"A minha namorada ainda gosta de mim": o retrato da odisseia de João Chalupa pelo país
Hoquista fez 800 quilómetros de patins em linha e declara o agradecimento a quem o acompanhou. Fala das dores, dos buzinões e das dificuldades a O JOGO
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O JOGO revelou em primeira mão a aventura de João Chalupa, hoquista do HC Vasco da Gama, que, de patins em linha, se desafiava a fazer de Caminha até ao Algarve. Assim foi. 800 km pelo litoral até chegar a Portimão.
"É uma sensação muito boa ser o primeiro a fazer isto, a documentá-lo. Falei muito com caminhantes. Vi um rapaz que veio da Eslováquia de bicicleta até Portugal. Foi de Tróia até Sines comigo. Trazia 5000 km feitos de bicicleta. Ajudei a que pudesse tomar banho no pavilhão onde jogo. Dei-lhe comida, água e sentes que estás a ajudar. A loucura dele era maior do que a minha. Estava há 3 meses a fazer aquilo. E isso deu me motivação. Sonhei que um dia podia fazer uma coisa daquelas. Senti-me bem por poder ajudá-lo a fazer aquilo.
Não me aleijei, nao tive acidente, nao houve problema nenhum", principia em conversa com o nosso jornal, reconhecendo que chegou a pensar desistir.
"Fiz 421 km desde a Foz do Arelho até Portimão. Os últimos dias de viagem foram muito duros. Os caminhos tinham muitas subidas e descidas. Andei fletido, em tensão muscular, agarrado ao carro nas descidas, para evitar cair. Tivemos pessoas indelicadas por estarem atrás de mim, que tinham de ir trabalhar. Passar pela área metropolitana de Lisboa foi a fase mais difícil. Tive carros a buzinarem-me, assustavam-me quando estava a 50 km por hora. Até Setúbal foi muito complicado. O dia mais difícil foi quando dormi em Sines. Fui a casa, tive de ajudar o meu pai no trabalho e quando calçei os patins doeu-me tudo. Foi muito duro, até psicologicamente. Fisicamente, de Sines a São Torpes pensei desistir. Não sei como cheguei a São Teotónio", recua, elaborando a satisfação por ter chegado a Portimão: "Apanhei chuva e vi que as rodas não agarravam ao chão, isto do Guincho até Belém. Fiz 34 km, depois fui da Costa de Caparica à Quinta do Conde, mais 29 km. No dia seguinte tinha de recuperar e fiz uma tirada louca: arranquei e decidi que iria a Santiago do Cacém, arranquei para Tróia, fiz o caminho até Melides, Santo André e depois Sines. Fiz 98 km. Foi um dia de loucos. Depois foi o dia de São Teotónio, em estradas perigosas. Senti dificuldades, mas tenho a agradecer às pessoas. Colocámos um papel no carro, a dizer que estávamos a fazer a Volta a Portugal em patins em linha e as pessoas reagiram bem. Deixaram de ser tão agressivas. Fui muito felicitado. 99% das pessoas puxaram por mim de forma efusiva. Deram-me força. Acelerei para acabar em Portimão no último dia, fiz uma grande festa e fomos jantar a sério. Fizemos quase 12 dias a comer hamburgueres e pizzas por ser a coisa mais barata", declara.
Tem um agradecimento especial à namorada Filipa, aos pais e ao amigo Manuel. "Estive em seis parques de campismo até chegar a Sines. Dormi em tendas, que era sempre um processo difícil. Foi importante ter patrocinadores, mas mesmo assim cortámos os custos no que podíamos, nomeadamente nas dormidas. Imagina fazer 90 km e montar uma tenda com dois quartos e uma sala porque era o mais barato. Isso levava sempre bastante tempo. Às vezes com frio e vento. Dormimos uma noite com as varetas partidas, o meu amigo Manuel ficou a dormir no carro dois dias para eu poder descansar. Todos os dias acordávamos muito rápido por causa da luz. O Manuel verificava os caminhos a fazer, atualizava o itinerário a cada momento. A Filipa procurava lavar e secar-me o equipamento, de modo a que eu pudesse descansar mais um pouco. Devo-lhes muito", expressa, agradecido, contando uma história curiosa no final da aventura: "A minha namorada ainda gosta de mim. Foram 12 dias a fazer Portugal a 20 km por hora. Deu-me tudo. Não foram férias. Não caí, não me magoei e, inacreditavelmente, magoou-se ela. No momento em que estamos a sair do carro para ir comer, a Filipa coloca a mão na maçaneta e eu a fechar a porta entalei-lhe dois dedos. Não sabia o que fazer à minha vida. A porta estava trancada, tive de abrir o carro e nem sabia onde me meter. Pensei que lhe tinha partido dois dedos. Ela atura-me esta loucura, esta viagem... chorava ela, chorava eu", lembra, contando o embaraço pelo momento que, felizmente, não ditou nenhuma gravidade.
Admitindo ter sentido sempre "dores nos pés", com "bolhas desde o início" e um "pé inflamado ao longo de vários dias", já voltou aos treinos no Vasco da Gama: "Andei em patins em linha, vou ter de me habituar aos patins do hóquei, mas estou preparado a nível cardíaco e a nível muscular. Arruinado estou de dores [risos], mas foi a melhor pré-época que fiz", termina a O JOGO.
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