Não correu nada mal o batismo internacional de uma equipa portuguesa de futebol americano. Nos Olivais, os Lisboa Devils derrotaram os Istambul Sultans e agora já só pensam em chegar à final four da Liga dos Campeões desta modalidade, importada dos Estados Unidos, mas que por aqui ainda é uma criança.
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Rafael Pacheco, o porteiro, joga como Running Back, mas está lesionado. Paulo Viegas, o vendedor de bilhetes, é Linebacker mas não foi convocado. O speaker de serviço também joga na equipa, mas não pôde participar, enquanto Duarte, o presidente, anda por todo o lado de walkie-talkie na mão a coordenar as operações. A irmã dele dá uma ajuda. Na pequena bancada do Campo Branca Lucas, nos Olivais, entre amigos, familiares, jogadores de equipas adversárias e muitos curiosos, alguns deles norte-americanos, são cerca de 200 os que vão espreitando para o que se passa no relvado.
"16-20? Isto pode virar de um momento para o outro, não quer dizer nada", comenta Paulo Viegas já no terceiro dos quatro períodos de 15 minutos, aludindo à superioridade momentânea dos Istambul Bogaziçi Sultans, os turcos que apadrinham a estreia internacional dos Lisboa Devils, uma das melhores equipas de futebol americano em Portugal. Aliás, este é mesmo o primeiro jogo oficial de sempre de um conjunto português contra um estrangeiro e logo na maior competição de clubes europeia.
"Let-se go, defence!" O speaker vai puxando pelos espectadores, ajudado por uma rapariga que não deve ter mais de dez anos. "1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, com os Lisboa Devils ninguém se mete; 7, 6, 5, 4, 3, 2, 1, como os Lisboa Devils não há nenhum", canta ela, aplaudida pelos que estão na bancada. É uma das estrelas da festa.
As outras estrelas são os 80 jogadores que competem no relvado artificial dos Olivais. 80, leu bem. 45 na equipa portuguesa e 35 na turca. Ao mesmo tempo, jogam apenas 11 de cada lado, mas o esforço é muito, a adrenalina (e a testosterona) também, pelo que convém ir rodando frequentemente a equipa que está a jogar.
O confronto físico direto é uma das vertentes de um jogo que faz lembrar o râguebi. Este, no entanto, é praticado de capacete, proteções nos ombros, caneleiras e luvas. Os atletas estão bem protegidos para o choque. "O futebol americano é muito mais agressivo do que o râguebi. Aqui, como têm proteções nos ombros, pensam que podem fazer tudo", analisa Thomas Colette, natural dos Estados Unidos (Albuquerque) que esteve alguns minutos a observar esta partida e que curiosamente, na adolescência, tinha sido praticante das duas modalidades. "No râguebi tudo é técnica, enquanto o futebol americano tem muito mais contacto. Gosto mais de jogar râguebi, mas como espectador gosto mais de ver futebol americano", diz.
Uma das equipas faz um ensaio e a seguir concretiza um remate entre os postes, ligeiramente tortos. "Os postes estão tortos porque não temos dinheiro para postes de metal e estes são de PVC", explica Paulo Viegas, perante o reparo.
O dinheiro, para já, é escasso para as necessidades do clube. "Os nossos jogadores pagam uma mensalidade para jogar. Precisávamos de mais dinheiro, para termos mais pessoal a ajudar nas operações e para contratarmos mais uns jogadores estrangeiros. Para já, temos três norte-americanos, mas a única coisa que lhes pagamos é o alojamento. A alimentação é a cargo de uns amigos nossos que têm restaurantes e vão fazendo esse favor", explica o presidente Duarte Hipólito Carreira.
A escolha dos americanos parece ter sido acertada. Collin Franklin marcou os três primeiros ensaios da equipa e Joey Bradley o último, que faria história para o futebol americano em Portugal, ao dar a primeira vitória a uma equipa portuguesa logo no batismo internacional da modalidade. 32-27 foi o resultado que fica para a história.
Campeões nacionais pela primeira vez
Depois do bem sucedido batismo internacional frente aos Istambul Sultans, os Lisboa Devils venceram ontem o primeiro título da sua história, mais concretamente o campeonato nacional português, ao derrotarem na final, disputada na Maia, os Algarve Sharks, por 28-26. Formada há três anos, a equipa dos Olivais conseguiu assim destronar os Lisboa Navigators, campeões em título e, aliás, vencedores das seis edições da prova até agora disputadas. Os Devils ampliam para 11 a série de vitórias consecutivas, depois de terem ganho todos os jogos da época. Na fase regular, venceram seis partidas contra os três adversários da Zona Sul (o norte tinha seis equipas), depois mais dois jogos na fase mista e ainda as meias-finais, diante dos Paredes Lumberjacks, para além da estreia na Champions. Nesta competição, a equipa vai jogar a segunda mão à Áustria no dia 8 de maio, procurando o apuramento para a final-four.