Aos 25 anos, Alexandre, de Vimioso e formado em Economia, viu a vida a abanar quando lhe foi diagnosticada Esclerose Múltipla. Demorou a aceitar, mas encontrou no desporto a forma de o fazer. Agora, seis anos depois, vai entrar numa prova de Ironman e espera inspirar outros
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Sempre teve uma ligação forte ao desporto?
Nunca. Era uma criança ativa, mas não fazia desporto. Só comecei há quatro anos, quando estava com 116 quilos e também devido à questão de ter Esclerose Múltipla (EM).
Como foi o impacto de uma doença como a Esclerose?
Lembro-me que foi um dia que vai marcar a minha vida. Tudo começou com uma mancha no olho esquerdo, que vim a descobrir depois que era o meu primeiro surto conhecido. No caminho para casa, depois do diagnóstico após meses de testes, fui sempre em silêncio ao lado da minha mãe. Há pouca informação do que é a EM e eu não sabia o que era. Foi um choque. Nos primeiros anos desvalorizei. Tive vários surtos no primeiro ano, mas continuei com a minha vida como se nada fosse. Não foi a melhor maneira de lidar com isso. Só quando adaptei o desporto à minha vida aceitei e abracei a doença.
Foi uma recomendação médica?
Tive conhecimento de uma dinamarquesa, também com EM, que tinha feito 365 maratonas em 365 dias. Decidi então dedicar-me à corrida e propus-me entrar numa maratona no espaço de um ano. Fui sempre acompanhado por médico, pus sempre questões sobre as minhas limitações. Já tive vários surtos, mas nunca ficaram sequelas. Tenho EM de surto-remissão, ou seja, tenho surto, mas recupero totalmente. E o médico disse-me sempre para fazer a minha vida normalmente, até porque nada do que eu faça pode desencadear surtos. Posso ir a caminho do trabalho e ter um surto. Não tem aviso. Todas as ações que tomo, em princípio, não afetam os surtos. Não se sabem porque aparecem. Mas aparecem.
Então o desporto até pode servir como tratamento?
São três pilares. O desporto, que foi a minha maneira de aceitar a doença, a nutrição e a terapêutica. O exercício é importante, mas medicação é fundamental. Estou há quatro anos sem surtos.
O Alexandre corre pela Esclerose, literalmente. Veste a camisola.
Sim. O EM"Força é um projeto da Sociedade Portuguesa de Esclerose Múltipla (SPEM). Juntei-me a eles em 2014, antes da Maratona do Porto, a minha primeira. Depois disso a SPEM disse-me que tinha sido o primeiro atleta português, com EM, a terminar uma Maratona. No ano seguinte, em 2015 fiz três maratonas num mês. Foi um projeto ambicioso da minha parte.
E agora uma prova de triatlo Ironman é um grande salto...
Esta ideia surgiu depois das três maratonas. Qual seria o meu próximo passo? O trail não me cativa, mas vi um vídeo, no YouTube, de um Ironman e fiquei com pele de galinha. Era isto que queria. Mas não sabia nadar...
De todo?
De todo. Não me afogava, mas tinha medo de sair de pé. Decidi ter aulas para, em 2016 fazer o Triatlo Longo de Cascais. Mas vivo em Vimioso, numa zona em que não há piscinas. Só em Bragança ou Miranda do Douro. Na altura tinha de fazer quase 100 quilómetros para nadar. Ainda agora, em que treino quatro vezes por semana, tenho de deslocar-me, no mínimo, 60 quilómetros para ter aulas em Miranda do Douro.
E agora está a poucos meses da prova...
Sim, vou ao Ironman de Barcelona em outubro. Espero inspirar as pessoas com o meu caso. Isso é motivo de orgulho para mim. O Ironman é sonho meu. Isso é fundamental. Temos de fazer coisas por nós e não pelos outros. Mas é bom inspirar alguém para fazer o que sonha. É isso que pretendo com o meu projeto. Apesar de termos doença que nos condicionam, e muito, temos de viver os nossos sonhos.
"Dediquei-me à corrida depois de descobrir um caso de uma atleta que fez 365 maratonas em 365 dias"
Bolsa financia Barcelona
Alexandre Dias, de 31 anos, foi um dos três vencedores da bolsa atribuída por uma empresa de aparelhos auditivos que visa premiar atletas amadores com histórias únicas e que continuam a perseguir os sonhos. Num júri que contou com Fátima Lopes, Fernando Correia, Francis Obikwelu, Nélson e Sérgio Rosado e VítorGamito, o projeto "IronEM a caminho do IronMan Barcelona 2017" destacou-se e garantiu dois mil euros a Alexandre. "Participar nesta prova exige muito de mim, até financeiramente. Mas esta bolsa ajuda imenso. Com este dinheiro 75% da prova está feita. A bolsa dá-me para as despesas. Falta-me só atravessar a meta."