Discussão entre o vice-presidente Ed Woodward e o antigo manager reabre a crítica: a proximidade do ex-treinador é mau presságio
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A 12 de julho de 1974, o mundo do futebol abanou. Bill Shankly chocou Liverpool, Inglaterra e o mundo ao anunciar que deixava o cargo de treinador dos Reds, o emblema que ele levara da valeta à realeza em 15 temporadas. O escocês não tardou a arrepender-se da decisão.
Ferguson assumiu o comando técnico do Man. United em 1986 e só o deixou quase 27 anos depois. Ganhou nada menos do que 38 títulos
Surgia amiúde no centro de treinos de Melwood, para supremo incómodo do seu sucessor e ex-braço-direito, Bob Paisley. Shankly não conseguia a rutura completa, andava sempre pelos arredores da arena de Anfield que ele tornara temida, da tribuna presidencial, das viagens com a equipa, até que todos concordaram que o afastamento completo era o melhor.
Resultado: o Liverpool tornar-se-ia maior ainda, partindo para o seu mais glorioso período interno e europeu. Shankly era e é um eterno herói, mas o seu fantasma teve de ser exorcizado.
24 de novembro de 2019. Alex Ferguson, histórico ex-manager do Manchester United, parece discutir nas bancadas de modo inflamado com Ed Woodward, vice-presidente dos Red Devils, durante o 3-3 da turma de Solskjaer em casa do Sheffield United. Respeitadora da história do jogo, do seu jogo, há uma corrente em Inglaterra que defende a corrente, dir-se-ia, espírita: a sombra de Ferguson é demasiado vasta... e é culpada pelo desacerto no comando desde que o escocês deixou o cargo e passou a conselheiro ocasional, reserva moral ou guardião das melhores histórias.
A sua presença assídua nas bancadas, as suas opiniões tão brutais quanto frontais, o estilo "ruthless" que tinha no banco e o regresso às bancadas mesmo depois de um grave problema de saúde são, para muitos, o reflexo de uma incapacidade de se afastar... e de deixar a sucessão respirar.
A falta de divórcio com Sir Alex é vista como um dos males do Manchester United, que já sofreu de forma semelhante no passado, após um período áureo e pioneiro.
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O fim e o fim de Busby
Chegamos ao terceiro escocês ilustre desta história: Sir Matt Busby. Ele não fez um: fez dois grandes Uniteds. E não teve um só fim no banco: também teve dois. Dos Busby Babes às cinzas destes após o acidente de Munique, o manager que inspirou, apaixonou e conquistou o planeta do futebol também não vivia sem o clube que só voltou a viver bem sem ele.
Em 1969, Busby retirou-se do banco e recuou para a secretária. Passou a diretor. A influência da qual não prescindiu - e que ninguém se atrevia a questionar - levou-o a apontar (mal) o seu sucessor, Wilf McGuinness, algo que se repetiria muito depois, quando Ferguson indicou David Moyes.
Após o fracasso de McGuinness à frente de uma equipa decadente, na qual Bobby Charlton era levado pela idade e George Best pelo álcool, o United entrou em espiral. Matt Busby ainda tentou apanhar os cacos num fugaz regresso ao banco, mas o clube caiu para a ignomínia do segundo escalão em 1974. Os red devils só voltariam aos anos dourados na década de 1990, já com um Busby decorativo, não executivo. O deserto deveu-se, para muitos, à falta de desapego mútuo, por fria que fosse a separação.
Finais de reinados longos no banco de grandes ingleses abriram sempre caminho à tensão, ao desconforto e mesmo à decadência
Ferguson não se liberta do United nem o United dele, e é o segundo que sai a perder. Depois da hemorragia cerebral que quase o matou, a primeira reaparição pública do antigo manager incluiu um desejo de boa sorte ao Manchester United. O retorno a Old Trafford teve o seu lado comovente, mas é hoje visto de viés, como o peso inquisidor e vigilante de 26 épocas e meia de glórias e aventuras que rapidamente tornaram fátuos os relativos êxitos seguintes: David Moyes venceu a Supertaça em 2013/14; Louis van Gaal a Taça de Inglaterra; e José Mourinho arrecadou uma Liga Europa, uma Taça da Liga e uma Supertaça.
A crítica britânica trouxe a lume outros exemplos, o mais recente dos quais o de Arsène Wenger. Depois de afastado, o francês tomou a decisão consciente de se afastar de tudo o que tivesse a ver com o Arsenal por duas razões: a mágoa por ver interrompido o seu trabalho e o não querer pressionar o seu sucessor.
Provocado ou natural, sempre que o fim de uma dinastia no banco mantém vestígios nas proximidades do banco, os gigantes ingleses cedem.
São 11 os meses de Solskjaer no comando do United, após suceder a Mourinho. A aventura atingiu o ponto mais crítico em outubro, quando o "Daily Express" noticiou que o norueguês tenta imitar Ferguson no balneário. Uma dessas "imitações", após um 1-1 ante o Arsenal, não caiu bem no plantel...