Football Leaks: Manchester City fintou fair play financeiro com ajuda do presidente do Lille
De Manchester a Lille, com passagem pela Holanda, Luxemburgo e Ilhas Caimão - os caminhos usados pelo clube inglês para disfarçar a criação de um fundo de investimento ilegal foram revelados pelo Football Leaks e podem implicar sanções da UEFA.
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Documentos divulgados pelo Football Leaks e analisados por vários órgãos de comunicação social europeus revelaram um esquema do Manchester City (Inglaterra) para contornar as regras do fair play financeiro que contava com a colaboração do presidente e do diretor-geral do Lille, Gérard Lopez e Marc Ingla, respetivamente. Em 2013, esta dupla criou um fundo que geria passes de jogadores TPO (third part ownership, na sigla em inglês) e era secretamente controlado pelo clube inglês, através de uma empresa off shore com sede nas Ilhas Caimão. Há um nome português por detrás da revelação história: Rui Pinto, o hacker que vive na Hungria e a Justiça portuguesa quer extraditar para Portugal, foi quem forneceu os documentos do Football Leaks que poderão mesmo levar à exclusão do City da Liga dos Campeões.
A operação é concebida, em 2012, por Ferran Soriano, diretor executivo do City, oriundo do Barcelona, que propõe a criação de um fundo "gerido de forma independente, mas que receberia instruções do City". O plano consistia em investir 30 milhões de euros em cerca de 70 futebolistas, durante dez anos, com uma taxa de rentabilidade interna de 30 por cento. Entre os alvos desta empresa estavam os "melhores jovens da América do Sul" e para os agregar o fundo poderia mesmo adquirir um clube local que serviria "apenas como plataforma para registo de jogadores". O país preferido é o Uruguai, onde um "clube de fachada pode inscrever até 40 jogadores". Em março de 2013, o projeto de Soriano avança - embora, por essa altura, a partilha de passes já fosse proibida em Inglaterra - e este trata de encontrar um "parceiro de confiança". Esse será Marc Ingla, com quem trabalhara no Barcelona e que então está ligado a um fundo de investimento com sede no Luxemburgo, Mangrove Capital Partners, fundado e gerido pelo presidente do Lille. A troca de correspondência divulgada pelo Football Leaks não deixa dúvidas acerca do esquema. O próprio Marc Ingla admite que o Manchester City pretende "aparecer como uma entidade totalmente independente e uma parte não ligada" ao fundo, mas que será o clube inglês que "tomará todas as decisões desportivas e de investimento". Admite também a necessidade de "contornar as regras do fair play financeiro".
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Diluir a ligação do Manchester City ao fundo de investimento obrigou a um sofisticado esquema jurídico, com a criação do Mangrove Player Investment (MPI) II - uma vez que já existia o MPI -, que viria a assinar um acordo de cooperação com o Manchester City e com uma segunda sociedade luxemburguesa (MP II & Partners), encarregada de negociar passes de jogadores. Esta última, será proprietária de uma fundação holandesa, Stiching MPI II. O fundo do City será financiado através de um empréstimo obrigacionista, tudo para esconder a participação do clube. "Especificámos de forma detalhada quem faz o quê e como a marca MC será disfarçada", escreve o atual diretor geral do Lille, em junho de 2013, poucos meses antes de o projeto avançar. Em outubro, o fundo ganha personalidade jurídica; é financiado por uma empresa com sede nas Ilhas Caimão, um paraíso fiscal, onde o nome dos proprietários não é conhecido.
De acordo com o Football Leaks, pelo menos três jogadores foram negociados neste esquema controlado pelo Manchester City, que já antes estava a ser investigado pela UEFA por não cumprir as regras do fair play financeiro. Na altura, um responsável chegou mesmo a afirmar que, caso o esquema viesse a ser provado, o clube inglês arriscaria a "mais pesada das sanções, a exclusão das provas da UEFA", recorda o L"Équipe, na edição deste sábado.