O antigo avançado francês falou sobre a relação complicada que teve com o seu pai e da forma como isso influenciou a sua saúde mental enquanto jogador
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Thierry Henry, antigo avançado e atual selecionador da seleção francesa de sub-21, concedeu esta segunda-feira uma longa entrevista ao canal de Youtube “The Diary of a CEO”, na qual abriu o livro sobre a sua saúde mental enquanto jogador.
Nesse âmbito, o selecionador salientou que a relação complicada que sempre teve com o seu pai foi algo que resultou em que desenvolvesse, ainda que de forma inconsciente, depressões ao longo da sua carreira, muito por causa de uma constante necessidade de o agradar.
“A primeira vez que o meu pai me pegou ao colo, disse: 'Este bebé vai ser um futebolista incrível’. E pôs-me no chão. Podem imaginar o que aconteceu a seguir. Eu estava programado para ter sucesso. Não importa o que acontecesse. Ele pôs-me num campo quando eu tinha cinco ou seis anos e, a partir daí, era uma missão. Realizar o seu sonho, agradar-lhe. Não sei se gostava muito de jogar futebol, mas sei que não odiava. Por outro lado, não era de todo a minha escolha", começou por explicar.
“Eu sabia que, se quisesse fazer o meu pai feliz, só poderia ser através do futebol. É a coisa mais difícil que já tive de fazer. Quando era pequeno, o meu pai nunca me dizia o que eu fazia de bom. Eu precisava da aprovação dele, que me dissesse que eu estava a evoluir. Mas ele dizia-me sempre o que eu tinha perdido, o que tinha feito mal. Até há bem pouco tempo, sempre quis agradar às pessoas, porque era algo a que não tinha acesso em criança”, acrescentou.
Henry, que continua a ser o maior goleador da história do Arsenal, com 228 golos em 377 jogos, também admitiu que a educação que recebeu em França poderá tê-lo ajudado mentalmente.
“Funcionou durante algum tempo. Mantinha-me com os pés no chão e dizia-me que tinha de ser melhor todos os dias. Mas não ajudou a criança que eu era, o ser humano. Ajudava o atleta. A minha felicidade ou tristeza vinha das pessoas. Não sabia o que me deixava triste ou não. Eu estava... não diria morto, mas expressar as minhas emoções era muito difícil, para além da raiva e da fúria”, revelou.
“De certa forma, mesmo durante a minha carreira, eu queria fazer o meu pai feliz. Andava a perseguir isso. Não sabia se eu próprio era feliz, não me questionava sobre isso, não me importava”, continuou Henry, que aproveitou para confirmar um relato que surgiu em 2004, quando se recusou a acompanhar os colegas do Arsenal na festa da conquista do título dos “Invencíveis”: "Fiquei em casa. Disse-lhes que o Euro estava a chegar. A certa altura, não estava a aproveitar”.
Apesar desse efeito negativo, Henry frisou que não guarda ressentimentos em relação ao seu pai: "Ele nunca leu, nunca viajou. Só sabe fazer as coisas de uma maneira, a maneira como foi ensinado. Se eu comparar a educação que recebi com a que ele recebeu, já há uma grande diferença. Não podemos ficar zangado com alguém que está a dar o seu melhor, que nos ensinou com as suas ferramentas. Atualmente, não tenho as mesmas ferramentas que ele teve, tenho mais, e os meus filhos terão ainda mais”.
“Quando ouço as pessoas a falarem de depressão, isso toca-me. Sou um ser humano, tenho sentimentos. Durante a minha carreira, devo ter estado deprimido. Se eu sabia? Não. Fiz alguma coisa para o evitar? Não, não fiz. Mas adaptei-me. Não quer dizer que ande bem, mas ando. Foi o que me ensinaram desde miúdo", concluiu.