A garantia de Fernando Santos: "Vamos jogar para revalidar o título europeu"
ENTREVISTA - A pouco mais de um mês do arranque do campeonato da Europa, Fernando Santos fala a O JOGO sobre as ambições para o torneio em que Portugal defende o título conquistado em 2016.
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A pouco mais de um mês do arranque do Euro"2020, Fernando Santos recebeu O JOGO na Cidade do Futebol. Deu conta das suas ambições e dos seus planos para a equipa. Lembrou conquistas e admitiu erros de avaliação cometidos para o Mundial anterior.
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Portugal parte para este Europeu como campeão em título e já o ouvimos dizer, tal como há cinco anos, que só pretende regressar a Portugal no dia seguinte à final...
-Sim, já o disse, é o meu objetivo, não há que negar.
Considera que a Seleção tem agora maior favoritismo para alcançar esse objetivo?
-Isso é só semântica. O favorito, o candidato... É um peditório para o qual eu já não vou dar mais. Portugal é o campeão em título, portanto vai jogar com a firme convicção de conquistar o título. Mas isso já foi assim em 2016, também na partida para o Mundial da Rússia e não fomos campeões. Tínhamos essa ambição, mas não fomos capazes, não fomos suficientemente fortes para isso. Lutámos, mas não chegou. Fomos à Liga das Nações em 2019 para a vencer e conseguimos, já tivemos na Taça das Confederações e não a ganhámos... O objetivo desde que chegámos foi sempre chegar às fases finais e vencê-las. Talvez tenha verbalizado esse objetivo de uma forma diferente em 2016, mas é sempre esse. Tal como foi para os meus antecessores, sobretudo aqueles que estiveram à frente da Seleção desde 1996, jogaram sempre com esta ambição natural e achavam também convictamente que Portugal poderia vir a ganhar um desses títulos. Podem tê-lo verbalizado de forma diferente da minha, talvez mais internamente, não sei, mas não tenho dúvidas sobre isso. Portugal já tinha estado perto de uma vitória em 1966 e depois em 1984 e nos últimos 20 anos com alguma regularidade esteve mais perto de vir a alcançar um título. Eu disse-o da forma que disse quando cheguei à Seleção porque era uma minha convicção, perante aquele que era o quadro dos jogadores disponíveis. Também perante o que tinha sido a minha experiência na Grécia com a participação num Europeu e num Mundial. Isso faz alguma diferença. Ter estado envolvido nessas duas provas como treinador e selecionador deu para perceber como funciona, porque é diferente de um campeonato de clubes, aproxima-se mais de uma Liga dos Campeões, com uma fase de grupos e depois os jogos a eliminar. Essa aprendizagem que fiz com a Grécia, pensando no que consegui e no que podia ter feito de melhor, olhando também para a qualidade extra dos jogadores portugueses, sobretudo em termos ofensivos, deu-me a convicção de que juntando as duas coisas teria uma forte probabilidade de êxito. Por isso afirmei-o não só publicamente, mas também aos jogadores. Nunca lhes disse: nós vamos ser campeões da Europa. Disse-lhes que acreditava e que esse era o objetivo, mas primeiro tínhamos de lutar para lá chegar. Tínhamos vindo de um momento menos positivo e teríamos de vencer os sete jogos que nos faltavam. Depois jogaríamos, não para competir ou tentar fazer o melhor, porque o melhor seria ganhar o Europeu. A partir daí, esse espírito, que já era anterior a mim, consubstanciou-se. Portugal conseguiu ser campeão da Europeu e bem, como disse recentemente numa entrevista o Luiz Fernandez (ex-internacional francês). Perguntaram-lhe porquê tinha ganho a final Portugal e ele respondeu: "Porque foi melhor."
O técnico considera semântica falar em favoritismo. Do que não tem dúvidas é que o título em 2016 foi merecido e considera que essa foi a melhor equipa nacional porque... ganhou
Não tem dúvidas que quem ganha é sempre o melhor?
-Sim, isso para mim é evidente. Na história do futebol português este título vai ficar sempre marcado. No passado se calhar houve outras seleções que jogaram melhor. E não estou a falar em relação a 2016, porque Portugal jogou muito bem para se poder dizer que outros jogaram melhor. Mas durante muitos anos qual foi o grau de comparação? O do Mundial de 1966, depois o Europeu de 1984, etc. Mas a seleção que sempre foi lembrada foi a de 1966. Agora parece que já foi uma coisa muito no passado. Mas admito que haja quem pense que a Seleção de não sei quando, que jogou num outro campeonato do Mundo ou da Europa, era a melhor. A verdade é que não ganhou...
"OS QUE CHEGARAM NÃO SÃO MELHORES NEM PIORES"
Dos 23 campeões europeus houve alguns que já terminaram as carreiras e outros foram entretanto perdendo espaço na Seleção. Quem chegou está à altura de substituir os que partiram?
-Sim, mas não digo que são melhores nem são piores. Eu percebo a pergunta e faz sentido. Portugal tinha muitos bons jogadores em 2016, alguns que nem chegaram ao campeonato da Europa, ficaram pelo caminho por lesão e que foram importantes no processo que conduziu a Seleção até ao título, contribuindo para ganhar o grupo e estar presente na fase final. Lembro-me assim rapidamente de Tiago, Danny, Fábio Coentrão... Houve outros que acabaram por ter uma presença fortíssima no Europeu. E se calhar, se me tivesse feito esta pergunta em 2016, podíamos questionar as presenças do João Mário, Renato Sanches, André Gomes, o próprio William, embora ele já tivesse estado no Mundial anterior com o Paulo Bento. Há uma série de jogadores, o Éder também, que chegam ao campeonato da Europa de 2016 e podem ser comparados a outros que estão no grupo hoje. Jogadores que tinham três, quatro, cinco, seis internacionalizações. Hoje o leque é maior. Temos mais jogadores com menos jogos.
"Quando olhamos para o número de internacionalizações, temos uns dez jogadores que não chegam aos 20 jogos"
Parece-lhe então que falta alguma experiência no grupo que pensa convocar?
-O que estou a dizer é que isso torna um pouco mais difícil o trabalho numa equipa nacional. Nos clubes há tempo para treinar um ano inteiro. Aqui não. O que é que vai solidificando os conceitos, as ideias? Os jogos, porque não há treino. Aquilo que seria o trabalho normal de alavancagem da equipa, de crescimento no seu conjunto, de integração das individualidades para que estas possam interagir, nessa altura se calhar foi um bocadinho mais fácil. Não digo tanto na fase final, porque acabei por levar vários jogadores que estavam a iniciar esse processo. Mas também já havia ali muitos que jogavam juntos há muitos anos e tinham rotinas avançadas. Se nós pensarmos nos últimos tempos, temos muitos jogadores com zero ou uma participação em fase finais e temos outros com seis, sete, oito. Quando olhamos para o número de internacionalizações, temos uns dez jogadores que não chegam aos 20 jogos. E em muitos jogos estiveram em campo cinco, 20 minutos... Mas já temos alguns que vêm do campeonato do Mundo, o Bruno Fernandes, o Rúben Dias, que não chegou a jogar mas esteve lá na Rússia. Há alguns jogadores que já vêm de 2017, 2018, que já têm contacto de grupo, experiência de uma fase final, de trabalhar em estágio. O Bernardo Silva já vêm daí, o Gonçalo Guedes, o André Silva. Depois na Liga das Nações já começaram a aparecer outros, mantendo-se muitos destes que já vão numa fase de crescimento. Nesta fase final, começaram a vir outros e estão ainda numa fase de aprendizagem, mas tudo se há de resolver.