Marcos Severo foi reforço do Salgueiros em 1996/97 e esteve numa vitória sensacional na Luz, por 4-3. Aos 58 anos recorda passagem por Portugal e memórias únicas de Vidal Pinheiro
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Avançado de grande porte, Marcos Severo chega a Portugal em 1996/97 para representar o Salgueiros, transformando-se numa peça importante do plantel salgueirista então treinado por Carlos Manuel. Chega já maduro e experiente, com 32 anos, com registo de uma passagem pela Coreia do Sul, tendo no Grêmio o grande clube representado no Brasil.
Em Portugal apresenta-se oriundo do Ponta Grossa, marca 11 golos pelos de Paranhos na primeira época, incluindo dois golos numa impressionante vitória da equipa de Vidal Pinheiro na Luz (3-4), funcionando como carrasco de Preud'Homme. Lançado aos 70, faturou aos 89 e 90, já haviam marcado antes Abílio e Nandinho "Ainda mantenho o contacto com os salgueiristas, o meu carinho enorme para com eles e com a cidade do Porto. Sempre que posso comunico com alguém pelas redes", relata Marcos Severo, hoje com 58 anos, lembrando os dias da sua aterragem em Portugal.
"Eu cheguei com muita estrada, muito rodado e já com muitos bons momentos vividos no futebol. Entre tudo o que aconteceu no Salgueiros nessa época, ganhar na Luz, da forma como foi, foi o momento mais inesquecível. Falo por mim e pelos companheiros. Nunca tive um pensamento individual, dependemos uns dos outros numa equipa. Foi felicidade geral esse triunfo, recebi abraços de todo o Portugal", argumenta Marcos Severo, escalpelizando as memórias dessa saída festiva do palco dos encarnados. "Foi um bom jogo e quando terminou foi uma grande festa. Comemorei com os adeptos que foram à Luz, que estavam atrás da baliza, onde fiz os meus golos. Depois no balneário foi algo épico, entre muitos abraços. Não tinha noção exata do feito, foi como se tivéssemos ganho um título. Fui chamado para entrevistas, até me assustei com a quantidade de repórteres. Queria dar meia volta. Quando vínhamos de autocarro, o meu telefone não parava de tocar, eram vários jogadores e amigos a tentar dar-me felicitações", rebobina.
"No fundo foi um dia bem iluminado, que acontece uma vez na vida. Entrei na história, o Salgueiros vencer na Luz era um feito para poucos. Segunda-feira tive de sumir, que o telefone não parava. Recordo que houve um clube rival do Benfica que nos deu um prémio. Houve muito êxtase, momentos que vou guardar para sempre. Guardo os cachecóis do Salgueiros até hoje. Fiz dois golos mas não importa quem marcou. Foi igual, ninguém joga sozinho. Sinto muito Benfica e Preud'Homme", graceja Marcos Severo, companheiro nesse Salgueiros de Madureira, Pedro Espinha, Renato, Abílio, Luís Carlos, Luís Manuel, Milovac, Nandinho ou Vinha.
"Esse balneário era fora-de-série, os adeptos também eram incríveis, acompanhavam-nos muito. Eu era para jogar no Leiria, estive lá uma semana mas não gostei...Pintou o Salgueiros e foi amor imediato, fui muito bem acolhido. Foram todos grandes amigos aí, posso dizer que convivi mais com Zoran, Jorge Silva, Chico Fonseca, Luís Carlos e Nandinho", recorda o antigo atacante brasileiro. "Naquela época estávamos muito mais presos aos clubes. Só quando consegui comprar o meu passe é que o empresário me apresentou esta chance de jogar em Portugal. Vim com muita vontade, apostado em ser competitivo em cada treino. O Salgueiros tinha um grande espírito, uma grande alma, de início custou um pouco mas ambientei-me e acabei como artilheiro da equipa e um 10º lugar. Marcar é sempre bom, posso honrar-me de ter marcado ao Benfica e FC Porto", atesta Marcos Severo, percorrendo os jogadores que mais o marcaram em Portugal.
A saga de um desodorizante
"Havia Preud'Homme, Aloísio, Sá Pinto, Edmilson e no Salgueiros Chico Fonseca, Abílio, Luís Carlos, Zoran ou Milovac", evidencia, aceitando particularizar aqueles que injetavam alegria suplementar. "Era um grupo de muitos brincalhões como Chico Fonseca, Jorge Silva, Tony, Nandinho. Eu era rezinga. Nunca esquecerei esse ambiente em Vidal Pinheiro. O Zoran ensinava-me umas palavras em sérvio e num aniversário dele acabei a soltar uma palavra, que era um palavrão. Ficaram todos a olhar-me, principalmente as mulheres. Foi constrangedor e tive de pedir desculpa", recua, dando conta também das suas partidas.
"Deu-se um caso giro no balneário com o desodorizante. Eu e o Luís Carlos usávamos uma grande lata verde. Depois do banho, já nos estávamos a vestir, dou com o Tony ao meu lado, de costas para mim, acabei acionando o spray na cabeça dele, parecia que tinha ficado com o efeito de um extintor de incêndio. Era só pó branco e ele desatou a correr perante uma gargalhada geral. Sempre que eu pegava no desodorizante, ficavam todos com medo!", ironiza Marcos Severo, que se afastou do futebol, dedicando-se a venda de imóveis depois de ter sido proprietário de uma loja de artigos desportivos", conta, não enjeitando um olhar ao corrente Salgueiros, em dificuldades no Campeonato de Portugal.
"Tenho acompanhado e sei que não está fácil, Portugal tem muitas equipas fortes e muita concorrência nessas divisões de baixo. É complicado subir, mas eu quero acreditar que a tradição do Salgueiros acabará por prevalecer. Vai ter de formar uma equipa aguerrida, mesmo que isso seja mais difícil hoje, porque o jogador atual pensa mais em si que no coletivo, cada um quer ser estrela. A ideia de grupo desapareceu um pouco e o jogador pensa em dar o salto até outro clube, assim o Salgueiros não tem oportunidade de ficar com uma base forte durante quatro ou cinco anos, que era o ideal para dar certo. Mas estarei sempre torcendo...", confessou Marcos Severo, a viver em São Leopoldo, perto de Porto Alegre, no Rio Grande do Sul. "É um ambiente próximo do Porto, faz chuva, neve e tenho aqui umas vinhas.", brinca, também chamado de Cantona de Paranhos, alcunha que ficou após o primeiro golo efusivamente celebrado correndo na direção dos adeptos, como sempre fazia e levantando a gola para comemorar a essência e aura única do francês. "Eu era fã e o Cantona havia-se retirado do futebol no final da época anterior. Achei logo uma forma de o homenagear no Salgueiros e o título pegou".