"Dá-me raiva quando dizem que o futebol feminino não gera tanto lucro como o masculino"
Jenni Hermoso recordou o beijo polémico que recebeu de Luis Rubiales, antigo presidente da Federação Espanhola de Futebol (RFEF), após a conquista do último Mundial feminino, defendendo a igualdade de condições em relação ao futebol masculino
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Jenni Hermoso foi eleita esta segunda-feira a “Mulher do Ano” pela revista GQ, após ter sido alvo de um beijo não consentido de Luis Rubiales, antigo presidente da Federação Espanhola de Futebol (RFEF) após a conquista do último Mundial feminino, o que ditou a demissão do dirigente.
Em entrevista à revista, a médio ofensivo, que representa os mexicanos do Pachuca, para além de ter revelado que recebeu “ameaças” na sequência desse momento, admitiu que o caso fez com que tivesse de procurar ajuda psicológica.
"Ter de contar uma e outra vez [o que aconteceu com Rubiales] estava a magoar-me muito. Mas sei que tinha de o fazer sair de alguma forma. Ainda estou a trabalhar nisso com a ajuda da minha psicóloga, com quem trabalho há muitos anos. Para mim, a saúde mental é tão importante como o treino diário e as horas que tenho de dormir para poder entrar em campo. Graças a ela, sinto-me forte e não estou a desmoronar nem a pensar em deixar de querer jogar futebol”, salientou.
Depois de Luis Rubiales ter sido obrigado a deixar a presidência da RFEF, o nome de Jenni Hermoso ficou ligado a um movimento feminista criado nas redes sociais, denominado “#SeAcabó” (“#Acabou-se”, em espanhol), o que para a jogadora foi um sinal de apoio global.
“Com tudo o que aconteceu, penso que muitas de nós, incluindo muitos amigos e familiares, ficaram mais conscientes do que a palavra "feminismo" realmente significa. Nós, no futebol, experimentámos em primeira mão a luta pela igualdade. Chamaram-nos caprichosas. Sempre se disse que queríamos receber o mesmo que os rapazes e isso não era verdade. Dá-me muita raiva quando as pessoas dizem que o futebol feminino não gera tanto dinheiro como o futebol masculino. É óbvio que sabemos isso e nunca pedimos para ser pagas como eles. Só queríamos o básico: ter um salário mínimo, ser respeitadas e ter a oportunidade de fazer algo muito grande. Assim que o conseguimos, ganhámos um Campeonato do Mundo”, enalteceu.
“Quero ser recordada como uma pessoa que quis deixar a Espanha no topo, mas, acima de tudo, como alguém que tentou mudar muitas mentalidades. Felizmente ou infelizmente, existe esta história, mas vou aprender a utilizá-la de forma positiva para lutar por aquilo que considero ser bom para a sociedade. O movimento #SeAcabó deve trazer uma nova era. Nestes últimos meses, com tudo o que aconteceu, a minha cabeça desviou-se um pouco do caminho do futebol", admitiu ainda, sobre o caso Rubiales.
De resto, Hermoso lamentou que, apesar do apoio que a sociedade espanhola demonstrou às jogadores aquando do escândalo, os jogadores da seleção masculina daquele país não tenham sido tão críticos em relação ao mesmo.
"Compreendo que cada um pensa como pensa e também gostaria de poder concentrar-me apenas no meu desporto, mas quando vemos situações injustas, temos de estar de um lado ou de outro. As pessoas vão odiar-me ou amar-me, mas eu tenho a minha maneira de pensar e não me importo de o dizer abertamente: o seu apoio não sei se teria tornado tudo mais fácil, mas certamente que nos teria ajudado muito", apontou, antes de terminar com uma reflexão sobre a forma humilde como leva a vida.
“Para mim, a minha vida é o meu bairro, a minha família, as minhas pessoas, as coisas mais básicas. Nunca farei nada só para ganhar mais dinheiro. Poder lutar por isto (igualdade de condições no futebol masculino e feminino) é mais um motivo de orgulho e quero realmente fazer sentir a minha presença. Se tiver de dar a cara para fazer uma mudança, força”, sentenciou.