"Aprendi a desfrutar de um assado argentino, mas também os 'evangelizei' com pastéis de nata"
ENTREVISTA >> Figura carismática por onde tem passado, Ricardo Pereira é um treinador de guarda-redes que não deixa ninguém indiferente, marcando uma empatia fácil com quem o rodeia.
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Aos 49 anos, Ricardo Pereira exerce feliz, descaradamente apaixonado, a sua tarefa no Equador, oferecendo a sua competência no crescimento do Independiente del Valle, por quem já conquistou a Taça Sul-Americana, diante do São Paulo e a Recopa frente ao Flamengo. Acabou de ser fortemente pretendido pelo Mengão mas não se deixou inebriar pela potência popular do emblema carioca.
- Como descrever esses anos de trabalho no Independiente de Valle e, ao mesmo tempo, a realização no Equador?
São anos de crescimento profissional vividos com paixão, com muitos títulos e com uma forma personalizada de jogar que nos levou a ser cada vez mais competitivos e a superar, algumas vezes, as melhores equipas da América do Sul. Viver no Equador e abraçar este projeto desafiou-me a sair uma vez mais da minha zona de conforto. O que mais me atrai no país são definitivamente as pessoas pela sua alegria, trato afetuoso e humildade. Adoro o povo equatoriano, a sua cultura e a sua gastronomia. Relativamente ao clube atrai-me tudo menos a distância a que fica de Portugal. Represento um clube incrível e em permanente crescimento desportivo, financeiro e estrutural. É provavelmente o clube mais "Europeu da América do Sul". Considero este clube um exemplo ao nível do recrutamento e da formação de Jogadores. Em cada departamento do clube trabalham muito poucas pessoas, mas altamente competentes e diferenciadas, além de extremamente afetuosas no trato, o que torna o clube muito acolhedor e familiar.
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- Como é a organização da vida por esses lados, sem mais parceiros portugueses por perto?
É uma vida tranquila pelas condições que o clube nos oferece para estarmos confortáveis e só precisarmos de nos concentrar em planear, analisar adversários, treinar bem e praticar um futebol que continue a fazer do Independiente del Valle um clube que a cada ano que passa tem mais adeptos e admiradores em todo o continente americano. Tenho a sorte de fazer parte de uma equipa técnica muito jovem e competente constituída por argentinos, uruguaios, espanhóis e equatorianos.
- E quais são os melhores caprichos locais?
Aprendi a desfrutar de um mate, de um assado argentino, mas também os "evangelizei" com pastéis de nata, sopa da Pedra e os melhores vinhos portugueses. Estou completamente adaptado ao País... mas diariamente levanto-me e adormeço com aquela palavra tão portuguesa...que é a saudade... Na verdade, sinto muito a falta da minha família e de estar mais tempo em Portugal!
- Também apanhou aí o Renato Paiva...teve algo a ver com a chegada dele pelo conhecimento que tinham um do outro no Benfica?
Recebi-o aqui naquela que foi a sua primeira experiência fora de Portugal... Eu tinha chegado em 2020 e já tinha uma época de clube, de um contrato de três anos... Quando saiu o Miguel Ángel Ramirez, com quem adorei trabalhar, pela pessoa e treinador que é, o clube procurava um novo técnico. Pretendiam ter, no mínimo, três perfis que se enquadrassem no projeto para poderem depois escolher criteriosamente. Tinham apenas dois nomes e queriam mais um. Pela relação de confiança que havia entre mim e a Direção perguntaram-me se os podia ajudar e sugerir alguém que se pudesse enquadrar no perfil pretendido. Sugeri o Renato pela competência que lhe reconheci durante os três anos de trabalho em conjunto. Ninguém o conhecia aqui e foram pesquisar "a que jogavam as suas equipas...". De resto procurei ficar à margem do processo.
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- O que tem sido mais gratificante, títulos, integração no Equador ou formação de grandes guarda-redes?
Claramente o projeto desportivo e o processo de treino! Ser uma pequenina parte do processo de desenvolvimento e crescimento de um clube e poder contribuir através do treino para um jogar de qualidade tem feito de mim um treinador muito feliz. Sentir que obtivemos resultados porque o nosso jogo posicional é difícil de contrariar e nos permite ter posse de bola contra adversários poderosos e desta forma estar mais próximos de ganhar. Sentimos que este estilo de jogo tem feito crescer o jovem jogador equatoriano e os tem preparado para singrar no futebol Europeu, originando igualmente receitas importantes. Tive a oportunidade de, enquanto coordenador do departamento de guarda-redes, poder ajudar a construir um perfil que se adequasse completamente à nossa forma de jogar: guarda-redes que soubessem manter e dar qualidade à nossa posse de bola, assumindo-se como " o homem livre" que está sempre posicionado para ser solução de passe; guarda-redes agressivos nos seus posicionamentos para poderem cobrir espaços pelo chão e pelo ar; e bem posicionados e eficientes para protegerem bem a baliza em situações de remate. Decidimos igualmente deixar de contratar guarda-redes e formá-los nós próprios. Os guarda-redes da equipa principal têm hoje entre os 16 e os 22 anos e são todos eles opções reais para representar a Seleção Nacional. Haverá maior felicidade do que esta?".