Gustavo Veloso termina a carreira este domingo: "O líder não é só o que ganha corridas"
ENTREVISTA PARTE I - Fez 12 dos 20 anos de carreira em Portugal, foi seis vezes ao pódio da Volta e liderou a W52-FC Porto cinco épocas. Faz hoje a sua última etapa, no Grande Prémio JN, e despediu-se em entrevista a O JOGO
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Gustavo César Veloso tem 41 anos, é um galego de Vilagarcía de Arousa, venceu por duas vezes a Volta a Portugal (2014 e 2015), mas foi segundo em 2020, 2016 e 2013, terceiro em 2019, venceu 12 etapas e vestiu 23 vezes a camisola amarela. Termina hoje uma carreira de 20 anos como profissional, 12 deles no pelotão português e oito na equipa que atualmente se denomina W52-FC Porto. A O JOGO, falou de uma despedida feliz.
Fez a última época pelo Atum General-Tavira apostando em ganhar mais uma Volta a Portugal. Entre o trabalho para o colega Alejandro Marque e uma queda, nunca esteve perto disso. Foi uma desilusão?
-De maneira nenhuma. Sou profissional e sei analisar as situações. Era uma aposta e não foi desilusão, porque na Serra da Estrela demonstrei que estava em condições de discutir a Volta. A equipa fez uma grande etapa e ganhou. No dia seguinte, ao cair, percebi que ia perder tempo e a aposta tinha de passar pelo Marque.
Ganhou duas Voltas e fez mais quatro pódios, todos atrás de colegas. Poderia ter vencido mais vezes?
-Houve Voltas em que foi preferível apostar num colega para a equipa ganhar. Nunca fiz nada que não gostasse que me fizessem. Ser um atleta profissional é isso. Orgulho-me mais pela forma como perdi essas Voltas do que se as tivesse ganho criando problemas na equipa. Aliás, se mudei para o Tavira foi porque sabia que, na equipa anterior, se um colega estivesse melhor teria de o respeitar. Queria mais alguma liberdade. Encontrei um grande ambiente no Tavira e também o grande amigo de muitos anos, o Marque. Vou embora satisfeito. Mais do que ganhar ou perder, creio que deixei uma imagem de atitude e profissionalismo. Tive a carreira que nunca sonhei. Pensava ganhar mais alguma Volta, mas fazer seis pódios não é fácil.
A imagem que fica é de quem sempre pensou nos colegas. É verdade que teve um ano em que deixou de receber para que pagassem primeiro aos outros?
-Sim, porque o líder não é só o que ganha corridas. Para que uma equipa funcione tem de existir esse espírito dentro e fora da estrada. Nessa altura, os colegas valorizaram o que fiz.
Os valores sempre foram importantes para si?
-Pode dizer-se que sim. Enquanto atletas temos de saber que somos vistos como um exemplo por muitas crianças. Temos de saber viver dando exemplos.
Não fica a amargura de não feito uma Volta a França?
-Pensei nisso, por vezes. E se calhar lamento mais nunca ter ido a clássicas como Volta à Flandres e Paris-Roubaix. Mas quando chegas a uma certa idade, e sabendo que fiz o Giro e a Vuelta, aprendes a valorizar outras corridas. Aprendi a desfrutar da Volta a Portugal, fiz muitos amigos, e isso é mais importante.
Tem alguma mensagem de despedida?
-Só tenho uma palavra: obrigado! Tudo o que consegui, nestes 20 anos, foi graças a adeptos, colegas e rivais. É a eles que agradeço o privilégio de ter feito aquilo de que gosto.
"Era do FC Porto, mas fui aplaudido por sportinguistas"
Em 2016, quando a W52 se ligou ao FC Porto, Gustavo Veloso era o líder. "A nível profissional não senti diferenças. Nem sequer a pressão de um grande clube, pois sempre tive a de um atleta que pretende sempre o melhor resultado. A única diferença foi a nível mediático. Passámos a ser conhecidos por mais pessoas, a ter adeptos de fora do ciclismo, mais gente na estrada a aplaudir", conta sobre os cinco anos em que vestiu de azul e branco, destacando o que mais lhe agradou: "Com o Sporting havia a rivalidade de grandes clubes, mas felizmente no ciclismo existiu sempre muito respeito. Lembro-me de ser aplaudido por adeptos do Sporting e de ver adeptos do FC Porto a aplaudir ciclistas do Sporting. Foi um exemplo".