A par da reconhecida qualidade que mais distingue o carimbo português em jogadores e treinadores, os últimos anos têm revelado no exterior a valia dos homens que constroem plantéis. O impacto de gestores e diretores-desportivos no mercado tem feito furor.
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Alcançar uma carreira internacional e conseguir títulos europeus têm sido objetivos comuns à classe dos treinadores e dos jogadores de futebol. Mas uma outra tendência chegou em definitivo a Portugal e já não é de agora.
A história de sucesso dos dirigentes que constroem plantéis, realizam avultadas mais-valias financeiras e conquistam títulos acentuou-se com a entrada neste século e já roça os ombros com as obras e currículos de muitas outras figuras internacionais que deixaram marca na cena internacional (ver gráficos em anexo).
E depois do sucesso interno, Portugal passou a exportar estes ativos cada vez mais transferíveis no mercado.
A figura de titular do mercado tem ganho importância ao longo dos anos. Os responsáveis por contratações eram muitas vezes homens da casa, figuras do clube e leais ao mesmo, mas os tempos mudaram. Hoje, este cargo configura uma carreira em si mesma. Sejam team managers, diretores desportivos, gestores de ativos ou administradores com a pasta de mercado, os homens fortes do futebol passaram a ter participação clara nos negócios e ganharam relevo com as transformações dos clubes em sociedades anónimas desportivas. Hoje, um diretor não se cinge ao clube onde foi jogador e cada vez mais as capacidades de gestão, liderança e proximidade com empresários pesa nas escolhas dos presidentes.
Portugal tem um dos melhores jogadores da história da modalidade (Cristiano Ronaldo); um plantel recheado de talentos na Seleção, estando a maioria radicada no estrangeiro; treinadores nos principais campeonatos - José Mourinho e Nuno Espírito Santo em Inglaterra, Villas-Boas em França, Paulo Fonseca em Itália - e Jorge Mendes, reconhecido pelos pares como o grande empresário da modalidade. O caso mais recente - a saída de Tiago Pinto do Benfica (recebido por jornalistas à chegada a Itália) para a Roma -, reforça a tendência que Luís Campos (Mónaco e Lille), Antero Henrique (PSG) e Mário Branco (Astra, Hajduk Split e PAOK) assumiram: Portugal ganha peso internacional na projeção dos seus dirigentes.
Em Portugal, na viragem do século, Carlos Freitas valorizou-se ao dotar o Sporting de armas para ganhar dois campeonatos - os seus últimos, de resto. Luís Gonçalves, no FC Porto, é a figura que sucedeu ao triunfante Antero Henrique, também com sucesso a nível desportivo e experiência no exterior. A figura do diretor desportivo conquistou um relevo nunca visto. No entanto, e ao contrário de Itália, onde o cargo é altamente profissionalizado há décadas, só recentemente passou a haver aposta na formação nesta área. Já existem universidades privadas a incidir em especializações para diretor desportivo e a FPF avançou em outubro com o segundo curso de formação, ciente do quanto ter altos nomes no dirigismo engrandecem a posição do país na Europa. Desde negociação de jogadores, gestão financeira, até à prospeção nos módulos do curso da FPF, os diretores desportivos têm subido, em muitos casos, a CEO dos clubes. Hoje, a escolha de um treinador depende do diretor desportivo.
Daí que André Villas-Boas tenha dito em entrevista a O JOGO que os team-managers estão muitas vezes fragilizados quando os resultados falham, porque também é deles a escolha do técnico de acordo com o modelo de jogo e política desportiva que querem implementar.
Itália, a Vecchia escola
Em Itália, não raras vezes se confundiu o cargo de team manager com o de CEO. Ariedo Braida fez com Galliani a parceria rumo a cinco títulos europeus; recentemente, Igli Tare reformulou a Lázio e está no clube há 13 anos e Andrea Berta, que depois de Parma e Génova, foi para o Atlético Madrid celebrar um título de campeão que fugia há muito, cativando inúmeros jogadores para aquela ponta da capital, como foi o caso de João Félix. Fabio Paratici renovou a Juventus, adquiriu Cristiano Ronaldo e outras superstrelas para conseguir nove ligas italianas desde a chegada. Antes de ser diretor desportivo, destacou-se como olheiro e assim descobriu meninos da cantera da Juve e apostou, por exemplo, em Pogba, que era do Man. United, para onde voltaria depois. Essa tendência é cada vez mais seguida e Javier Ribalta, ex-scout no Milan, Juventus e Manchester United rumou ao Zenit para se assumir como diretor, tal como Monchi imperou 17 anos no Sevilha, emblema ao qual regressou após passar pela Roma.
Portugueses mestres do negócio
Os portugueses têm-se destacado pela atenção à valorização de ativos e à proximidade com empresários. Antero Henrique conseguiu ajudar o FC Porto a encaixar 704 M€ desde 2005 a 2017 e ao PSG, mesmo comprando muito, também fez entrar 202 M€. Carlos Freitas, na Fiorentina, fez 166 M€, Mário Branco, que foi figura ímpar para devolver a alegria ao PAOK em 2019, cujo campeonato não vencia desde 1985, fez em vendas mais de 53 M€ aos clubes por onde passou e Tiago Pinto, no Benfica, ajudou a conseguir 527 M€ em saídas em três épocas e meia. Luís Campos, em França, cumpre a valorização que muitos clubes anseiam: foram 623 M€ entre Lille e Mónaco.
