ENTREVISTA - Jesualdo Ferreira completa esta segunda-feira 75 anos de uma vida cheia de futebol, de muito futebol. O JOGO não podia deixar passar a data, numa altura em que acaba de conseguir a permanência do Boavista.
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O rosto fechado que é sua característica pode levar-nos a pensar que estamos perante um ser frio, mas Jesualdo Ferreira, ou o professor, como merece ser tratado, é um indivíduo divertido, embora exigente quando toca ao trabalho.
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Aos 75 anos, sente-se com a mesma paixão pelo futebol, pelo jogo, de quando começou há mais de 40 anos, aliás, diz mesmo que está ainda mais apaixonado e não se imagina longe dos relvados. A conversa com O JOGO foi longa e muito agradável. Carvalhais, em Mirandela, viu-o nascer há 75 anos. Para nós, parece que o futebol sem ele não tinha a mesma piada. Vamos então ao resultado da conversa. Ah, e parabéns, professor...
Numa carreira tão longa, por que é que esta foi a época mais difícil para si, como disse no final do último jogo?
-O ano de 2020 foi complicado. A pandemia teve uma influência muito grande no mundo e foi o ano que coincidiu com a minha ida para o Santos, onde acho que fiz um bom trabalho. Infelizmente, não m deixaram ir mais longe. Surpreendeu-me depois o convite do Boavista. Tive uma história com o Boavista no passado, não vou estar a repetir, e acabei por vir para o Boavista com um grande entusiasmo e com uma segurança muito grande naquilo que podia fazer. Em toda a minha vida, parti para os projetos sempre com uma enorme segurança e confiança no meu trabalho e na minha capacidade, embora isso nem sempre seja suficiente para que as coisas corram bem.
"O convite surgiu numa altura em que o Boavista não estava mal, mas em que se entendia que podia estar melhor"
Mas não me respondeu à pergunta...
-Já lá vou. O convite surgiu numa altura em que o Boavista não estava mal, mas em que se entendia que podia estar melhor. A verdade é que ao longo do tempo fui percebendo que só com grande entreajuda entre todos poderíamos chegar ao fim e dizer, como aconteceu, conseguimos. Sim, foi muito difícil, mas conseguimos acabar em 12.º lugar, algo impensável há algumas semanas atrás. E foi muito difícil porque a época foi atípica, não teve público, que é fundamental para o futebol e os adeptos do Boavista são muito importantes, e a equipa, como disse, estava em formação, o que às vezes colide com a exigência da competitividade. Tudo isso tornou esta época das mais difíceis da minha vida.
E, agora, professor, o que é que pensa que pode ser o Boavista?
-Este Boavista tem que crescer mais num futuro próximo, porque a história do clube não permite andar tantos anos quase numa subalternidade, longe do protagonismo. Foi uma das razões que me levou a aceitar o convite do Boavista. A equipa tem condições para crescer muito. Repare, a equipa estava em formação, com jogadores jovens, oriundos de vários países, diferentes culturas, A época não começou bem, com jogadores a chegarem em tempos diferentes, com o covid também a atacar. As contrariedades que aconteceram no início da época, continuaram noutras vertentes ao longo da temporada. Acredito que agora temos condições para andar noutros patamares e longe de aflições. A maior parte destes jogadores cresceu num cenário de dificuldade e isso é muito bom.
Você é um adepto do 4x3x3, mas neste Boavista teve de ser mais criativo, vimo-lo a jogar noutros sistemas...
-Tive que ir à procura daquilo que eram as melhores soluções táticas. O Boavista marcou 36 golos, ficou à frente de muitas equipas, mas sofreu quase 50 golos... Foi preciso ir encontrando as melhores soluções para que pudéssemos ser uma equipa mais competitiva. O trabalho de um treinador é encontrar os melhores processos para ir introduzindo as suas ideias, não falo em sistemas. Não tivemos esse tempo. Desde que cheguei tivemos uma paragem apenas, foi jogar e treinar muito pouco. A própria calendarização em Portugal, tal como em toda a Europa, acabou por estrangular muita coisa. Cheguei, tivemos três treinos e fomos jogar logo com o Paços de Ferreira, e depois foi sempre jogos. Tivemos que encontrar soluções que facilitassem a vida aos jogadores e não aquelas que o treinador gostaria. O 4x3x3 é o sistema que eu prefiro como muitos treinadores, mas a questão é ter jogadores para isso. Foi fundamental encontrar três sistemas que fossem cómodos para os jogadores responderem como prendíamos.