"Fazer 150 jogos em quatro épocas, em campos muito fracos, merecia mais valor"
Pedro Pinto, central português de 30 anos, fechou etapa no Petro. Fez o pleno e sagrou-se tetracampeão pelos petrolíferos. Aponta a um regresso a Portugal
Corpo do artigo
Após quatro temporadas de grande nível em Angola, fazendo pleno de títulos no Petro, Pedro Pinto regressou de férias a Portugal com ideia assente de mudar o chip e tentar encontrar o seu espaço nas ligas profissionais. Aos 30 anos, o antigo central do Leixões, Vitória de Setúbal e Arouca, tendo jogado na Liga pelos últimos dois, já faz, no íntimo, as despedidas de Angola, anunciando-se disponível para outras ofertas e desafios. Apresenta a invejável moldura de uma desenvoltura de 150 jogos e dez golos pelos petrolíferos, pisando constantemente os palcos da Champions de África.
O balanço é para lá de satisfatório, embora com os lamentos de uma visibilidade reduzida, já que o êxito não foi contemplado do apreço global que desejaria. "Só tenho de me sentir orgulhoso pelo meu trajeto num gigante que vivia adormecido. Conseguimos voltar a colocar o Petro onde merece, como melhor equipa de Angola e entre as melhores de África, bastando ver a nossa presença numa meia-final e outra nos 'quartos' em quatro anos. Era algo que as equipas angolanas não alcançavam há imenso tempo", observa o central, que encaixou no poderio da equipa treinada primeiro por Alexandre Santos, depois por Ricardo Chéu. "Não foram campeões durante onze ou doze anos, passaram dificuldades, esforçavam-se para voltar ao topo e não conseguiam. Em quatro anos, ver o que foi feito, não há comparação possível. Somos, verdadeiramente, a melhor equipa de Angola, somos tetracampeões, conseguimos levar o Petro à melhor pontuação de sempre no continente africano. A prova veio com a African Football League, que só cabe às oito melhores de África. E Angola esteve lá com o Petro e contra rivais de países com investimento tremendamente maior", explica Pedro Pinto, revelando as aspirações que se seguem. "Achei por bem fechar o meu ciclo em Angola, agradecendo a oportunidade que me deram. O futuro é incerto, estive quatro anos sozinho numa realidade bem diferente e o regresso a Portugal é uma opção muito válida. Mas não descarto nada...", avisa o central, lendo o fôlego do que vivenciou, do fôlego à autoridade dos 150 jogos, sem efeito lucrativo noutra chamada mais tentadora.
"É um tema chato, porque os campeonatos africanos não têm, efetivamente, grande visibilidade e o Girabola é um caso flagrante. Mas quem tem a oportunidade de o jogar, sabe como é difícil apanhar uma realidade muito mais física. Não esperava encontrar tanta qualidade. O maior problema é o processo tático. Da minha parte, fazer 150 jogos com condições fracas de muitos campos, três jogos por semana muitas vezes, inúmeras viagens, acho que merecia muito mais valor. Mas a informação é reduzida e sai desvalorizada", vinca Pedro Pinto, aplicando o seu sentido crítico.
"Angolanos são felizes sem terem nada, basta uma coluna e passam o dia a dançar"
Vivendo em Angola e, particularmente, numa Luanda conhecida pelas suas tenebrosas disparidades, Pedro Pinto matuta no seu retrato sócio-cultural. "Foi um difícil choque de realidades, vivi coisas que nunca tinha pensado viver e passando por elas é que te apercebes como é difícil lidar com isso. Mas o que mais cativa é que os angolanos são felizes sem terem nada, com muito pouco conseguem transmitir felicidade e olhar para a frente, mostram o seu sorriso contagiante, fazem uma dança alegre, quando tudo à volta são adversidades", reflete.
"O melhor de tudo é estar sempre calor. É anda sempre de calção e chinelo. O ano todo! Pouco chove e quando acontece, em poucas horas, fica tudo seco. Depois há essa diferenciação de zonas muito boas e muito más. Passas por situações na rua às quais não consegues ficar indiferente. Mas lá está, pode estar uma coluna na rua que os faz felizes e ficam a dançar o dia todo. Complicada é mesmo a desorganização", evidencia, exemplificando certos cabos das tormentas. "O trânsito é caótico e não há regras. Situações caricatas são aos montes, não estamos habituados. Mas fico com um país de condições incríveis para quem gosta de praia, bom tempo, boa comida. Mas como o turismo é baixo, muitas pessoas preferem outros destinos", assinala Pedro Pinto, que também sentiu o fulgor e a euforia traduzida na geografia angolana pelo êxito dos Palancas Negras no passado recente.
"Bons jogadores sempre existiram mas o povo cobrava imenso e continua a fazê-lo. Alguns jogadores que jogavam fora, deixaram de representar o país mas, agora, Angola reaparece com força no raio africano, os resultados estão a aparecer e a valorizar também o Girabola. Veio alguma visibilidade e Angola deixou de ser tão indesejável como era antes."