Sérgio Conceição e o caso de Nakajima: "Colegas fizeram força para que ele voltasse"
ENTREVISTA (Parte 2) - Disciplina: uma palavra comum às três épocas de Conceição no FC Porto. A outra é risco, no sentido de pôr em causa resultados para fazer cumprir a disciplina. A nova temporada não será mais meiga.
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O caso Nakajima é o mais recente na folha de castigos do FC Porto de Sérgio Conceição. Renitente em juntar-se aos treinos na pandemia, o japonês acabou por falhar as dez jornadas finais e por só se juntar à pré-época por insistência dos colegas.
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Na época passada, abdicou do Éder Militão por questões disciplinares em jogos-chave, este ano fez o mesmo com Uribe, Díaz e Marchesín e teve os episódios com Nakajima. Admitiria perder um campeonato para manter a coerência na disciplina?
Ganhar o campeonato tem a ver com essa disciplina e não abdicar dos princípios que temos aqui em função da importância dos jogadores para ganhar um campeonato. A pergunta é inteligente, mas digo que é com disciplina que se ganha.
"Ninguém faz uma festa e publicita nas redes sociais querendo prejudicar-se. Foi mais inocente do que maldoso"
O jogo do Bessa, em que abdicou dos três sul-americanos, até que ponto foi importante na época?
-A partir do momento em que tomei a decisão, não sabia o que ia acontecer no Bessa. Podia perder o jogo. Por isso, falo nessa disciplina e rigor e naquilo que já repeti várias vezes: não basta ter contrato com o FC Porto, é preciso sentir. Acredito que o incidente com esses jogadores foi mais pela falta de conhecimento de uma realidade completamente diferente, do campeonato, da forma como se vivem aqui as coisas, do que por maldade ou por gostar da noite. Ninguém faz uma festa e publicita nas redes sociais querendo prejudicar-se. Foi mais inocente do que maldoso e, por isso, depois de perceber as circunstâncias e sabendo que se trata de gente muito comprometida, o caso ficou completamente decidido.
O caso Nakajima enquadra-se nessa falta de sentimento?
-Sem dúvida nenhuma.
Como profissional de futebol a autoexclusão foi estranha. Os colegas e a equipa técnica sentiram que ele ficou em falta?
-Daí a nossa azia, de todos. Um dos princípios básicos de qualquer clube é haver esse compromisso. O Nakajima vem de uma cultura totalmente diferente. Houve um problema depois de ele sair daqui e, a partir desse momento, já não posso fazer nada porque deixa de fazer parte do meu trabalho. Foi uma situação que a SAD teve de resolver com o jogador. Depois disso, achei que foi muito mau para o grupo de trabalho e ele teve de resolver com o grupo. A seguir, entrei eu para decidir o que fazer. Ele sentiu que não esteve bem. Foi um momento difícil para todo o mundo e continua a ser, porque isto ainda não acabou.
Mas os colegas treinaram no Olival e jogaram e ele ficou em casa...
-Por isso é que não foi fácil para ele. Sofreu um bocado porque, no momento em que se sentia psicologicamente apto, teve de sofrer a consequência do seu gesto. Isso é normal. E só está aqui porque temos um grupo de trabalho fantástico. Os colegas fizeram muita força para que o Nakajima voltasse.
"Se estiver numa tarde com os amigos, Nakajima, se calhar, é o jogador mais brilhante"
E agora está no mesmo patamar dos outros?
-A partir do momento que entra aqui e treina está no mesmo patamar, mas tem é de treinar como os outros, se não, deixa de estar no mesmo patamar. O Nakajima tem uma forma de estar que as pessoas não conhecem. Vêm o Nakajima tecnicamente apetecível, mas o futebol não é só isso. É preciso esse compromisso, o trabalho dentro do campo. O Nakajima não tem de fazer o mesmo que o Pepe ou o Mbemba. Se ele fizer o seu trabalho, dentro da equipa, emprestando a sua qualidade técnica, muito bem. Se não o faz, desce de patamar em relação aos que jogam habitualmente, que são os que me dão mais garantias. Se gosto de ver o Nakajima? Se estiver numa tarde com os amigos, se calhar é o jogador mais brilhante, não tenho dúvidas. É pequenino, é engraçado, vira-se bem, gira... Hoje em dia, toda a gente fala de futebol e acha que percebe de futebol, mas o problema é o que dizem e passam para as pessoas. É inacreditável, e acontece cada vez mais. Há muito pouca qualidade nos nossos comentadores.
Mesmo nos que foram jogadores?
-Mesmo. Conheço muitos ex-jogadores e que têm dificuldade em ver o jogo. Veem à sua maneira, têm a sua ideia, mas há coisas ditas que são absurdas e cada vez menos qualidade em quem comenta futebol, não aquilo que gravita à volta do futebol. Aí já são ases, fantásticos.
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