Isaac Nader ganha 84 mil euros com a medalha de ouro nos 1500 metros em Tóquio'2025
Algarvio de 26 anos, com uma aceleração espantosa, deu a Portugal o título mundial inédito nos 1500 metros. Oitava medalha de ouro lusa em Mundiais superou o bronze de Rui Silva na mesma corrida e igualou o título de Carla Sacramento em 1997. Mas nunca um final de portugueses fora tão intenso e inesperado.
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Ouro vale prémios de 84 mil euros
A medalha de ouro do algarvio vai ser acompanhada de dois prémios monetários, inéditos na sua carreira: a World Athletics dá 70 mil dólares a cada campeão (59 mil euros) e o Governo português tem estabelecida uma compensação de 25 mil euros por títulos mundiais. O total será de 84 mil. Entrará ainda no programa olímpico para Los Angeles"2028 com o subsídio de medalhado.
Presidente Marcelo destacou a "emoção"
Foi com "enorme orgulho" que o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, agradeceu a Nader, "em nome dos portugueses", a "emocionante corrida, com um final só ao alcance dos grandes atletas".
Montenegro elogia "prova notável"
"Fantástico Isaac Nader, uma demonstração incrível de vontade de vencer e de lutar até ao fim! Mais um campeão do mundo", lê-se na página oficial do primeiro-ministro Luís Montenegro, que destacou a "prova notável".
Domingos Castro agradeceu a "ajuda"
Domingos Castro festejou em Tóquio a sua primeira medalha como presidente da Federação Portuguesa de Atletismo, lembrando que "o Isaac merecia-a mais do que ninguém, pela sua dedicação e porque tem feito coisas extraordinárias". O ouro, destacou, "ajuda muito". "Que toda a gente tenha os olhos nesta medalha, porque temos possibilidade de ganhar mais. Apelo uma vez mais ao Governo, para ver a nossa modalidade. Estamos com uma força, juventude e geração fantástica, mas precisamos de apoio", sublinhou.
"Orgulho" do Benfica ao Areias de S. João
Rui Costa, presidente do Benfica, escreveu ter "imenso orgulho" por "um resultado de excelência, que vem coroar uma temporada de altíssimo nível e envaidece os benfiquistas". Elogio semelhante veio do CD Areias de S. João, clube algarvio que lançou Nader... para os encarnados.
Nader no topo do mundo
Isaac Nader, algarvio de 26 anos, deu a Portugal a primeira medalha no Campeonato do Mundo de atletismo, que decorre em Tóquio até domingo, e colocou a maior Seleção Nacional de sempre no oitavo lugar do medalheiro graças a um dos títulos mais emocionantes na história da modalidade, embora se trate da 24.ª medalha lusa a este nível, oitava de ouro.
O meio-fundista do Benfica correu de forma inteligente a final dos 1500 metros, marcada por algumas ausências importantes - como os campeões olímpicos Jakob Ingebrigtsen (eliminado) e Cole Hocker (desclassificado) - e com o britânico Josh Kerr, que defendia o título, a ser último após uma pisadela. Nader colocou-se pouco atrás dos quenianos Cheruiyot e do neerlandês Niels Laros, que ditavam o ritmo, mas na penúltima volta, pressionado, ficou no oitavo posto. Pior ainda, estava "fechado" junto à corda da pista e assim fez metade da última volta.
"Faltavam 200 metros e tinha energia, mas não sabia quanta ainda tinha no tanque. Ao atleta que vinha nas costas só pedia para não me complicar a vida e me "fechar" para os últimos 100 metros", contou Nader, que ao chegar à última curva, e aproveitando a posição por dentro, fez duas ultrapassagens, subindo a quinto no momento decisivo.
