Por ocasião do 50.º aniversário e a celebrar a 14.ª edição, a mítica Ocean Race mudou de configuração e, este ano, vai colocar no mar duas classes em competições paralelas já a partir de 15 de janeiro e até ao início de julho
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Nas águas do Mediterrâneo que banham a cidade portuária de Alicante, em Espanha, há um VO65 100% português, com 10 velejadores orgulhosos com a participação histórica na Ocean Race Sprint Cup, que domingo parte para Cabo Verde.
Por ocasião do 50.º aniversário e a celebrar a 14.ª edição, a mítica Ocean Race mudou de configuração e, este ano, vai colocar no mar duas classes em competições paralelas já a partir de 15 de janeiro e até ao início de julho.
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A volta ao mundo será disputada por cinco embarcações IMOCA, ao longo de sete "legs" e 32.000 milhas náuticas, e a Ocean Race Sprint Cup colocará em prova, durante três "legs", seis VO65 de design único, entre os quais o Race for the Planet, da Mirpuri Foundation Racing Team.
Esta alteração de formato surgiu na sequência da ausência de inscrições por parte dos VO65 para a emblemática volta ao mundo, segundo avançou a organização, e abriu uma janela de oportunidade para a criação da Ocean Race Sprint Cup.
"Isto criou uma oportunidade única para a Mirpuri Foundation Racing Team. Se fosse a volta ao mundo, provavelmente não iríamos com uma equipa 100% portuguesa, mas sendo esta prova de três "legs" intensas, mas curtas, conseguimos juntar os dois mundos", comentou António Fontes, "skipper" do Race for the Planet, atracado na marina de Alicante.
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Ao lado de António Fontes, que na última edição da Volvo Ocean Race (2017/2018) integrou a Scallywag Team, vão estar os olímpicos Bernardo Freitas, Frederico Melo e Mariana Lobato, membros da equipa vencedora da Ocean Race Europe, Hugo Rocha e Diogo Cayolla e os jovens Matilde Pinheiro de Melo, Francisco Cai-Água, Francisco Maia e Francisca Pinho. Hélder Basílio e Nuno Dias completam a equipa em terra.
"Quando montámos esta equipa, a ideia era ter um velejador experiente em cada posição chave do barco. Temos o Bernardo [Freitas], que é muito bom na vela grande e no sistema a gerir o barco lá detrás, do mastro, o Frederico [Melo] no piano e toda a manobra e a Mariana, que é muito boa na proa e a manobra da proa. Tendo estas três posições asseguradas, os restantes são ajudantes", explicou Fontes, de 39 anos, enquanto a restante tripulação fazia trabalhos de manutenção no barco.
Com a língua de Camões como pano de fundo, o "skipper" lembrou da regra da Ocean Race - seis velejadores com +30 anos e quatro com -30 - para explicar a constituição da equipa das "quinas", num misto de experiência e juventude, bem visível no rosto e comportamento de cada membro da tripulação. Os veteranos trocam opiniões, sugerem estratégias e os mais novos observam atentamente e executam prontamente, como ficou bem patente na regata de treino em que a Lusa embarcou.
"Entre os velejadores experientes temos o [Diogo] Cayolla, que não sendo experiente nos VO65, é provavelmente o mais experiente em "offshore" em Portugal, e o Hugo Rocha, que não sendo tão ativo na vela "offshore", é provavelmente o melhor velejador português", frisou o "skipper", ainda antes de receber Hugo Rocha, vindo do Chile, e Bernardo Freitas, dos Estados Unidos, no seio da equipa.
Se os mais experientes mostram "orgulho" por fazer parte de uma equipa totalmente nacional, como partilha Mariana Lobato, que só fará a primeira "leg" da Ocean Race Sprint Cup, por ter um acordo previamente assinado com a Biotherme para a volta ao mundo na classe IMOCA, os mais jovens não escondem a alegria pela oportunidade de embarcar no Race for the Planet.
"Não estava nada à espera, mas foi uma agradável surpresa. É um sonho que nunca esperei que fosse alcançado e estou muito feliz pela oportunidade e por terem acreditado em mim para fazer parte desta equipa", confessou Francisca Pinho, de 24 anos, formada em Gestão Industrial e com experiência em vela ligeira, depois de ter recebido o convite quando estava de férias na Lapónia.
Assim como na velejadora natural do Porto, que está a viver "uma experiência incrível" e foi "muito bem recebida por todos os outros membros, com muita experiência e disponíveis para ajudar e dar formação", é notório o entusiasmo e o deslumbramento entre os restantes colegas mais jovens, ávidos de aprender e ganhar experiência com Fontes, Cayolla, Melo & Ca.
A bordo do VO65 ou à volta da mesa, enquanto o experiente "chef" Rafael Pombeiro prepara o jantar, muito elogiado por todos, e adianta as refeições do dia seguinte, que seguirão para o barco em marmitas de bamboo e sacos térmicos de serapilheira, todos os momentos são aproveitados para debater técnicas, estratégias e planear o dia seguinte.
Após um longo dia de trabalho, há espaço para videochamadas para casa, trocas de mensagens e oportunidade para Matilde Pinho de Melo matar saudades da sua bebé risonha de cinco meses, mas rapidamente o dever e a responsabilidade tomam conta do espírito da equipa.
"Isto é um desafio enorme, mas, acima de tudo, enche-me de orgulho saber que, desde a última Volvo Ocean Race há cinco anos, em que era apenas eu, o Bernardo e o Frederico, hoje temos uma equipa 100% portuguesa. Significa que o trabalho que a Mirpuri Foundation fez e todo investimento já está a dar frutos. Acho que só há quase 50 anos houve uma equipa toda da mesma nacionalidade, isto não é comum", sublinhou Fontes.
Tendo em conta "a oportunidade única" e o apoio da Mirpuri Foundation, o "skipper" não esconde as suas ambições, embora considere a polaca WindWhisper Racing Team favorita.
"Temos um barco ótimo e "budget" para cobrir tudo o que nos faz falta para fazer boas performances. Estivemos em outras situações em que a equipa portuguesa era o "underdog", porque não tinha dinheiro, e aqui não somos o "underdog". Temos experiência, um bom barco, material e condições para tentar vencer a Ocean Race Sprint Cup. Não vai ser fácil, a competição é muito forte, mas temos hipóteses", defendeu António Fontes.
O frenesim da Ocean Race já é latente em Alicante, onde a tripulação portuguesa chegou após um "transporte em que aproveitou para testar os mais jovens, colocá-los ao leme e em várias posições para tirarem dúvidas", como contou Fontes, e as equipas afinam os últimos detalhes para aquela que é uma das mais emblemáticas regatas oceânicas do mundo.
Uma das previsões aponta para cinco dias de regata entre a cidade espanhola e Cabo Verde, "o que significa que vai estar muito vento e vai ser duro", esclarece o "skipper", mas o otimismo, união e orgulho português reina no forte da Mirpuri Foundation Racing Team, que só voltará depois à ação para disputar a penúltima e última "leg", completando assim a histórica edição inaugural da Ocean Race Sprint Cup.