"Os clubes fecharam a informação e nunca houve tanto escândalo nos jornais, rádio ou televisões"
O CNID, associação que reúne jornalistas de desporto em Portugal, faz um apelo à melhoria do relacionamento com os clubes de futebol. "Vale a pena isolar tanto os atletas e os treinadores dos Jornalistas, ou isso será apenas uma forma de tentar esconder fragilidades?"
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Aproveitando a tradição de assinalar o início de uma nova época desportiva, com a disputa este sábado da Supertaça, o CNID - Associação de Jornalistas de Desporto - fez um ponto de situação do relacionamento entre comunicação social e clubes de futebol. E deixou ainda alguns apelos, não deixando de mostrar estranheza pelas continuidades práticas da grande maioria dos clubes em Portugal.
"Chegámos a um ponto em que os clubes fecharam tanto quanto puderam a informação e nunca houve tanto escândalo nas páginas dos jornais ou nas ondas da rádio ou das televisões", pode ler-se na carta enviada aos sócios do CNID.
"É difícil encontrar outro país em que seja mais difícil ter um atleta ou treinador num estúdio de tv ou rádio ou num encontro cara a cara com um jornalista. Vale a pena? Com medo de quê?", pode ler-se no texto assinado pelo presidente da associação, Manuel Queiroz.
"Este afastamento é responsável por uma parte das grandes dificuldades por que passam o Jornalismo e os Jornalistas, inegavelmente. Alguns gostariam que a informação fosse dada apenas pelos canais dos próprios clubes. Seria um mundo cor-de-rosa em que as derrotas seriam sempre por causa dos árbitros. Mas o mundo não é assim", refere-se na carta.
TEXTO NA ÍNTEGRA
"Cumprindo uma tradição dos últimos anos, o CNID - Associação dos Jornalistas de Desporto assinala simbolicamente o início de uma nova época desportiva quando começa a temporada do futebol profissional. Em 2022-23 é neste sábado, com a disputa da Supertaça Cândido de Oliveira, troféu que justamente presta homenagem a um nome grande do Jornalismo e, sobretudo, a um nome grande do desporto e do futebol.
Os Jornalistas gostariam que a época decorresse sob o signo do respeito e da lealdade nas diversas competições. Há quem peça paz, mas no desporto, felizmente, não existe a paz dos cemitérios. O desporto competitivo também é debate, também é diferença de pontos de vista, também é aceitar tradições diferentes, até porque felizmente acolhemos com prazer tantos estrangeiros que vêm melhorar as performances das equipas, seja como atletas ou treinadores. O Portugal desportivo é, sublinhe-se, um sítio onde a inclusão se faz naturalmente. Com problemas, às vezes, com erros, tantas vezes, mas onde cada um consegue exprimir a sua diversidade no campo.
Os Jornalistas fazem também um apelo aos atletas, aos treinadores e sobretudo aos dirigentes, para compreenderem o seu trabalho. Que é cada vez mais dificultado em nome de um controlo espúrio da informação. Chegámos a um ponto em que os clubes fecharam tanto quanto puderam a informação e nunca houve tanto escândalo nas páginas dos jornais ou nas ondas da rádio ou das televisões. Vale a pena isolar tanto os atletas e os treinadores dos Jornalistas, ou isso será apenas uma forma de tentar esconder fragilidades? Portugal é hoje talvez o pior país, do mundo livre, no controlo do pensamento e da palavra de atletas e treinadores. É difícil encontrar outro país em que seja mais difícil ter um atleta ou treinador num estúdio de tv ou rádio ou num encontro cara a cara com um jornalista. Vale a pena? Com medo de quê?
Esse mal, de resto, alastrou a todos os outros setores. Os árbitros, por exemplo, submetidos em geral a um silêncio ensurdecedor, como se fossem miúdos de escola primária incapazes de serem responsáveis pelos seus atos. Não é normal que as pessoas não se possam exprimir livremente num país livre. Depois, segundo alguns, todos os problemas nascem em tóxicos programas de televisão, em tóxicos sons das rádios ou em tóxicas colunas dos jornais. Como é óbvio, não nascem.
E alguns acharão que isto só se aplica aos grandes clubes. Também não é verdade, infelizmente.
Este afastamento é responsável por uma parte das grandes dificuldades por que passam o Jornalismo e os Jornalistas, inegavelmente. Alguns gostariam que a informação fosse dada apenas pelos canais dos próprios clubes. Seria um mundo cor-de-rosa em que as derrotas seriam sempre por causa dos árbitros. Mas o mundo não é assim.
O nosso apelo é que seja possível uma coexistência pacífica, em que todos tenham o seu espaço.
Valorizar o Jornalismo, desportivo no caso, passa por valorizar o encontro entre as partes que fazem o desporto. O Jornalismo não quer a polémica estéril e degradante, mas não se furta ao confronto de ideias, valoriza o ponto de vista novo com sentido, sublinha e exalta as personalidades que se vão afirmando. É um caminho de pedras, mas é o único que garante que o Jornalismo ajuda o desporto.
A todos o CNID deseja uma boa época.
P"la direção
Manuel Queiroz"
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