ENTREVISTA, PARTE II - De Viana do Castelo a Cascais, joga-se o melhor hóquei do planeta, mas há quem sinta dificuldades. Ricardo Ares reconhece que a arbitragem não é capaz de estar ao nível da alta intensidade que marca os principais jogos do campeonato português, lamentando a falta de investimento na tecnologia.
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Realista o suficiente para não usar esta entrevista para se atirar às arbitragens, o técnico basco opta por um discurso apaziguador e com alguns alertas.
Como se explica que o desempenho dos árbitros portugueses seja inferior à qualidade dos jogos?
-Por vezes acontecem situações estranhas no campeonato. Nesse aspeto fico por aqui, mas a verdade é que é muito mais difícil apitar em Portugal.
Em que medida?
-O hóquei vive da qualidade dos atletas e das equipas, e na pista o estilo de jogo triplica o número de situações que acontecem em 50 minutos. Em Espanha, por exemplo, a posse de bola é mais prolongada, mais controlada, há menos um contra um, menos qualidade de passe para uma transição rápida. Esse estilo de jogo, cheio de qualidade, mas num outro ritmo, é pouco vulgar em Portugal. Por cá, é tudo muito mais rápido, aumentam os lances de todo o tipo num jogo. Só vivi isso aqui como treinador. Nos primeiros tempos, o jogo parecia passar-me ao lado, pois não estava habituado a tantas situações. Se a isso juntarmos análises estranhas que todos conhecemos...
Como se dá a volta? Duplas mistas, um português e um espanhol, ou italiano?
-Fala-se da necessidade em fazer um trabalho específico apoiado por todos e isso não acontece. É um problema histórico. Tenho 47 anos, mas há mais de vinte que ouço a mesma conversa. Olham todos para o próprio umbigo. Depois, os clubes pequenos não têm os mesmos recursos e discordam da introdução de marcadores, por custarem 10 mil euros. Formam-se comissões técnicas que lutam por se mudar algo, mas não conseguem resolver grande coisa. Somos uma modalidade pequena e dou como exemplo o andebol, que sabe com dois anos de antecedência onde se jogam as fases finais, está estruturado, e nós, a um mês do início da Champions, ainda nem sequer foi feito o sorteio.
A existência de VAR, tal como na Elite Cup, é imperiosa no play-off?
-Claro que sim! Mais do que no futebol, no hóquei é difícil analisar um lance. Pela rapidez e pelo momento. Muita coisa mudaria com o VAR. Custa 100 mil euros, para FC Porto, Benfica e Sporting seria possível, mas para o Murches com certeza absoluta que lutaria para não ter esse pesado encargo, pois já é difícil manter a equipa na I Divisão. E o hóquei é isto...
"A tua luta é o nosso orgulho"
Há vários anos que Ricardo Ares e respetivas equipas técnicas seguem o lema "A tua luta é o nosso orgulho", visível no gabinete do treinador e exibido através de uma t-shirt branca, com a imagem de um guerreiro, sempre que é conquistado um título, como foi o caso do campeonato, da Taça de Portugal, da inédita Continental e da Elite Cup.
A explicação é comovente: "Quando treinei o Voltregá, o seccionista tinha um filho com cancro da medula e vivi os seus últimos cinco anos, nos quais se sujeitou a duas operações de vida ou morte. O Arnau sentia-se bem connosco, com a equipa, e quando nos deixou a camisola do Voltegrá passou a exibir esse lema [La teva lluita é el nostre orgull]. O pai acabou por morrer com uma doença semelhante e, onde esteja a treinar, levo o lema comigo. É um valor que nos faz lutar".
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