Sabe-se que o Real Madrid é o grande favorito contra o Dortmund. Mas o que torna os merengues os favoritos na final da Liga dos Campeões?
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O Real Madrid está a um jogo de garantir a 15ª Liga dos Campeões da sua história e a terceira sob o comando de Carlo Ancelotti. O atual plantel merengue é já um dos mais fortes do mundo e pode consolidar-se ainda mais neste patamar quando um certo jogador francês chegar para a próxima época... Mas, como é que Ancelotti organiza a equipa?
O Real Madrid geralmente joga com um 4-3-3 muito flexível. Como Bellingham atua predominantemente como um falso 9, a equipa muitas vezes toma uma forma de um 4-4-2 durante a defesa ou um 4-1-2-1-2 no ataque, como vamos ver mais à frente.
Embora Ancelotti tenha adquirido uma fama recente de que as equipas que comanda não são as mais taticamente desenvolvidas, ele tem sido uma vítima de um revisionismo histórico de que se não há uma filosofia clara, não há uma tática. Nem todos os treinadores são pragmáticos como Guardiola, mas pragmatismo tático não significa vitórias garantidas. Ancelotti é a prova disso.
O próprio italiano já admitiu ser pragmático antes. Quando estava no Parma, o Italiano disse que para ele só havia um sistema, e esse era o 4-4-2 de Arrigo Sacchi. “Por conta disto eu recusei ter Roberto Baggio no Parma, porque ele disse que queria jogar como número 10. Eu disse ‘não, não jogo com número 10’”, contou o treinador. Ancelotti só mudou de ideias ao treinar Zidane na Juventus.
Desde então, tem apresentado uma flexibilidade formidável: adapta o sistema aos seus jogadores ao invés de impor um sistema pré-determinado que exija uma série de intervenções no mercado. Ele nem sequer reclamou de não ter contratado um central na janela de inverno embora tenha perdido Alaba e Militão, com graves lesões. Tchouaméni e Carvajal chegaram a ser a dupla de centrais num jogo.
E é nessa flexibilidade tática que está o domínio do Real Madrid. Sobre a sua filosofia como treinador, o italiano disse que acredita “muito na criatividade dos jogadores quando têm a bola” e que não gosta de “os obrigar a ficar obcecados com formas pré-definidas”. “Claro que temos de trabalhar sem bola, mostrar empenho e concentração, insistirei mais nesses elementos de um ponto de vista tático. Mas a criatividade é fundamental, sobretudo com jogadores como os nossos, que têm tanto talento”, concluiu Ancelotti.
A questão do trabalho sem a bola é fundamental nesta equipa de Ancelotti. O treinador tem um sistema de pressão muito eficiente contra equipas que tentam sair com a bola, Não se prende a formas, mas a espaços.
O bloco alto de pressão e a defesa muito bem-organizada são refletidas na forma com a qual o Real Madrid quer sair para o ataque. Com Vinícius Júnior e Rodrygo como avançados ao defender num 4-4-2, o Real Madrid consegue sempre sair no contra-ataque com muita velocidade.
Mas não é só o bloco alto do Real Madrid que precisa ser destacado. O estilo de jogo do clube espanhol provou ser extremamente dominante ao longo da temporada, embora seja relativamente heterodoxo.
Tudo isto vem de alguns fatores que são, com frequência, contraditórios taticamente, mas que funcionam para o Real Madrid. O primeiro vem da pressão: embora a equipa jogue com um bloco muito alto e force o adversário a aliviar a bola com frequência, a intensidade da pressão não é muito alta, e a linha de defesa tende a ser mais alta para equipas que pressionam tão alto. Mesmo assim, o Real Madrid continua a ser um dos líderes em vários dos principais parâmetros de uma equipa dominante.
A equipa estar no meio do percentil de saída apoiada também é curioso, visto que equipas que não têm um ponta de lança forte e bom no ar costumam valorizar mais essa saída desde a defesa. Não é como se os guarda-redes do Real Madrid fossem exímios a passar a bola, também. Contudo, o bloco alto e, principalmente, a pressão indicam que a decisão do guarda-redes de aliviar a bola vem muito mais de uma confiança de que ela é recuperada lá em cima do que de uma necessidade de se livrar da pressão.
Embora estas duas características menos usuais tenham funcionado – e muito bem – para o Real Madrid nesta temporada, o clube já foi exposto algumas vezes por conta delas. Nas duas derrotas contra o Atlético de Madrid, as duas únicas do Real Madrid na temporada, os merengues sofreram com o espaço deixado entre os médios e os defesas. A equipa de Ancelotti com um bloco muito alto, mas que não tinha nem a intensidade dos que pressionavam, nem a agressividade dos defesas para subir a linha e limitar as opções dos colchoneros. O resultado foi um Real Madrid aparentemente passivo na pressão, contra um Atlético de Madrid que não se sentiu intimidado durante a posse.
Mas algo não muda: o Real Madrid, de facto, tem um repertório excelente no ataque. O comentário de Ancelotti sobre aproveitar a criatividade de sua equipa não foi minimamente exagerado.
O Real Madrid tem uma variedade incrível de entradas na área adversária. Embora a concentração dos passes seja principalmente no meio-espaço esquerdo do ataque e as conduções sejam predominantes na linha de fundo pela esquerda, o acumulado revela que o Real Madrid entra na área por todos os lados.
Vinícius Jr., Bellingham, Rodrygo, Kroos e Valverde são jogadores muito polivalentes e conseguem construir situações que poucos jogadores conseguem. Dos suplentes, Modric, Brahim Díaz e Arda Güler também são jogadores que provaram ser muito perigosos ofensivamente.
Uma equipa que tem tanto talento nunca vai sofrer se tiver um treinador que lhes dê liberdade. Com um plantel totalmente saudável, jogadores como Modric, Rüdiger, Camavinga,, Güler e Brahim são suplentes, além de Joselu, o salvador improvável das meias-finais.
Ao renunciar de qualquer pragmatismo e se adaptar ao jogo moderno, Ancelotti tem feito desta uma temporada inesquecível para o adepto madridista. O próprio italiano já admitiu que esta foi a melhor temporada em termos de desempenho numa liga doméstica em sua carreira. Com apenas duas derrotas, pode muito bem ser a melhor temporada em termos gerais. Resta saber se virá a cereja no topo do bolo.