"Uma semana antes da partida, disse-lhe: 'vamos a Paris, porque Bernal vai ganhar o Tour"
Dito e feito: a cinco dias do início da Volta a França, comprou quatro passagens de Bogotá, curiosamente a cidade do vencedor, para Paris
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Os Campos Elísios são uma gigante bandeira da Colômbia, com milhares de colombianos a vestirem-se a rigor para festejar o triunfo na Volta a França de Egan Bernal, o ciclista que cumpriu o que Nairo Quintana apenas sonhou.
Cerca de sete horas antes da consagração do campeão, já a bandeira da Colômbia era omnipresente nas artérias que desembocam nos Campos Elísios. A ocasião assim o merece e os compatriotas do jovem corredor da INEOS, de apenas 22 anos, chegaram cedo (e bem equipados) para reservar o melhor lugar para presenciar (e eternizar) o acontecimento histórico: pela primeira vez, um colombiano (e um sul-americano) veste de amarelo em Paris.
"Uma semana antes do Grand Départ, disse-lhe: vamos a Paris, porque Bernal vai ganhar o Tour", confidenciou à agência Lusa Ramiro Pavón, sendo prontamente interrompido pela mulher, que empunhando uma bandeira nacional, corrobora: "é verdade, é verdade".
Dito e feito: a cinco dias do início da Volta a França, comprou quatro passagens -- para ele, para a mulher, e para as duas filhas -- de Bogotá, curiosamente a cidade do vencedor, para Paris, onde hoje irá concretizar um sonho com 32 anos, o de estar nos Campos Elísios para festejar um triunfo colombiano.
"Tinha muita fé em Bernal. A maioria das pessoas acreditava que [Nairo] Quintana ou [Rigoberto] Urán iam ganhar, porque tinham mais experiência, e esta é apenas a segunda vez que ele corre o Tour. Mas, quando ganhou o Paris-Nice, as pessoas começaram a ter mais confiança nele", notou.
Na sua análise, Pavón toca, sem querer, na ferida, mencionando os responsáveis por tantos sonhos desfeitos. A geração de ouro do ciclismo da Colômbia, que tomou o testemunho de campeões como Lucho Herrera (vencedor da Volta a Espanha de 1987 e de três etapas do Tour) e Fabio Parra (o primeiro colombiano e sul-americano a conseguir um lugar no pódio, o terceiro, na Volta a França, há 31 anos), prometeu mas não cumpriu, e essa mágoa, sobretudo a referente ao ocaso de Nairo Quintana (Movistar), é algo que a maioria ainda não superou.
Daniela e Jéssica estão sentadas com a restante família nuns bancos desdobráveis junto às barreias colocadas em redor do Jardim dos Campos Elísios. Ambas começaram a acompanhar a modalidade por 'culpa' dos feitos daquele que, por currículo, é o melhor corredor nacional das últimas duas décadas.
"Nós, colombianos, sempre tivemos a esperança - e ainda temos - que Nairo, depois de prestações tão grandiosas no Tour, ganhasse. E Egan é tão novo, vinha na equipa do vencedor em título [o galês Geraint Thomas], não pensávamos que fosse capaz, nem o incluíamos nas nossas apostas"
"Apostávamos muito pelo Nairo. Foi ele que nos fez gostar de ciclismo", dizem, referindo-se aos três pódios -- foi segundo em 2013 e 2015 e terceiro em 2016 - que o vencedor do Giro2014 e da Vuelta2016 conseguiu na prova rainha do calendário velocipédico.
Ainda assim, e apesar de não ter sido o seu ídolo a concretizar o sonho, as duas jovens estão felizes: "É certo que conhecíamos mais o Nairo, mas que ganhe um colombiano é muito emotivo".
"Nós, colombianos, sempre tivemos a esperança - e ainda temos - que Nairo, depois de prestações tão grandiosas no Tour, ganhasse. E Egan é tão novo, vinha na equipa do vencedor em título [o galês Geraint Thomas], não pensávamos que fosse capaz, nem o incluíamos nas nossas apostas. A sua vitória é agora uma realidade e vamos celebrá-la", disse à Hernan Duarte.
Filho do antigo ciclista profissional Alberto Chispitas Duarte, que ganhou a Volta à Colômbia para jovens no já longínquo ano de 1969, este colombiano radicado em Paris não esconde a felicidade e o orgulho nacionais, não apenas por ser seu o'camisola amarela da 106.ª edição, mas também por terem sido presentados com "dois ou três corredores mais que deixam tudo na estrada para representar o país" e para fazer felizes "os fanáticos do ciclismo".
O sentimento é transversal a todos. "Não importa quem ganha, desde que seja da Colômbia. Estamos felicíssimos. Nós e todos os sul-americanos, porque, pela primeira vez, temos um representante no lugar mais alto do pódio em Paris", resumiu Santiago Vasquez.