De saída do FC Porto, o ex-coordenador e técnico perspetiva a subida de mais atletas da formação à equipa A no futuro próximo.
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É com a sensação de dever cumprido que José Tavares se despede do FC Porto ao fim de 14 anos passados entre o banco (equipa principal, bês, Sub-19 e Sub-15) e o gabinete (coordenador da formação).
Nesta entrevista a O JOGO, o treinador de 41 anos aponta as razões da saída, faz um balanço deste período, aborda os principais talentos criados no clube, perspetiva o futuro da formação e descreve os planos de carreira.
Sai do FC Porto ao fim de 14 anos. Que legado deixa?
-Saio de consciência tranquila, porque cumpri a missão na equipa A, na B, na formação e nas várias funções que fui desempenhando no clube, porque, no final do dia, participei de forma ativa e decisiva em muitos títulos - e o clube vive de títulos - , no desenvolvimento de muitos jogadores - e o clube vive dos jogadores - e muitos deles deram bastantes milhões [de euros] ao clube, que também é muito importante para a sua saúde financeira.
Foi convidado para ser coordenador. Que motivos o levaram a recusar?
-É verdade que fui convidado para ser o coordenador técnico da formação, é verdade que conversámos imenso sobre esta possibilidade para os próximos anos, mas também é verdade que se há seis anos, quando era treinador da equipa B, conversei com o clube sobre o que era melhor e escolhi dar um passo ao lado na minha carreira enquanto treinador para voltarmos a ter uma formação forte, ativa, equilibrada e com talento - algo que conseguimos -, neste momento acredito que a missão já estava cumprida. Ficando muito honrado com o convite que me foi feito e olhando de forma bem séria e profunda para ele, acredito que também é bom para o clube dar espaço a novas pessoas e continuar a sonhar na minha carreira de treinador. Desde o primeiro segundo que o presidente e todas as pessoas responsáveis souberam que queria ser, sou e sempre me assumi como treinador, apesar de ter desempenhado várias funções.
"Conceição e a equipa técnica fizeram um trabalho fantástico [com os jogadores da formação]"
O presidente e os outros dirigentes entenderam esses argumentos?
-Quando alguém decide sair, não serão os argumentos o mais importante. Será sempre como é que o clube fica. E o clube fica bem, com pessoas responsáveis, uma competência técnica ótima, uma liderança extraordinária, na pessoa do presidente [Pinto da Costa], dos administradores Vítor Baía e do engenheiro Luís Gonçalves. Na formação, com o Fernando Gomes, grande figura do clube, que está a desempenhar um papel extraordinário, e com o novo coordenador técnico [Filipe Ribeiro], uma pessoa que conheço bem. O FC Porto vai ter tudo o que precisa para continuar a ter sucessos.
Quais foram as maiores dificuldades que encontrou como coordenador?
-O FC Porto tem as suas características em termos de cultura e de instalações. São evidentes as dificuldades que existem, mas como a cultura é não nos agarrarmos às desculpas e encontrarmos soluções com o que temos, nunca foi isso que nos impediu de desenvolver talentos e colocar jogadores na equipa A. O Conceição e a equipa técnica fizeram um trabalho fantástico ao longo destes anos, assim como o Folha e a equipa técnica dele na continuidade do que vem sendo feito nos escalões inferiores. Mas essas dificuldades vão sendo cada vez maiores, "à la longue", se o investimento que os outros fazem não for acompanhado internamente. Não é uma questão de talento, porque o FC Porto continuará a criar talento e a desenvolvê-lo como sempre, mas pode começar a não ter um volume tão grande como nos últimos anos. Mas os sócios podem ficar tranquilos, porque existe muito talento na formação. Já a partir dos próximos anos, o clube continuará a alimentar as equipas profissionais, porque tem profissionais de excelência, muito competentes. O FC Porto haverá de ser sempre um dos clubes excecionais na formação e na equipa principal no desenvolvimento de talento.
O investimento é só pessoal e financeiro ou também em instalações? O FC Porto é o único dos grandes que ainda não tem uma academia...
-Em primeiro lugar, em capital humano, porque são as pessoas que fazem a diferença sempre. Não são as máquinas, as paredes ou os campos. Por outro lado, também sabemos que para se crescer são necessárias infraestruturas. Se tivermos mais espaços de treinos, áreas adjacentes como ginásios, departamentos médicos, dormitórios e escolas, conseguimos ter um volume melhor. O FC Porto sempre investiu na formação e vai continuar a investir. O que mudou é que os adversários diretos também inovaram, aumentaram as suas infraestruturas e isso, no dia a dia, tem uma implicação direta no recrutamento.
Em que medida?
-No FC Porto só está quem quer estar. Sempre foi e sempre será assim. Os pais e os jogadores têm mesmo de escolher o FC Porto. Porque se, na dúvida, preferirem uma beleza diferente nas instalações, mais "x" euros no final do mês ou a ilusão de no meio de tantos outros conseguirem, provavelmente as coisas não correm bem. No FC Porto, as coisas são sempre tratadas com realidade, honestidade e com o caminho a ser trabalhado todos os dias. Por isso é que não se fala em nomes de forma individual; todos têm de acreditar que conseguem. Quem chega tem de perceber que o que diferencia o FC Porto é a sua cultura e a sua forma de fazer as coisas. E os resultados estão à vista.