O JOGO foi à procura do segredo de Portugal e encontrou a sala das vitórias
Seleção Nacional é a surpresa do campeonato da Europa de andebol e abriu a O JOGO a sala onde a maior equipa técnica de sempre prepara jogos como o deste domingo, com a Islândia.
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As críticas foram unânimes: Portugal esmagou a Suécia, não só a nível físico como também tático.
Tendo o jogo sido preparado em menos de três dias, ao longo dos quais a Seleção Nacional também já teve de começar a pensar na Islândia, que defronta este domingo (13h00, Sport TV5), Eslovénia e Hungria, rivais de terça e quarta-feira, percebe-se que isso só será possível com um enorme trabalho de bastidores, bem mais complicado do que o das vitórias frente a França e Bósnia Herzegovina, adversários estudados ao longo de meses. O segredo está naquela que é a maior equipa técnica de sempre das Seleções Nacionais de andebol, como O JOGO foi descobrir.
Paulo Jorge Pereira, o primeiro treinador português a apostar seriamente numa carreira internacional - depois de ter estado sete anos no FC Porto, como adjunto de José Magalhães, depois do sérvio Branislav Pokrajac e, por fim, como técnico principal -, tendo passado de seguida por Espanha, Angola, Tunísia e Roménia, é o principal rosto técnico da Seleção Nacional A, tendo assumido o cargo em 2016.
No ataque a este Europeu, o selecionador reforçou a equipa com que trabalha, aumentando-a para sete elementos. "Sem eles era muito difícil. Podia fazê-lo, e aliás até já o fiz. Estive em dois Mundiais femininos e no de Angola, em 2009, em que era eu que cortava vídeo, preparava o treino e depois tinha os jogos. Quase não dormia e era difícil render nos jogos", recorda, abrindo a O JOGO as portas do quartel-general da Seleção Nacional, numa sala de hotel em Malmö.
"Funcionamos com uma espécie de linha de produção para orientar os treinos e preparar os jogos. A ideia, na verdade, é ter uma linha de produção de jogo", explica o técnico. "Até agora tem corrido bem, embora haja sempre situações que se possam melhorar", continua, garantindo que "a comunicação entre todos os elementos é fácil".
Um por um, Paulo Jorge Pereira explicou as funções de cada elemento da equipa técnica. Tiago Oliveira, sendo pouco conhecido, é fundamental na preparação das imagens sobre os novos rivais. "Só dois treinadores a cortar vídeo e a preparar jogos, fazendo-o com um dia de antecedência - e vamos ter dois jogos sem intervalo! -, era quase impossível. Ele é uma ajuda fundamental. Deita-se às duas, três da manhã ou mais, mas permite-me deitar e levantar cedo, o que não aconteceria se ele não estivesse. É uma ajuda importantíssima na preparação dos vídeos", diz Paulo Jorge.
Paulo Fidalgo, seu adjunto e também treinador do Madeira SAD, é o número dois da "linha de produção". "Os jogos são praticamente seguidos, é preciso jogar hoje e pensar logo no de amanhã. O Paulo está sempre à minha frente, é ele que vai começando a analisar o vídeo que o Tiago já cortou. Ou seja, isto começa no Tiago, passa para o Fidalgo e só depois chega a mim", contou, prosseguindo a explicação: "Na realidade recebo esses vídeos ao mesmo tempo, porque eu trabalho coisas mais globais e o Fidalgo as individuais. Com isso, os jogadores ficam com toda esta informação a tempo de também fazerem os seus estudos e análises."
Treinos com um fisiologista para "libertar" o selecionador
Num Europeu, a condição física é fundamental. Portugal já fez quatro jogos em sete dias e tem mais três até quarta-feira, ambicionando chegar às finais do fim de semana. Aqui, o protagonismo é de Sérgio Monteiro, "a incorporação mais recente", diz Paulo Pereira sobre o mais jovem do grupo: o fisiologista tem 28 anos. "É uma pessoa apaixonada pelas questões da preparação física e fisiologia. Consegui preparar tranquilamente o jogo com a Suécia porque sabia que ter alguém no ginásio a fazer um trabalho correto com os atletas", admite Paulo Jorge Pereira. "Para nós é excelente, porque até agora funcionávamos em multitasking e eu não acredito que esse seja o caminho do sucesso", anotou o técnico natural de Amarante, mas que viveu desde o primeiro ano de idade no Porto, com os pais, Rodrigo e Rosa.
Dois fisioterapeutas para 18 jogadores
Na Seleção Nacional é amplamente reconhecida a competência do fisioterapeuta Paulo Catarino - quando Pedro Spínola, que joga no Berna, da Suíça, se lesionou, foi a Catarino que confiou a recuperação - e Pereira não lhe poupa elogios. "É um homem que já conhecemos há muito tempo, pessoa dedicada a 100%, que também dorme muito pouco e acaba por ser, juntamente com o Fidalgo, o meu braço direito", reconhece Paulo Jorge Pereira.
