ENTREVISTA (parte 3) - João Félix, Neto e uma dificuldade que está na moda
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Sem lamentos: Fernando Santos explica, e volta a explicar, que o Portugal-Suíça correu ao contrário do esperado. A idade de Félix, a escolha mais focada, não conta. A pressão sim, mas essa é outra conversa.
"Se voltasse atrás fazia o mesmo. Num jogo planeado, em que o ataque organizado fosse bem conseguido, era quem podia articular-se melhor."
O síndroma Félix: como anestesiar
"O que procuro fazer é falar com os jogadores. Tento retirar-lhes o peso que lhe está a ser criado. O João tem 19 anos; o Gonçalo Guedes estreou-se comigo com 18. Tenho três ou quatro jogadores que começaram muito mais cedo do que o João. Tive um que nem percebia muito bem o que lhe diziam, que era o Raphael. Aliás, ainda hoje não percebe. De repente apareceu a jogar na equipa principal de Portugal."
Nunca subestimar a pressão
"Na Rússia, isso foi desastroso para nós, com a questão do Sporting, como sabem. A pressão condiciona o jogador, sim, principalmente nestas idades. Há mercado, milhões, clubes e clubes. Vão para o jogo pressionados pela obrigação de jogarem bem, por medo de perderem a carreira. Se achas que aquele elemento pode jogar e tens a certeza absoluta de que vai sofrer esse peso, procuras libertá-lo. Digo-lhes que a vida deles vai ser a que tiver de ser e que têm é de jogar normalmente. Faço com todos."
Félix, parte II: porquê ele com a Suíça
"Se voltasse atrás fazia o mesmo. Num jogo planeado, em que o ataque organizado fosse bem conseguido, era quem podia articular-se melhor. Se achasse que ia jogar mais vezes em ataque rápido, teria escolhido outro jogador. O que aconteceu é que o jogo acabou por ser mais de ataque rápido do que eu esperava. Em muitos casos, joguei com o Cristiano e o Guedes na frente. Com a Espanha, por exemplo, mas porque eles jogam com a defesa muito subida. Se vou jogar com uma equipa que fica muito atrás, escolho um jogador mais de área, porque o Cristiano vai sair muitas vezes daquele espaço e preciso de alguém para fazer aquela função. Para ataque rápido, tenho o Rafa, o Jota, que faz muito bem isso, e o Guedes."
"Ataque organizado frente à Suíça pedia João Félix"
No futuro perfeito da seleção portuguesa há uma ruga, que o selecionador prefere ver como uma conjuntura: a falta de defesas-centrais. Fernando Santos enumera alguns nomes, admite que acha "interessante" Pedro Mendes, explica a diferença entre defesa e avançado nestas matérias e menciona uma dificuldade que está na moda.
Do superavit de laterais-direitos à ameaça de extinção dos centrais
"A posição de defesa-central é uma daquelas que, neste momento, não germina tanto. Olho, por exemplo, para a lateral-direita. Quando estou aqui com os meus adjuntos a elaborar a convocatória, tenho sempre quatro ou cinco nomes para escolher, já não contando com o Dalot. Mas houve uma fase em que ele estava a jogar com regularidade no Manchester e contava. Qualquer um pode ver: os dois que vieram, o Ricardo Pereira, que fez uma época excelente, excelente; o Cédric, que é campeão da Europa, e ainda o Dalot. No meio-campo, vejo uma série de jogadores que não estão lá mas não perderam a qualidade, o João Mário, o André Gomes, o Gedson. Se, de repente, começarem todos a jogar, tenho onze ou doze nomes."
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Os nomes que existem, apesar de tudo
"Há dois ou três lugares em que tenho mais dificuldades. Os centrais, sim. Temos corrido mundo a ver jogadores, até mesmo nas segundas divisões de outros países. Se olharem um pouco para trás no tempo, já estiveram aqui o Ricardo Ferreira, o Ié, o Neto, o Pedro Mendes. O Neto, por exemplo, estava no Zenit e não jogava. Agora veio para o Sporting. Ele já faz parte daquele lote de 50, se começar a jogar amanhã, obviamente fica mais perto."
"Com um defesa, se as coisas não correrem bem, se tiver tremedeira, se estiver ansioso, a situação complica-se"
Defesa precisa de mais lastro
"Um defesa e um avançado são diferentes no que respeita ao momento certo para entrarem. Se as coisas não correrem tão bem a um avançado, não é muito grave. No máximo, pode não marcar golos. Com um defesa, se as coisas não correrem bem, se tiver tremedeira, se estiver ansioso, a situação complica-se para nós. Vamos esperar que alguns jogadores possam fazer a sua afirmação. Já uma vez me colocaram a questão do Ferro e eu respondi que não via como. Optei por colocar o Danilo como quarto defesa (eram só dois jogos), dispensar o Rúben não se colocava, como não se colocava dispensar dois jogadores que fizeram grandes campeonatos, como o Fonte, que esteve brilhante no Lille, e o Pepe, que é um pilar, em termos de apoio dos outros. Mas se o Ferro se afirmar, porque não? E estou a falar num Ferro como posso falar de um Diogo Leite. Nem gosto de falar em nomes."
Um incómodo chamado defesa a três
"Um jovem começa a afirmar-se numa equipa, tem um ano, dois, a jogar competições europeias, e eu começo a ver que sim, então vem. Por isso, o Rúben [Dias] não chegou logo. Chegou quando eu percebi que estava a ficar mais maduro, que já me dava alguma calma. A afirmação não tem corrido tão bem aos nossos jogadores. O Paulo Oliveira até é o mais utilizado, no Eibar. O Tobias Figueiredo praticamente não joga; o Ié, quando joga, é no lado direito com três centrais; o Pedro Mendes, que eu até acho um jogador interessante, também joga num esquema de três centrais."