Artem Nych, vencedor da Volta: "Gosto de Portugal, tem pessoas muito felizes"
ENTREVISTA O JOGO >> Vencedor da Volta a Portugal visitou O JOGO, de camisola amarela e taça na mão. Revelou-se um russo feliz e pronto para liderar a Sabgal-Anicolor
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Artem Nych tem 29 anos, impressiona pelos 1,95 metros, pouco comuns para um ciclista, e sorri tanto que ninguém diria ser russo, um povo habitualmente sério -ele explica dever-se ao clima frio e revela que começou a rir mais num país que o apaixonou. Ganhou a Volta a Portugal após uma reviravolta para a história e agradece-o aos colegas e sobretudo a Frederico Figueiredo, o trepador que o rebocou em duas fugas tremendas. Promovido a chefe de fila, em vez de Mauricio Moreira, Nych visitou O JOGO e garantiu estar tranquilo com o novo estatuto.
Muitos sorrisos, simpatia e alguma humildade definem um russo de 29 anos que aprendeu depressa a falar português e a sorrir mais. Nych assume que as suas vitórias não vão ficar por aqui.
Qual é a sensação de vencer a Volta a Portugal?
-Estou muito feliz. É a maior vitória da minha carreira, mas estou muito feliz pela equipa, por toda a estrutura, pelo nosso treinador.
E por si, não está?
-Sim, claro. Fui eu a vencer. Foi muito especial.
Quando acabou a etapa da Torre era 21º, com quatro minutos de atraso. Achava que ainda era possível chegar à amarela?
-Pensei ganhar etapas e lugares. A amarela, acho que não. Era muito tempo, quatro minutos era muito mesmo.
Como reagiu a equipa depois dos maus resultados na Torre e a desistência do Mauricio?
-Ficámos tristes, mas pensamos ir à luta, porque ainda havia muito caminho pela frente. Podíamos fazer a diferença e ganhar algumas etapas.
Quando achou que ia ganhar a Volta?
-Talvez na etapa da Senhora da Graça.
Teve duas grandes fugas, para Boticas e Senhora da Graça. Qual foi a melhor?
-Não consigo comparar esses dois dias, foram ambos importantes para a geral. E nos dois foi uma fuga com o Fred. Ele fez todo o trabalho na fuga e ganhámos muito tempo devido a isso. Ele ajudou muito.
Que recorda da fuga solitária até Boticas?
-As dores na pernas! Acreditei que seria possível ganhar a etapa e tinha muita motivação. A Volta não estava a ser como queríamos e ter toda a equipa a trabalhar para mim deu-me uma motivação incrível.
Quando fugiu para a Senhora da Graça, já ia a pensar na amarela?
-Pensei a meio da etapa, quando soube a diferença para o pelotão e o Rúben disse que atrás havia pouca gente a puxar. Vi que era possível também porque o Fred era muito forte. Quando ele puxa na montanha, é muito difícil apanhá-lo.
Fez a subida da Graça sozinho e sempre para ditar o ritmo...
-… Perguntei aos outros se podiam ajudar um pouco. Todos responderam que não. Custou-me entender, porque os de trás podiam apanhar-nos e outros também tinham interesse em mudar de geral.
Esta vitória é a maior da sua carreira. Que pretende ganhar agora?
-Esta é a maior, sim. Mas nunca é suficiente. Tens de fazer tudo o que podes para ganhar mais.
Que sente quando o Rúben Pereira diz que, a partir de agora, é o líder da equipa?
-Sinto-me normal, sinto-me bem. Não me preocupa a responsabilidade, fico mais focado. Só é um problema quando és o líder e não tens pernas.
Sempre correu por equipas russas. Quais são as diferenças para Portugal?
-Não corri muito na Rússia. Nos últimos seis ou sete anos corri por toda a Europa, só não fiz Grandes Voltas. E em 2022 apenas fiz metade do calendário. Mas em Portugal o nível de ciclismo é muito maior do que na Rússia. Há muito mais equipas, que têm boas estruturas, autocarros... Na Rússia ninguém os tem, o ciclismo mais forte é o amador.
Como é viver em Portugal?
-Gosto deste país, é muito tranquilo. Tem pessoas muito vivas, felizes. Sinto-me bem cá.
Como é o seu dia normal fora das corridas?
-Se não há corrida tenho treino! Mas também passeio de bicicleta, faço caminhadas, visito algumas cidades, gosto de ver castelos. E gosto de nadar, vou à praia. Hoje ainda devo ir à Viagem Medieval. Mas sinto-me morto...
"Vocês já sabem que não vou falar sobre a guerra"
“Os meus amigos de cá são todos do ciclismo. Tinha russos, mas voltaram para casa”, revela Artem Nych, que não conhecia a palavra “saudade”, mas percebeu com O JOGO que é isso o que sente pela família. “Não”, responde quando lhe perguntamos se voltou à Rússia desde que, no final de 2022, viveu uma odisseia para chegar a Portugal.
Fala com nostalgia da sua cidade - “Sou de Kemerovo, onde mora o meu pai, mas a minha mãe vive em Krasnodar” - e diz gostar de viver em Santa Maria da Feira. Aprendeu português com os colegas, começando pelos palavrões (“Também lhes ensinei alguns em russo!”, ri-se), e admite que sorri “mais em Portugal”. “Na Rússia o clima é frio e faz as pessoas mais sérias”, explica. Ele também o fica, quando o tema é sensível, como a guerra na Ucrânia. “Vocês já sabem que não vou falar nisso”, termina.