Que entrevista é que gostaste mais de fazer na tua carreira?
Não posso nem consigo escolher só uma. Já entrevistei o Cristiano Ronaldo, o José Mourinho, o Buffon, o Neymar, tantos! Senti a mesma admiração quando entrevistei o Fernando Pimenta, o João Almeida, a Telma Monteiro, o Nelson Évora, o Miguel Oliveira, por aí fora. Mas há uma entrevista que guardo com uma ternura especial, um dia consegui entrevistar o Maradona que foi muito mais do que um jogador de futebol, há pessoas que parecem estar mais perto da perfeição e de Deus, ele foi uma delas.
Fazer uma Volta a França seria uma coisa do ouro mundo, não?
Fazer o Tour vai ser uma coisa do outro mundo, não sei quando, sei apenas que vai acontecer. Em trabalho ou em lazer, vai ser fantástico.
És uma pessoa feliz?
Sou uma pessoa normal que procura a felicidade todos os dias, que a encontra nas corridas, num jantar divertido com amigos, com a família, numa boa conversa, num abraço honesto, num pé de dança (que saudades disso) ou num projeto exigente e demorado. Todos tropeçamos na correria, não fazer disso um problema é uma grande felicidade.