"Vejo a polícia seis a sete vezes ao dia. O Muxa saiu sem o papel e levou multa"
Português que joga no Créteil-Lusitanos recupera de uma operação nos arredores de Paris enquanto observa um povo a cumprir "religiosamente" a quarentena.
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A pequena localidade de Créteil, situada nos arredores de Paris, é o lar de Alexandre Pardal, de 27 anos, há duas temporadas. O lateral-direito, natural de São João da Madeira, assinou na época passada pelo Créteil-Lusitanos, clube do National (o equivalente ao Campeonato de Portugal) presidido pelo luso-francês Armand Lopes e que é orientado por Carlos Secretário.
A França é o sexto país mundial com mais infetados pela covid-19 e está, à semelhança de outras nações, fechada enquanto se tenta achatar a curva da epidemia. Pardal até partilha casa com Hugo Silva, mais conhecido por Muxa, médio que também joga no Créteil, mas este voltou para casa, enquanto Pardal se vê agora sozinho, enquanto recupera de uma operação ao menisco.
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"Já andava a jogar lesionado, mas nos últimos jogos antes da paragem fiquei com o joelho mais inchado. A única coisa positiva da pandemia é que vou ter tempo para recuperar enquanto não há competição", começa por dizer o defesa, que detalhou de seguida o controlo rígido que existe em França para assegurar o cumprimento da quarentena.
"Eu fui a uma clínica através do seguro do clube e são os enfermeiros que vêm a minha casa para me darem as injeções no joelho. Agora já consigo andar com uma muleta, mas há duas semanas e meia nem conseguia caminhar e estava dependente do Muxa para tudo. Aqui, para sairmos de casa, temos de levar um impresso e justificar o motivo da saída, que pode ser problemas de saúde, compra de bens necessários ou atividades físicas. Sem essa folha, somos automaticamente multados. Vejo a polícia passar na minha rua seis a sete vezes por dia", revela.
O controlo é tão grande que o próprio Muxa foi autuado. "O Muxa foi levantar dinheiro no dia em que vinha para Portugal, mas esqueceu-se da folha e levou 130 euros de multa. Só saio de casa para ir ao supermercado e para comprar muita coisa, pois, se eu for comprar apenas um pacote de esparguete, sou multado", narra.
"Só saio para ir ao supermercado e para comprar muita coisa; se for um pacote de esparguete, sou multado"
Por estar tão próximo da capital, Pardal costuma ir a Paris com regularidade. Contudo, a cidade está despida. "Parece uma cidade deserta. Aqui estão a cumprir religiosamente a quarentena. Não facilitam. Só se veem pessoas na rua com sacos de compras ou com problemas de saúde que tenham de ir a algum lado. No meu prédio, há uma área comum e é aí que passeiam os cães. Nem à rua vão", explica.
Se as ligas se mantiverem suspensas, Alexandre Pardal tenciona voltar a Portugal, mas receia que os aeroportos até lá sejam fechados. "Tenho ouvido dizer que vão encerrar os aeroportos. De carro, é impossível viajar, pois não passamos em Espanha... Se não conseguir voltar, terei de me aguentar por cá", desabafa. Em Portugal estão os pais, a avó e a irmã, e a preocupação está nos dois lados. "O meu pai liga-me todos os dias a perguntar se tenho comida, ainda pensa que tenho 19 anos [risos]. Neste momento mudou-se para a casa da minha avó, que tem 98 anos, e a minha irmã também está com ele porque foi despedida, por causa do coronavírus, de um restaurante no Porto onde trabalhava, e então abandonou a cidade para não estar a pagar um quarto", revela.
Clube avança com o "lay-off"
O Créteil optou por colocar o plantel em "lay-off". Dito isto, Alexandre Pardal vai receber 85 por cento dos 3400 euros brutos (cerca de 2600 limpos) que aufere mensalmente. "O que eu ganho no Créteil dá para fazer um bom pé de meia, já que também tenho a casa paga e praticamente só gasto dinheiro com a alimentação e com os transportes para ir para o treino. Os 85 por cento acabam por ser um valor justo mediante aquilo que ganho. Entendo a posição do clube, visto que está privado de várias receitas", comenta.