Tendo como permanente travão a pandemia, o recandidato à presidência garante ter insuflado o Vitória de Guimarães de estabilidade e condições estruturais essenciais. Os reflexos desse trabalho, segundo Miguel Pinto Lisboa, poderão manifestar-se nos próximos três anos.
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Os dois anos e sete meses que leva na presidência dão-lhe vantagem para as eleições?
-Conferem-me experiência adicional. Foram dois anos e sete meses de muitas dificuldades, com dois anos de pandemia. E a pandemia teve um impacto brutal nos contextos económico e social. Apesar de tudo, conseguimos ultrapassar todas as dificuldades. Temos a clara noção do que já fizemos, do que estamos a fazer e do que temos que corrigir. Temos um capital de experiência que pode acrescentar algo ao futuro do Vitória.
Receia ser penalizado pelos últimos resultados negativos da equipa A?
-Os sócios do Vitória não são ingénuos. É claro que os resultados desportivos são penalizadores, mas há que distinguir o que é conjuntural. Eu só tive duas épocas desportivas completas e a primeira nem foi preparada por nós. Mesmo com as dificuldades que apareceram, não deixámos de estreitar as diferenças para os nossos rivais em termos de infra-estruturas, de fazer uma aposta concreta na formação, de conseguir a nossa independência institucional, de ter um lugar na direção da Liga, de ter um lugar na administração da Liga Centralização. O meu mandato coincidiu com um contexto económico-social inesperado. Em 100 anos, nunca o Vitória viveu algo assim e, no entanto, superámos as dificuldades.
Se o clube não estivesse em período eleitoral, poderia estar a ponderar o despedimento de Pepa?
O Vitória não está em autogestão. Como presidente, até ao dia 5 de março tomarei todas as medidas necessárias para que o clube tenha sucesso. Não entendo que o despedimento de um treinador seja a solução os resultados negativos que tivemos. Apresentámos no verão um projeto para três anos, estamos conscientes das dificuldades e não podemos encarar de forma leviana os resultados menos positivos. O mais fácil é olhar para o lugar do treinador, mas nós entendemos que o Pepa continua a ter as mesmas condições que tinha no início para ser o líder deste projeto. Eventualmente desperdiçou-se algum capital de confiança dos adeptos, mas nós, os decisores, temos que apoiar e ajudar, ultrapassando juntos as dificuldades. Se andarmos a retroceder nas decisões, voltamos sempre à estaca zero.
As vendas de Tapsoba e Edwards foram os pontos altos da sua gestão?
Com essas operações, conseguimos atingir um dos nossos objetivos que era elevar o patamar de valor dos atletas do Vitória.
Que decisões tomou e que hoje já não tomaria?
O nosso projeto tinha por base a formação, a prospeção e a valorização do ADN Vitória. Não alterámos uma vírgula nesse projeto. Em determinados momentos, tivemos de dar mais foco numa dessas áreas e menos noutras, mas o projeto foi sempre o mesmo. Na execução, admito que cometemos alguns erros. Estão identificados e não serão repetidos. Na época anterior, tivemos um plantel mais elevado do que desejaríamos.
Como era o Vitória quando assumiu a presidência e como se encontra nesta altura?
Em termos desportivos, o Vitória já tinha resultados inconsistentes. O clube não atinge dois top-5 consecutivos na I Liga desde 1998. Este clube precisa de ter estabilidade e consistência para ter sucesso. Na formação, o clube tinha dificuldade em reter talentos, perdia muitos jogadores para os nossos rivais. Havia incertezas na SAD e a situação financeira era frágil. Hoje temos um clube melhor preparado em termos estruturais para ter sucesso de forma consistente e que tem mais capacidade para reter talentos na formação. O Vitória teve 27 atletas nos diferentes escalões da Seleção, fez chegar 15 atletas trabalhados na formação à equipa principal e profissionalizou todas as áreas. Temos equipas técnicas profissionais, equipas médicas, de alto rendimento e observação em todos os escalões. Fizemos ainda investimentos estruturais que nos dão maior capacidade. Um atleta que entre no Vitória vê logo um caminho claro para atingir a principal equipa. Valorizámos os nossos ativos e só deixámos sair os mais valiosos pelos valores devidos no mercado.
Quer explicar essas fragilidades da SAD?
