Movimentos com ramificações no futebol, com ideologias neonazis e antissemitas ganham preponderância no poder político. Manifestações em Poltava são comuns, como no último jogo do Vorskla.
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Adeptos da claque do Vorskla Poltava exibiram, no encontro de domingo com o Desna, t-shirts alusivas a Adolf Hitler numa manifestação clara e despudorada de uma corrente ideológica que ganha terreno durante esta década no segundo maior país europeu e que teve grande influência na crise política de 2014 e consequente guerra civil: a extrema-direita. E tudo começou com a infiltração de ideologias ultranacionalistas e antissemitas em claques de clubes de futebol, um palco para a difusão dos valores que defendem e angariação de novos combatentes ainda jovens, nomeadamente com o Sect 82, a claque do Metalist.
Em Poltava, onde o Sporting atua amanhã para a Liga Europa, em abril deste ano (no dia 20 que assinala o nascimento de Adolf Hitler), o monumento de homenagem às vítimas do Holocausto foi profanado com pinturas de suásticas e expressões como "Heil Hitler!" ou "morte aos judeus", sinal de que a inclinação de várias fações de ucranianos pelas ideologias neonazis está patente em todo o território. Azov, Milícia Nacional, Sector de Direita, C14, Patriotas da Ucrânia, Juventude Sóbria e Zangada, Tradição e Ordem, Assembleia Socialista Nacionalista, Svovoda, White Hammer e Svovo são apenas alguns dos grupos paramilitares do país.
A crise que a Ucrânia atravessa começou em 2014. O país tornou-se independente da União Soviética em 1991, e em 2014 o presidente Víktor Yanukóvich, próximo do Kremlin, pró-russo, começou a afastar-se das políticas que conduziam o país rumo à União Europeia. Começaram então as manifestações "Euromaidan" (novembro de 2013), das correntes pró-UE e anti-Rússia, e o conflito armado irrompeu rapidamente (início de 2014). Yanukóvich fugiu para a Rússia e perante a eleição de Petró Poroshenko, a favor da entrada na UE e na NATO, o Kremlin respondeu com a ocupação e anexação da península da Crimeia e de Sebastopol, onde os habitantes são maioritariamente russos. Seguiram-se ataques de supostamente rebeldes pró-russos (é do entendimento geral que estes foram armados e ajudados pelo governo russo) nas províncias de Donetsk e Lugansk, que se declararam repúblicas populares autónomas, deixando o país dividido e fragilizado, além de obviamente com grande instabilidade sócio-política.
A Ucrânia, que herdara um exército poderoso dos soviéticos, tinha entretanto as suas forças em declínio, mal preparadas e em fase de desarmamento (baixaram dos 780 mil efetivos em 1992 para os 130 mil em 2014), pelo que não tinha condições para se defender. É aqui que entram os movimentos nacionalistas que tinham começado nas claques dos clubes de futebol, mas que entretanto tinham evoluído, tendo em conta a situação do país, para milícias ou batalhões, grupos paramilitares a operarem ao estilo de vigilantes nas ruas e a combaterem pelo país praticamente com o consentimento governamental. O principal e mais conhecido é o Batalhão Azov, fundado em Mariupol por Andreyi Biletskyi, ex-Sect 82 (claque do Metalist) e hoje membro do parlamento.
Quando a guerra contra os separatistas estalou, o grupo Azov e mais algumas dezenas de milícias combateram ao lado do exército ucraniano, acabando por serem integrados nas forças armadas e na guarda nacional do Estado. Esse sentimento de agradecimento do governo para com as milícias é considerado perigoso pelo países ocidentais, uma ameaça para o bem-estar político da Ucrânia e coloca até em risco o próprio presidente Poroshenko, com os pró-russos a rotularem o seu governo de "junta fascista"...