Ainda a festa em Rebordosa: "Jogo serviu para conquistar adeptos para outras lutas"
Luís Gonçalves, um dos melhores jogadores do Rebordosa, avaliou o impacto do jogo com o Braga e uma casa cheia com 6000 rebordosenses nas bancadas e o eco em Espanha com o Real Madrid atento.
Corpo do artigo
O Rebordosa ficou pelo caminho na Taça de Portugal mas ninguém ficou indiferente à manifestação de apoio que o clube recebeu no seu Complexo no Monte Azevido, batendo-se com galhardia e brilhantismo diante do Braga. A derrota foi só mesmo no resultado, tudo o resto congregou o que de melhor o futebol ainda gera, um jogo ser fenómeno transcendente para um local e alimentar a paixão dos habitantes, neste caso desta freguesia muito relevante do concelho de Paredes.
Imunes à copiosa chuva, foram cerca de 5500 a 6000 os adeptos que entoaram gritos de incentivo ao Rebordosa, equipa do Campeonato de Portugal em trajeto muito ascendente nos últimos anos e, particularmente, forte nos seus domínios, gozando de um estádio exemplar e ajustado à realidade, desde a chegada de Arlindo Gomes ao leme. Indicadores que têm conquistado os seus simpatizantes e que tiveram reflexo estrondoso diante do Braga, numa lição de apoio, mas também de bem receber. O desaire por dois golos foi pesado em razão da luta dada e das circunstâncias madrastas para a equipa, ao sofrer um golo no primeiro remate do opositor, e castigo maior surgir com a inferioridade numérica no início da segunda parte.
A euforia das bancadas transpôs-se para o campo, o instinto de superação prevaleceu em todos os momentos, não havendo abalos que entorpecessem a mentalidade e valentia. Luís Gonçalves, médio de 31 anos, que foi peça nuclear na escalada do clube às lides nacionais, falou com O JOGO no pós-Braga, digeridas as emoções de bela propaganda para muitas carreiras, e aproveitando um ligeiro intervalo nos seus horários como trabalhador num bar de praia, em Matosinhos.
"A cidade abraçou a ideia de criar uma noite de festa na prova rainha, o clube proporcionou todas as condições para que isso acontecesse. Juntos, o clube e cidade demonstraram grande vaidade em receber um histórico em sua casa e mostrar que tem os valores de saber receber e um estádio que envaidece e honra a cidade. Os adeptos disseram presente e, também com ajuda da massa adepta bracarense, fizeram autênticos postais para a posteridade", relatou o médio, vendo a partilha de fotos que proliferou de bancadas completamente lotadas.
"Todos os jogadores gostam de jogar nestes ambientes, acabou por nos empurrar e levar à superação! Nós apresentamos os valores de solidariedade e competitividade habituais e deixamos a nossa imagem intacta. Espero que este jogo tenha servido para conquistar ainda mais adeptos para as restantes lutas que temos", destacou Luís Gonçalves, feito no Infesta, habituado a ver de menino o talento de Bruno Fernandes bem perto, aprimorava este remates em horas extras. Craque do Manchester United à parte, o jogo fez o nome Rebordosa ecoar com força na imprensa espanhola, até porque o Real Madrid está de visita a Braga e, necessariamente, teve olheiros atentos ao jogo.
"Trouxe mais mediatismo ao jogo e fez com que o nome de Rebordosa chegasse mais longe, isso é bom para o clube e para a cidade. Desportivamente será curioso verificar, com poucos dias de diferença, dois contextos completamente diferentes", sublinhou o médio, torcendo por uma graça do Braga. O médio do Rebordosa aprova também a qualidade de recursos existente. "Temos uma direção estável e umas infraestruturas e condições físicas e humanas que nos possibilitam crescer e fazer um bom trabalho", evidenciou, sublimando o papel de Arlindo Gomes.
Caráter forte é inegociável
"O facto de existir um projeto de continuidade tem sido importante , estamos sob a batuta do mister Arlindo Gomes pelo quarto ano e ,sem dúvida, que é importante para todo o assimilar de processos e de conhecimento mútuo. Mas este é um grupo de caráter muito forte, isso é que é inegociável para nós", observou Luís Gonçalves, medindo a importância deste embate no que são os lucros pessoais.
"Foi um jogo marcante emocionalmente, por podermos proporcionar ao clube, às nossas famílias e às pessoas de quem gostamos e nos acompanham, um dia especial para eles também. Pessoalmente, quis desfrutar ao máximo, sempre com a máxima responsabilidade e "beber" tudo o que conseguisse desta oportunidade de partilhar o campo com campeões europeus e internacionais. O que mais me marcou, sem me surpreender, foi perceber a humildade e simplicidade humana e futebolística que a maioria apresentou!
Acho que é isso que nos apaixona tanto!", reconheceu o médio, que levou de recordação a camisola do 10 do Braga.
"Não tentei falar com ninguém do Braga, mesmo tendo admiração por vários jogadores, estava focado no que era o jogo e a minha competência, mas, no final, não resisti em pedir ao André Horta para trocar de camisola", admitiu.
"Foi o jogo da minha vida pois vi lá os meus pais!"
Curiosamente, aquele que é considerado por muitos um dos adeptos mais apaixonados pelo Rebordosa, não pôde assistir in loco ao encontro, já que se encontra emigrado na Suíça. Confinou-se ao sofá da sua casa em Zurique. Falamos com Bruno Sousa, reconhecido como figura próxima de todos os plantéis, nunca diminuído na sua ação pela distância. Só mesmo impossibilitado de uma viagem relâmpago à cidade. Absorveu tudo pelas redes sociais, deu difusão às imagens que provavam uma noite de gabarito e fervor coletivo.