"Tem sido de uma ajuda extremamente importante e até o levei uma semana a Bucareste, quando estava no CSM, para ajudar os fisioterapeutas que lá estavam", conta o selecionador, explicando que "também tem sido muito útil na recuperação dos jogadores e na prescrição de trabalhos para essa recuperação; ou seja, abrange uma área mais alargada".
Neste Europeu, Paulo Catarino deixou de estar sozinho, tendo agora a colaboração de um fisioterapeuta que é alferes no Centro de Saúde Militar de Coimbra. "O Frederico Silva também foi uma incorporação recente. Ajuda o Catarino e trabalham em conjunto. Para nós é essencial, porque, com jogos em dias sucessivos ou apenas um dia de intervalo, sem uma atenção mais cuidada na recuperação dos esforços torna-se difícil continuar a render", justifica, lembrando que há 18 jogadores para massajar diariamente.
O novo elemento "é uma pessoa altamente prestável e ajuda no que for preciso, mesmo fora da jurisdição dele". "Está aqui de coração aberto e isso é espetacular", termina Paulo Jorge Pereira, lembrando que a equipa técnica ainda recebe o apoio de Miguel Fonseca, secretário da Federação de Andebol de Portugal, nas questões logísticas.
Telmo Ferreira gere os guarda-redes
"O Telmo Ferreira, além de trabalhar com o Quintana no FC Porto - o que ajuda, porque já existe uma relação de clube, conhecem-se bem e leva-o sempre ao seu melhor nível -, ajuda-nos bastante com os outros guarda-redes", analisa o selecionador nacional. "O Telmo faz o trabalho dele de vídeo, ou seja, não se limita ao de campo", explica. Os guarda-redes, e quem está de fora não o percebe, estudam previamente a colocação do remate de cada adversário, um dos segredos para defesas fantásticas. Isso passa por Telmo Ferreira, mas não só. "Os guarda-redes são inteiramente com ele. É ele que diz quem joga, embora, como na política dos Estados Unidos [risos], eu tenha direito de veto, caso ache que é preciso mudar alguma coisa. Mas é sempre ele e confio inteiramente, mesmo em trocas durante o jogo."
"É gente com experiência"
A Islândia, adversário de Portugal pela hora de almoço deste domingo, tem zero pontos, mas Paulo Jorge Pereira deixa esse número de lado. "Basta ver onde joga esta rapaziada, é gente com experiência. E eles, de certeza, ainda não desmontaram a tenda, têm objetivos. Há os pré-olímpicos e eles têm essa noção", justificou o selecionador, continuando a falar de objetivos, mas dos de Portugal. "Temos ideias claras, sabemos o que queremos e - tenho vindo a falar com todos, não só com os atletas -, o objetivo é mesmo melhorar o sétimo lugar da Croácia, que foi em 2000, com aquela brilhante equipa, se calhar a melhor geração de sempre. Ou então estará aqui a melhor, já nem sei...", disse o técnico, que sabe serem necessárias mais duas vitórias para atingir essa meta (terceiro lugar do grupo), e insistiu: "O que está em jogo é melhorar um resultado obtido de forma extraordinária e, se o fizermos, estaremos todos de parabéns. Só pensamos nisso, é uma coisa de cada vez e, também já o tenho o dito, se depois tivermos de estabelecer outro objetivo, assim o faremos. Para já é este."
Pereira diz ainda que "a Islândia tem uma ótima primeira linha, com jogadores que atiram bem, como o Pálmarsson [jogador do Barcelona]", mas está confiante: "Se não nos deixarmos atraiçoar, e sendo um jogo difícil, podemos perfeitamente ganhar."
"São os melhores do mundo no 7x6"
"Se querem mesmo saber o que penso, diria que atualmente eles são os melhores do mundo a jogar em sete contra seis", atirou Gudmundur Gudmundsson, treinador da Islândia, a fechar a conferência de Imprensa de antevisão do jogo com Portugal.
Os nórdicos, ainda sem pontos no Grupo II, não se dão como derrotados, mas os elogios à equipa portuguesa são imensos. "Do que vimos, são fisicamente fortes, muito bem organizados e com uma boa ofensiva. Atiradores muito bons, excelentes pivôs e grandes pontas. Em suma, uma equipa muito boa", completou o selecionador, que embora admita poderem os portugueses "atingir as meias-finais", diz ter a equipa preparada para lutar, lembrando que "nós eliminámos a Dinamarca, campeã do mundo".