"A avaliação é um elemento central de qualquer processo, não pode ser deixada só para o fim"
Nuno Ferro, presidente da Sociedade Portuguesa de Educação Física, falou a O JOGO sobre o Congresso Nacional de Educação Física que decorreu na Figueira da Foz
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A 11ª edição do Congresso Nacional de Educação Física reuniu cerca de 500 professores, treinadores e técnicos na Figueira da Foz, sob o tema "Avaliar para Melhorar", abordando várias temáticas relacionadas com as áreas de Educação Física, treino desportivo e exercício e saúde. Ao fim de três dias de conferências, painéis de discussão, comunicações livres e workshops com especialistas e personalidades de referência nas várias áreas, é possível retirar ilações das intervenções e trabalhos desenvolvidos. O JOGO, enquanto parceiro do evento, falou com o Presidente da Sociedade Portuguesa de Educação Física (SPEF), Nuno Ferro
O JOGO - No discurso de encerramento, abordou a necessidade de as universidades olharem mais para o que acontece na prática do dia-a-dia. Pode falar melhor deste aspeto?
Nuno Ferro - A ideia que sempre tivemos quando, na organização dos congressos nacionais, estabelecemos estas lógicas de cooperação com as universidades, foi exatamente a de criar pontes entre o conhecimento prático e o teórico. Se isso não acontecer, a possibilidade da nossa área se afirmar fica reduzida. Esse é um desafio que temos pela frente. A prática não pode existir sem a teoria, nem vice-versa. Não se pode deixar as questões da teoria exclusivamente nas mãos das universidades, nem as questões práticas nas mãos dos profissionais. Todos praticam e todos teorizam, isto tem de ser um princípio. Tem de haver uma partilha e falarmos sobre as mesmas coisas, o que nem sempre acontece.
P - Ficou clara a ideia de que este foi um Congresso profícuo, com os participantes a saírem satisfeitos. Foi um bom Congresso porquê?
NF - Penso que alcançámos vários objetivos. Numa lógica de descentralização, estiveram aqui presentes pessoas de todo o país. Conseguimos ter pessoas que a comunidade da educação física não está habituada a ouvir falar, com novas vozes a falar de coisas boas. Foi refrescante e as pessoas ao reconheceram tudo isto saíram satisfeitas, que é o principal elemento para medirmos a qualidade do evento. Claro que nem tudo é maravilhoso, mas no geral a imagem é muito positiva.
P - O que é que se pode retirar desta edição do evento? O que é importante que todos pensem e ponham em prática no terreno?
NF - Uma das ideias fortes é a de que a avaliação é um elemento central de qualquer processo, que não pode ser pensada só no fim desse processo, pois então é tarde demais. O processo avaliativo garante uma qualificação com um duplo sentido: qualifica aqueles que usufruem das práticas e qualifica aqueles desenvolvem e são responsáveis pelas práticas. Este duplo sentido de proveito de uma correta avaliação, penso que é um elemento-chave. A segunda questão que se pode relevar é a de que se avalia muito pouco em Portugal, não existindo uma cultura de avaliação em diversas áreas, algo que tentámos contribuir para desenvolver neste congresso. A avaliação tem de ser considerada no início dos processos, seja uma avaliação inicial dos alunos, a avaliação inicial do treino com o consequente plano e prescrição que daí resulta. Esta ideia de que o trabalho avaliativo precede os objetivos que se quer alcançar, foi algo que todos sublinharam neste congresso.
P - Outro debate frequente foi sobre a idade ideal para se começar a educação física. Os professores estão preparados e querem essa mudança?
NF - Nós defendemos que os anos do 1º Ciclo são os momentos críticos para se aprender estas questões estruturantes e fundamentais, sejam na matemática, no português, na música e também na educação física. Enquanto isto não acontecer, é sempre um débito de competência que vai acumulando e tendo impacto ao longo do tempo. O que a investigação nos diz é que os processos de autoeficácia, ou seja, a minha capacidade de realização de coisas, é determinante na minha motivação e vontade de querer fazer. Se eu não souber mexer o meu corpo, ele vai recusar aquilo que pode fazer e acabo encostado a lógicas de sedentarismo, que é o que está a acontecer com os nossos jovens. A falta de estimulação e da dotação de uma capacidade de desempenho motor faz com que os jovens, cada vez mais, se refugiem em comportamento de inatividade física, com tudo o que de negativo representa em termos de aprendizagem e de saúde. Também procurámos transmitir essa mensagem ao longo deste congresso. Temos de ter focos e este é, sem dúvida, um dos nossos focos e "batalhas" nos próximos anos.