CONTRA-GOLPE - Opinião de João Araújo
Corpo do artigo
Arsène Wenger aproveitou uma entrevista ao jornal "L"Équipe" publicada na sexta-feira para voltar a fazer campanha pelo Mundial a cada dois anos, ideia que não é nova e que o responsável da FIFA pelo desenvolvimento do futebol já tinha divulgado há meses.
Para o francês, o plano além de exequível é, até, melhor para clubes e seleções. As pausas das competições internas para compromissos de seleções ficariam reduzidas a duas janelas, em outubro e março (ou, idealmente, a uma só), além da fase final, claro. Um Mundial a cada dois anos significaria, também, um Europeu (e restantes provas continentais) com a mesma periodicidade, de forma alternada, ou seja, a cada final de temporada haverá uma fase final.
E como, garante Wenger, as tais duas (ou uma) janelas de seleções poupariam nas deslocações dos internacionais, os jogadores teriam obrigatoriamente 25 dias de férias finda a época. Na opinião do ex-treinador do Arsenal, que admite saber do que fala por ter sofrido na pele constantes razias no plantel por causa das provas de seleções, isto será uma forma de elevar a qualidade do futebol, correspondendo aos desejos dos adeptos.
As questões que este plano levanta surgem em catadupa e por isso as reações adversas não demoraram. Desde logo a UEFA, por não ter sido consultada, tal como nenhuma outra confederação, mas também uma associação internacional de adeptos (Football Supporters Europe, particularmente ativa na rejeição à Super Liga europeia), que pôs o dedo numa ferida profunda.
Disse o seu presidente que o futebol precisa desesperadamente de uma reforma, mas este tipo de projetos só vai agravar o problema, não será uma solução por acentuar o desequilíbrio entre futebol local e nacional - aquele que é vivido pelos adeptos - e o continental e internacional - onde estão os grandes patrocinadores e negócios. E, de facto, este parece um plano pensado para virar ao contrário a pirâmide do futebol, com a FIFA a concentrar os seus esforços exclusivamente no desenvolvimento do potencial financeiro da elite do jogo.
Como quase tudo o que envolve grandes projetos como este, é impossível não pensar no dinheiro como motivação, ainda que Wenger o negue. O pedido de estudo da viabilidade do plano partiu da Arábia Saudita, a Confederação Africana apoia a ideia, tal como Nepal, Sri Lanka, Maldivas, Bangladesh, México e Costa Rica. Potências do futebol ou meros interessados nos dividendos que a FIFA distribui anualmente? Na Europa, sabe-se que a Dinamarca está contra, adivinhando-se mais uma guerra entre FIFA e UEFA tendo o calendário internacional por tabuleiro.
Com o Mundial de Clubes de Gianni Infantino adiado "sine die", esta é outra forma de a FIFA alimentar a sua teia (e ganhos), fazendo pensar que adeptos e jogadores são pouco mais do que meros acidentes de percurso neste negócio chamado futebol.