Ilustres no exterior
Damiel Comolli
Idade: 48 Origem: Itália
Clube atual: Presidente do Toulouse desde 2020
Clubes por onde passou: St. Étienne 2004- 05/2008-10/Tottenham 2005-2008/ Liverpool 2010-2012/Fenerbahçe 2018-2020
Títulos: 2 Taças da Liga Inglesa, 2 Taças da Turquia
Frank Arnesen
Idade: 64 Origem: Dinamarca
Clube atual: Feyenoord desde 2019
Clubes por onde passou: PSV 1994-2004/ Tottenham 2004-2005/Chelsea 2005-2010/ Hamburgo 2011-13/ Metalist Kharkiv 2014/ PAOK 2015-16/Anderlecht 2019
Títulos: 4 campeonatos holandeses, 6 Supertaças da Holanda, 1 Supertaça holandesa campeonatos ingleses, 2 Taças da Liga 1 Community Shield
Olivier Létang
Idade: 48 Origem: França
Clube atual: Presidente do Lille desde 2020
Clubes por onde passou: Reims 1997-12/PSG 2012-17
Títulos: 4 campeonatos franceses, 3 Taças de França, 4 Taças da Liga francesas, 4 Supertaças francesas ,2 divisões secundárias
Ariedo Braida
Idade: 74 Origem: Itália
Clube atual: CEO do Cremonese desde 2020
Clubes por onde passou: Monza 1981-84/Udinese 1985-86/ Milan 1986-2002 (CEO), 2002-13 Diretor desportivo/Sampdória 2014/ Barcelona 2015
Títulos: 8 Ligas italianas
1 Taça de Itália, 7 Supertaças italianas
5 Ligas dos Campeões, 5 Supertaças europeias, 2 Taças Intercontinentais, 1 Mundial de Clubes
Javier Ribalta
Idade: 40 Origem: Espanha
Clube atual: Zenit desde 2018
Clubes por onde passou: Scout - Torino 2008-2009/ Milan 2009-2011/ Novara 2011-2012/ Juventus 2012-2017/ Man. United 2017-18/
Títulos: 2 Campeonatos russos 1 Supertaça russa
Rodrigo Caetano
Idade: 50 Origem: Brasil
Clube atual: Internacional desde 2018
Clubes por onde passou: CEO - 2004-2009 Grémio/Vasco da Gama 2009-2011/Fluminense 2012-2013/Vasco da Gama 2014/Flamengo 2014-2018
Títulos: 1 Campeonato brasileiro, 2 Taça Guanabara, 2 Campeonatos Cariocas, 3 divisões secundárias
Michael Emenalo
Idade: 55 Origem: Nigéria
Clube atual: Sem clube
Clubes por onde passou: Adjunto Chelsea 2007-2010/ Diretor Chelsea 2010-2017/Mónaco 2017-19
Títulos: 10 - Liga dos Campeões, Liga Europa Taça da Liga, 3 Premier League, 4 Taças de Inglaterra
Fabio Paratici
Idade: 48 Origem: Itália
Clube atual: Juventus desde 2010
Clubes por onde passou: Scout Sampdória 2004-10
Títulos: 9 Campeonatos italianos, 4 Taças, 4 Supertaças
Andrea Berta
Idade: 49 Origem: Itália
Clube atual: Atlético de Madrid desde 2013
Clubes por onde passou: Carpendolo 2002-06/ Parma 2007-09/ Génova 09-12
Títulos: 1 campeonato espanhol, 1 taça espanhola 1 Liga Europa, 1 Supertaça Europeia
Igli Tare
Idade: 47 Origem: Albânia
Clube atual: Lázio desde 2008
Títulos: 3 Taças italianas, 3 Supertaças italianas
Aitor Begiristain
Idade: 56 Origem: Espanha
Clube atual: Manchester City desde 2012
Clubes por onde passou: Barcelona 2003-10/
Títulos: 3 Ligas dos Campeões, 1 Supertaça Europeia, 1 Mundial de Clubes, 4 campeonatos espanhóis, 1 Copa do Rei, 3 Supertaças espanholas; 3 Ligas inglesas, 3 Supertaças inglesas, 4 Taças da Liga, 1 Taça de Inglaterra
Raúl Sanllehí
Idade: 51 Origem: Espanha
Clube atual: Sem clube
Clubes por onde passou: Barcelona 2008-18, Arsenal 2018-20
Títulos: 3 Ligas dos Campeões, 3 Mundiais de Clubes, 3 Supertaças Europeias, 7 campeonatos espanhóis, 6 Taças do Rei, 6 Supertaças espanholas
Monchi
Idade: 52 Origem: Espanha
Clube atual: Sevilha desde 2019
Clubes por onde passou: Sevilha 2000-17/Roma 2017-19
Títulos: 6 Taças UEFA/Liga Europa, 2 Copas do Rei, 1 Supertaça espanhola, 1 Supertaça Europeia
Michael Zorc
Idade: 58 Clube atual: Alemanha
Clubes por onde passou: Dortmund desde 1998
Títulos: 3 campeonatos alemães, 2 Taças da Alemanha, 2 Supertaças da Alemanha
Ralf Rangnick
Idade: 62 Origem: Alemanha
Clube atual: Sem clube
Clubes por onde passou: Treinador de dez equipas até ser diretor desportivo no RB Salzburgo 2012-15 e RB Leipzig 2012-19
Títulos: 1 Taça da Alemanha, 1 Taça da Liga alemã, 1 II liga alemã, 2 campeonatos austríacos, 2 Taças austríacas