Desde a sua constituição, a SAD do Vitória sempre teve alguma fragilidade. Não é de agora, são números. Mas não se pode andar sempre a expor na praça pública essa fragilidade. O que eu quero dizer é que o Vitória não estava a tocar no céu tal como agora não está no inferno. Essas fragilidades existiram sempre. Cabe-nos resolver os problemas. Não podemos enveredar por narrativas do tipo "o Vitória está perto do caos ou do abismo". Temos que ter uma liderança firme e convicta, ultrapassando os problemas. Todas as equipas diretivas do Vitória fizeram o melhor possível. Hoje há a pessoas a dizer que é necessário fazer uma auditoria à entrada... Eu fiz isso e não andei a publicitá-la. É só um instrumento para trabalharmos, para encontrarmos soluções. E elas podem passar por vendas extraordinárias. Se não forem possíveis pelos valores que nós entendemos, temos que ter outras soluções.
Por que motivo prosseguem as épocas iô-iô em relação a apuramentos europeus?
Queremos superar esse problema com consistência. Depois de dois sétimos lugares nas últimas duas épocas, seria mais fácil, em ano de eleições, apostar mais na equipa principal... mas não nos desviámos do nosso caminho e esse passa pela aposta na formação. Quem não entender isso, não percebe como se dirige um clube em Portugal. Todos os clubes portugueses devem fazer uma aposta forte na formação e na prospeção de talento.
Confirmando-se a parceria com os patrões do Aston Villa, com posição minoritária na SAD, que investimento poderá ser canalizado para o Vitória no próximo triénio?
Nas várias reuniões que fomos mantendo, inclusive presenciais, ficou sempre claro que não nos interessa uma grande injeção imediata. Mais do que um investidor, o que temos vindo a construir é uma parceria e para além do que ela pode aportar em termos de equipa principal, de presença no mercado ou de internacionalização da marca, o que nos importa são os ganhos estruturais. Sendo concreto: o projeto da nova Academia é essencial para o nosso futuro e só o conseguimos acelerar realmente com um parceiro como este. Agrada-me que não estejamos a falar de um fundo remoto de que nunca ninguém ouviu falar, mas de um parceiro de renome, cujo trabalho pode ser facilmente avaliado. E não aceito que diminuam os passos que o V. Guimarães já foi capaz de dar, porque é fácil entender que ninguém com a seriedade do CEO do Aston Villa permitiria a divulgação de uma carta se não houvesse uma aproximação clara e uma vontade firme de concretizar esta parceria. Daremos início à construção da academia no próximo triénio. O projeto já está na Câmara Municipal e, tendo um parceiro, poderemos ter uma conclusão durante o mesmo período temporal.
A centralização dos direitos televisivos poderá catapultar o Vitória para outra dimensão? Tem uma estimativa da verba que se destinará ao clube?
Temos um programa que projeta o crescimento do Vitória de forma orgânica. Esse programa foi feito sem contar com a externalidade da parceria estratégica ou com a externalidade positiva das receitas televisivas. O Vitória está na administração da Liga Centralização e tem-se trabalhado no sentido de fazer uma estimativa desses direitos televisivos. Os valores desses direitos vão aumentar e acreditamos que teremos um impacto positivo. Ainda estamos numa fase de análise e de estudo. Será o mercado a definir valores, mas trabalhamos para que todos os clubes passem a ter receitas superiores às que têm atualmente.
Na última cimeira de presidentes, António Salvador, o presidente do Braga, falou na necessidade de alterar os quadros competitivos, propondo a redução do número de clubes na I Liga e um pla-yoff de apuramento do campeão nacional. Que opinião tem sobre essa proposta?
O que disse António Salvador só vincula António Salvador. É uma ideia dele, eventualmente será analisada. Terá de se perceber qual será o impacto de uma alteração dos quadros competitivos. Temos é que maximizar a nossa receita televisiva independentemente dos quadros competitivos vigente. Noutros países há direitos televisivos centralizados com bons resultados sem playoff, como acontece em Espanha, Inglaterra e Alemanha. Podemos discutir esse tema, mas sem perder de vista o foco da centralização dos direitos. Uma eventual reforma dos quadros competitivos não pode fazer com que percamos de vista um objetivo maior, que é a centralização dos direitos televisivos. Nessa questão, todos os clubes estão interessados. Já na reforma dos quadros competitivos sabemos que há divergências. Não há unanimidade. Se colocarmos a alteração dois quadros competitivos como condição, vamo-nos desviar do essencial.
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