Um "Bolt" entre os magrinhos
O momento fantástico, e inesperado, surgiu nos últimos 100 metros, quando o britânico Jake Wightman pensou ter disparado para a vitória, ultrapassando os dois Cheruiyot (sem relação familiar) e Laros. Isaac Nader, em quinto e subitamente com espaço, transformou-se numa espécie de Usain Bolt entre os magros meio-fundistas - uma comparação obviamente exagerada, pois fez os 100 metros em 12,28 segundos... - e começou a ultrapassar todos, superando Wightman, que ainda se atirou para o risco, na penúltima passada. " Tive espaço para acelerar tudo. Fui campeão do mundo e fiz história", disse o deleitado algarvio.
Nader fez realmente história. No Mundial, onde seria candidato a uma medalha, mas não ao ouro, que nos 1500 metros nunca conseguira a um nível sequer aproximado; para Portugal, que superou a ausência de pódios de há dois anos, em Budapeste, e a dependência de Pedro Pichardo; e a nível pessoal, pois ao somar inteligência tática e frieza às suas já conhecidas qualidades, de resistência e sprint, terá ganho a confiança que o colocará em outro patamar e de novo a liderar um meio-fundo português que também brilha com Salomé Afonso, sua namorada, e Patrícia Silva, filha do antigo campeão e ex-treinador de Nader.
O "reformado" fez a diferença
O espanhol Enrique Pascual Oliva ganhou fama ao levar Fermin Cacho ao título olímpico dos 1500 metros em Barcelona"1992 e Abel Antón a dois ouros mundiais na maratona, sendo agora, aos 68 anos, o treinador de Isaac Nader e Salomé Afonso, que orienta em Soria desde 2022, com resultados evidentes: a de Tóquio foi a quinta medalha do casal nos últimos dois anos. "Em Mundiais só tinha duas medalhas de prata. Ao fim de 40 anos como treinador, é a minha cereja no topo do bolo", afirmou no Japão, onde se apresentou como "um reformado que gosta de ajudar quem quer ser ajudado". Sobre Nader, explicou o que fez a diferença: "A forma de correr dele tem muitas mudanças de ritmo, muitos arranques. Quer estar sempre no sítio certo e gasta muita energia, que acaba por pagar. Mas amadureceu".
"Nunca olhei para trás"
"Nos últimos 100 metros, e acho que vinha em sétimo, só pensei dar tudo até final, porque ainda podia ser campeão mundial e ninguém me iria passar. Desta vez, a meta era o foco, não podia olhar para trás. Ninguém pode criticar o Isaac por olhar para trás", disse o emocionado algarvio após a conquista do título mundial, cometendo um ligeiro erro nas contas (era quinto quando sprintou) e revelando o que ajudou a fazer a diferença. "Às vezes não percebem porque olho para trás. Quando não posso passar ninguém, olho para assegurar o lugar que tenho. Não é insegurança, é um tique", explicou Isaac Nader, com uma confissão: "Surpreendi-me a mim mesmo".
Nader terá até surpreendido o mundo do atletismo, incluindo os comentadores ingleses, que lhe chamaram "marroquino" o tempo todo. "Digo há muito que acreditava nisto, que a medalha era o meu sonho. Agora, sou campeão do mundo. Só há um título maior, que é ser campeão olímpico. Calei muita gente. Mas essas pessoas não importam, importo eu, a minha família, a Salomé e o meu treinador", atirou, em elogios à namorada - "é a minha tradutora e companheira de todas as horas", disse - e ao espanhol que lhe mudou a carreira.
"Encaro cada vez mais isto como só uma corrida, com menos nervosismo, menos intensidade. Isso vem com a experiência, com os fracassos. Aprendi a ter calma com os resultados menos bons e agora fiz história!", finalizou.
Campeão fugido do futebol
Isaac jogou futebol no Farense até aos juvenis, optando então pelo atletismo, já com um convite do Benfica. Fugiu ao destino provável, pois é filho de uma portuguesa e do marroquino Youssef Nader, que chegou ao Algarve em 1996, como futebolista do Quarteirense, e seguindo as pisadas do irmão mais velho, Hassan, uma das glórias do Farense, onde jogou até 2004, mas passando dois anos pelo Benfica.