Heróis da Taça: surpresa da Bairrada tem África, um mestre e o capitão na fábrica
Thierno Niang é melhor a marcar golos do que a falar português. Foi com o carimbo do senegalês que o conjunto do distrito de Aveiro eliminou o Famalicão da Taça de Portugal.
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Quatro vitórias consecutivas. Foi com este registo que o Famalicão, candidato a subir à I Liga, se apresentou no Municipal de Águeda. Só que naquele Estádio ainda ninguém conseguiu ganhar esta época e não foram os minhotos a quebrar este pecúlio. Resultado, o emblema da Bairrada chutou o conjunto do segundo escalão para fora da Taça de Portugal à custa de um golo de Thierno Niang. Se em Fátima houve, por exemplo, uma surpresa com sotaque ucraniano, aqui há cheiro de África nos remates certeiros do atacante nascido em St. Louis (Senegal) e que até aos sete anos fez das ruas um campo de futebol para, em 2015/16, chegar a Portugal pela mão do Leixões.
"O meu empresário viu-me jogar no Senegal e vim para o Leixões com um contrato de dois anos", conta. A aventura não correu bem devido a um grande problema chamado barreira linguística. "A adaptação foi muito difícil pois é muito complicado falar português", lembra. Complicada foi igualmente a experiência no Freamunde na época passada. "O clube não tinha dinheiro para pagar. Tive quatro e cinco meses de salários em atraso. Os amigos é que me emprestavam dinheiro para comprar as coisas", recorda.
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Esses tempos já lá vão pois Niang encontrou em Águeda a estabilidade necessária. Herói da prova-rainha é "todo o plantel" e agora que venha qualquer um "dos três grandes". Mas, para Henrique Nunes, o treinador dos bairradinos, não é bem assim pois o técnico tem uma, ou melhor, duas preferências. "Queríamos o Benfica ou o FC Porto em nossa casa pois poderiam encher o estádio", explica. Henrique Nunes também é mestre no que toca a subidas de divisão pois já promoveu Feirense, Gondomar e Arouca à II Liga e ambiciona conseguir o mesmo em Águeda. "O projeto prevê uma subida nos próximos anos e se calhar foi por isso que me foram buscar", atira.
Henrique Nunes e a readaptação
Apesar de ter três campeonatos da extinta II Divisão, agora Campeonato de Portugal, no currículo, Henrique Nunes teve de se readaptar ao terceiro escalão do futebol nacional pois a última experiência tinha sido no Arouca quando subiu os arouquenses em 2009/10. "A adaptação foi difícil pois não tinha um conhecimento profundo e agora vou conhecendo melhor as equipas e os atletas", conta o treinador, que passou dois anos em Macau, país onde um jogo que decidisse o título não tinha mais que... 200 espectadores.
Dinheiro já será para o clube
O processo Totonegócio fez com que a Federação Portuguesa de Futebol assumisse, atrás de receitas com os prémios da Taça de Portugal, as dívidas de vários clubes. O Águeda saldou essa verba com a vitória frente ao Famalicão e a partir de agora tudo o que vier é lucro, especialmente se o sorteio trouxer um grande. "Isso seria uma boa notícia. O objetivo era chegar à terceira eliminatória para ajudar a compor o orçamento anual", refere o presidente Rui Anjos. Em Águeda trabalha-se ainda à boa maneira antiga, apesar do assédio estrangeiro. "Temos cerca de 150 patrocinadores. A Câmara Municipal e as empresas locais e regionais ajudam-nos muito. Já fomos abordados por 30 investidores, da China, Brasil, Coreia do Sul ou França, para constituirmos SAD mas nunca nos deram garantias de sustentabilidade", revela.
Iafai: um capitão na fábrica
Iafai é o capitão do Águeda e um dos cerca de cinco jogadores que não vivem só do futebol. O médio trabalha numa fábrica até às 17h00 e depois vem treinar, tal como o subcapitão Rodrigo, lateral-direito, que ultimamente anda a jogar à esquerda, e que também não é profissional. Iafai nasceu na Guiné-Bissau mas veio para Águeda com dois anos, tendo-se apaixonado pelo clube. São filhos da casa e pedem que o sorteio traga "um grande" ou "uma equipa que dê para passar outra eliminatória". Já Rodrigo diz que seria "um orgulho" ver o Estádio cheio.