"A adesão a este jogo foi uma coisa do outro mundo. Digo isto com um orgulho enorme, sinto que o clube está a reconquistar adeptos. É um trabalho feito desde há algum tempo e, este jogo, foi a verdadeira prova. As pessoas da cidade gostam do clube e mereceram este jogo. Também mereciam aqueles que já partiram. Esta foi a resposta que a direção precisava para perceber que podemos andar mais acima. Mas só eles saberão!", argumentou.
"Foi o jogo da minha vida. E não estive lá! Enquanto estive na claque, os meus pais nunca me apoiaram, nunca ligaram muito a um jogo do Rebordosa. Desta vez foram ao estádio mais o meu irmão, o meu pai gritou pela equipa. Não tem explicação o orgulho que sinto pelo Rebordosa, pelo que proporcionou. Os meus pais sempre me ajudaram, sim, a receber jogadores em casa para lanches ou jantares, muitos ficaram como família. Ganhei o jogo ao ver as bancadas cheias e com tantos familiares", desabafou Bruno Sousa, mestre a agilizar o que pode, mexer os cordelinhos para resolver impasses.
"Percebi que existiu um certo desentendimento, por causa dos bilhetes, tentei de tudo para as pessoas que não tinham bilhete o conseguissem. Estou fora mas tento prestar uma ajuda a todos os jogadores, mesmo às pessoas que lá trabalham. Pergunto se precisam de algo, falando muito com quem gere as redes sociais. Faço encomendas quase diárias de camisolas para ajudar o clube a ter receitas. Também coloquei um fotógrafo pago por mim na formação a fazer vídeos e fotos para que esses registos cheguem a todos os nossos meninos", documentou.
Saudades do roupeiro e a mensagem do capitão
"Falar do Rebordosa é falar de um amor incondicional, o clube está todos os dias presente na minha vida, mesmo estando na Suíça. Sou tratado por todos como o 'vem aí o Rebordosa'. É a minha paixão! Há adeptos que me mandam mensagens a pedir camisolas e peço aos jogadores para lhes darem no final dos jogos. Isso não se paga. É o que consigo dar ao clube. Enquanto aí estava fazia um pouco de tudo, mas o que mais gostava era de ajudar o meu grande amigo Barbosa, o roupeiro do clube, há mais de trinta anos no clube. Saía direto do trabalho, ia para o estádio ajudá-lo, as conversas com ele levavam-me a chorar de emoção. Ele sente o clube mais do que qualquer outro", sublinhou Bruno Sousa, de 32 anos, contemplando outras sensações da noite histórica.
"Um jogador mandou-me mensagem a perguntar se conhecia alguém sem posses para que ele comprasse bilhetes. Mas já era em cima do jogo. Ver pessoas que acompanham o clube todos os dias terem esta prenda foi lindo. Há muita gente, que nem que o Rebordosa fosse cair à última divisão, deixariam de apoiar. São de gema e amam o clube em todos os dias das suas vidas. Vi todos nas bancadas, muitos a chorar, vi conhecidos, que nunca tinham ido ao estádio. Agora já dizem orgulhosos 'que estádio bonito e incrível'. Rebordosa foi falado em toda a parte", atira, rendido Bruno Sousa, travando um pouco o impacto Braga.
"Braga é que ficou contente por nos enfrentar"
"Tenho de ser sincero, jogar com o Braga foi apenas bom, para mim está ao nível de jogar com o Beira-Mar no Campeonato de Portugal. Eu sou fanático, para mim é lindo o Rebordosa jogar todas as semanas. O jogo com o Braga foi bom porque foi transmitido, mostrou ao mundo a força do clube e da cidade. É isso que retiro. Podem-se rir do que vou dizer mas o Braga é que devia ficar contente por ter enfrentando o Rebordosa. No Campeonato de Portugal é que está a verdadeira paixão, onde se come uma boa bifana e se bebe uma cerveja. E se conhecem as histórias dos clubes. As ligas acima não me dizem nada!, registou, congratulando-se com o trabalho de Arlindo Gomes.
"Tivemos anos complicados, na claque contávamos trocos para irmos com a equipa a todo o lado, tínhamos tudo para subir e algo falhava, ou faltava sorte. Chegou este treinador e trouxe mais profissionalismo. Tem feito a diferença. O Rebordosa tem sido feliz e ainda vai ser mais. Ele sabe o que quer, aposta nos jovens, discute e sofre pelo clube como nós", sustentou Bruno Sousa, lembrando as razões, também emocionais, também associadas ao que é o sentimento pelo clube, para ter partido para fora.
"Primeiro fui para França, tive uma oportunidade de trabalho pouco depois de um jogo da Taça em Arouca, no qual tudo correu mal e fomos derrotados por 5-0. Aconteceram desacatos com os nossos adeptos, eu não fiz parte, tentei acalmar a situação. Acabei por ficar do lado do clube e opor-me ao meu braço direito. Isso partiu a claque ao meio, nunca mais consegui resolver essa amizade. Muita coisa deixou de fazer sentido, a ideia de claque era com ele. Estava magoado, tive essa oportunidade e fui. Mas nunca foi por dinheiro. Entretanto mudei-me para a Suíça, mas todos os dias penso em voltar pelo meu filho e pelo meu clube", desabafou este adepto fervoroso do Rebordosa, incapaz de silenciar a paixão. "Nunca terei outro clube, nem sequer vejo jogos da Liga."