Basquetebol, atletismo, golfe: a história de Babe, a mulher que ganhou tudo
<strong><em>MELHOR ARGUMENTO ORIGINAL - </em></strong>Babe Didrikson: nunca houve, e provavelmente jamais haverá, outro desportista como ela - homem ou mulher.
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Basquetebol, atletismo, golfe. Recordes nacionais, recordes do mundo, séries vitoriosas nunca repetidas. Luta pelo direito da mulher ao desporto, participação em espectáculos de vaudeville (incluindo números como cantora e intérprete de harmónica) e co-fundação da LPGA.
"Não é difícil defender-se que foi a maior atleta da história dos Estados Unidos, homem ou melhor"
O mais difícil, quando se fala de Babe Didrikson, no final chamada Babe Didrikson Zaharias, é escolher um feito para começar. Tornei a lembrar-me da sua história quando, há dias, li sobre Gabriele Grunewald, a atleta americana que continuou a correr mesmo depois de lhe ser diagnosticado um cancro. Também isso Babe Didrikson fez.
Mesmo depois de uma colostomia, ainda ganhou cinco torneios de golfe, nomeadamente o major Women"s US Open. Ainda não há muito tempo, o jornal The New York Times admitiu: "Não é difícil defender-se que foi a maior atleta da história dos Estados Unidos, homem ou melhor." Dava um filme.
Mildred Ella Dridriksen nasceu em 1911, na cidade texana de Galveston, no seio de uma família de imigrantes noruegueses. A mãe chamava-lhe "Babe", em honra do basebolista Babe Ruth, porque ninguém da sua idade - rapariga ou rapaz - conseguia bater tão longe uma bola de basebol. Mildred acabou por assumir o nome de guerra Babe Didrikson, e foi com ele que começou por se destacar como basquetebolista. Estrela da equipa do Beaumont High School, foi depois recrutada pela empresa Employers Casualty Company, de Dallas, que a empregou como secretária, mas em exclusivo para a representar nas competições da Amateur Athletic Union. E foi um êxito. N
o basquetebol, Babe levou a sua equipa a todos os títulos possíveis, liderando individualmente em todas as estatísticas. No atletismo, chegou a oferecer à Employers Casualty o título colectivo num campeonato nacional em que foi a única representante da empresa. Saltava em altura e corria para ir lançar o dardo, fazia os 80 metros barreiras e apresava-se para a prova de lançamento do peso. Competindo contra centenas de atletas e equipas com dúzias de elementos, conquistou cinco das provas individuais - batendo vários recordes do mundo - e, sozinha, a competição por equipas.
A busca de novos estímulos levou-a aos espectáculos circenses, onde era apresentada como "A Maior Atleta do Mundo". Fazia habilidades desportivas, tocava harmónica e até cantava
O país apaixonou-se por ela, mas muito ainda estava para vir. Convocada para os Jogos Olímpicos de Los Angeles 1932, qualificou-se para cinco provas, mas os regulamentos limitavam a participação de cada atleta a três. Ganhou no lançamento do dardo (em que bateu o recorde olímpico), ganhou nos 80 metros barreiras (em que bateu o recorde do mundo) e só teve de se contentar com a prata no salto em altura porque os juízes lhe eliminaram um salto em que passou a barra com a cabeça antes de a passar com o corpo, uma técnica hoje autorizada e vulgar. Entretanto, os jornalistas dividiam-se. O mítico Grantland Rice haveria de tecer-lhe as mais apaixonadas loas, mas outros escreviam que devia ficar em casa, à espera de que o marido voltasse do trabalho; que só se tornara desportista porque não era bonita; e, inclusive, que não passava de um homem disfarçado.
A busca de novos estímulos levou-a aos espectáculos circenses, onde era apresentada como "A Maior Atleta do Mundo". Fazia habilidades desportivas, tocava harmónica e até cantava. Entretanto, descobriu o golfe, que descreveu como "um desporto de coordenação, ritmo e elegância". Ganhou uma série de torneios como amadora, incluindo um British Ladies Amateur Open, que nenhuma americana vencera antes. Foi a jogar golfe que conheceu o marido (e depois também agente): o mui detestado lutador profissional George Zaharias, dito "O Grego Chorão de Cripple Creek", e que, durante uma ronda de golfe, bateu um drive mais longo do que o dela, chamando a sua atenção. Seria Zaharias a gerir a carreira de Babe como golfista. Esta acabaria por se tornar profissional e viria até a disputar um torneio da PGA masculina, em 1934 - feito que apenas em 2003 Annika Sorenstam viria a repetir -, mas nem assim conseguiu ser incluída no US Open. Fundaria com algumas colegas a LPGA e, no total, conquistou 82 torneios (incluindo 14 consecutivos, outro número nunca igualado).
Tornou-se uma diva LGBT, apesar de nunca ter sido gay: era pela diferença, e isso bastava.
Os mais impressionantes foram os últimos cinco. Diagnosticada em 1953 com um cancro no cólon, Dridrikson foi alvo de uma colostomia, passando a carregar uma parte do intestino grosso exposto, para eliminação das fezes. Não voltaria a jogar golfe, disseram os médicos. Mas voltou 14 semanas depois, ganhando mais cinco vezes, incluindo um Women"s US Open e a Ordem de Mérito da LPGA em 1954. Infelizmente para ela, para a América, para o desporto e para a condição feminina, o cancro voltaria em 1955, levando à sua morte no ano seguinte, aos 45 anos.
Não era uma mulher bonita, pelo menos pelos padrões da época, mas também nunca aceitou "melhorar a sua imagem", como lhe pediam as estações de TV, numa altura em que o desporto ganhava crescente espaço no pequeno-ecrã. Nos últimos anos, falou sempre abertamente da doença, contrariando a tendência geral para se sussurrar a palavra "cancro". A Sports Illustrated nomeou-a seis vezes Atleta do Ano, entregou-lhe o título de Melhor Atleta Feminina da Primeira Metade do Século XX e, em 2000, o de segunda melhor de todo o século, atrás da heptatlista Jackie Joyner-Kersee. Tornou-se uma diva LGBT, apesar de nunca ter sido gay: era pela diferença, e isso bastava.