FC Porto fez, no mesmo dia, ida e volta de comboio para jogar uma meia-final em Lisboa
Benfica e FC Porto sempre encararam a Taça da Liga de forma distinta: Quim, antigo guarda-redes oo Benfica, até foi levado em ombros; já os dragões viajaram para Lisboa em 2009 no dia do jogo.
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Benfica e FC Porto têm históricos bem diferentes na Taça da Liga. Sete títulos em 11 edições para os encarnados, nenhum para os dragões, reflexo claro de uma aposta maior na competição por parte das águias. A final-four começa hoje e pela primeira vez conta com os três grandes e o Braga.
O FC Porto, apesar da sexta presença nesta fase da prova, esteve sempre longe de a priorizar. Palavra a Jesualdo Ferreira. "A Taça da Liga começou como um intruso no futebol português e é natural que, de início, os clubes não lhe tenham dado a importância que, finalmente, tem hoje", contou a O JOGO o ex-treinador dos azuis e brancos.
Hoje há clássico e é encarado a doer. Benfica e FC Porto defrontam-se esta noite e apostam forte em ganhar e ir à final, mas dantes era diferente. Na Luz, a prova foi sempre prioridade; no Dragão era terceira escolha.
Jesualdo diz que sempre quis "vencer a prova". Ainda assim, em 2008/09 disputou a meia-final em Alvalade com quatro juniores e o ainda juvenil Sérgio Oliveira - não utilizado -, viajando de comboio na manhã de 4 de fevereiro de 2009 para o jogo nessa mesma noite: "Não foi falta de respeito. Fomos e voltámos no mesmo dia para ganharmos tempo. Simplesmente, o clube estabeleceu outras prioridades. Os emblemas definem estratégias, mas não a meio dos anos desportivos."
Andrés Madrid lembra-se bem do 4-1 sofrido em Alvalade: "A Taça da Liga era encarada como uma terceira competição e não mudava grande coisa numa época."
No lado do Benfica, esse ano de 2009 marcou a primeira conquista. Rui Águas estava no scout encarnado, ao serviço de Quique Flores, depois mais um ano com Jorge Jesus, e vinca a ambição: "Sempre foi encarada para vencer, ao contrário de outros que não a respeitaram como deviam." Quim, que triunfou duas vezes pelas águias e uma pelo Braga, detalha as diferenças. "É sempre algo para ter no currículo e, apesar de alguma rotação era um objetivo assumido pelo Benfica.
"O Quique Flores mandou-me aquecer e disse: "Vais entrar para bater um penálti." Acabou por não ser preciso, já que o Carlos Martins concretizou o quinto."
No Braga, sabia-se como era importante vencer as Taças, porque ainda não era um candidato ao título", afirmou, detalhando a final de 2009, na qual defendeu dois penáltis frente ao Sporting depois de tirar a titularidade a Moreira, que alinhava nas Taças: "Nem esperava jogar... O mais insólito foi que os jogadores do Sporting nem queriam receber as medalhas... o Pedro Silva atirou-a, o Paulo Bento reclamou pelo penálti marcado a nosso favor. Claro que ser levado ao carrachucho [em ombros] quando ganhámos me fez esquecer tudo o resto."
Jorge Ribeiro tem uma visão diferente dessa final. "O Quique Flores mandou-me aquecer e disse: "Vais entrar para bater um penálti." Acabou por não ser preciso, já que o Carlos Martins concretizou o quinto, mas lembro-me do nervoso miudinho durante a semana. Sendo da formação do Benfica, poderia ganhar ali o meu primeiro troféu. Felizmente concretizei-o", atira, enaltecendo a entrada de Jesus, com quem só fez a pré-época seguinte. "Logo na apresentação prometeu e, quando entrou no balneário, disse: "É para ganhar tudo!""
Nesse ano, o Benfica, depois de passar os oitavos de final da Liga Europa, viajaria de Marselha diretamente para o Algarve. Jesus deixou Cardozo, Saviola e Ramires no banco, mas Miguel Lopes, titular no encontro pelo FC Porto, usa a rotação da baliza justificando o insucesso (3-0), numa partida em que os principais craques azuis e brancos até foram titulares: "Jogou o Nuno Espírito Santo na baliza. Era uma competição encarada como uma prova menor, sem importância." Termina Jorge Ribeiro: "No ano do Quique, já estávamos fora da Taça de Portugal, da Liga Europa e longe no campeonato [a cinco pontos do FC Porto]. Não poderia ser uma época sem ganhar títulos, embora, claro, não salve uma época."
" A competição não tinha grandes incentivos financeiros, mas o André Villas-Boas queria ganhar."
Villas-Boas não pedia para levantar o pé
Que a Taça da Liga se tem cimentado, não há dúvidas. Ainda que não com o peso de uma Taça de Portugal, tanto Sereno como Miguel Lopes admitem que os treinadores do FC Porto pensam em vencê-la, independentemente de poder não ser uma prioridade. "Nenhum treinador do FC Porto dizia que era para levantar o pé. A competição não tinha grandes incentivos financeiros, mas o André Villas-Boas queria ganhar. Infelizmente, nessa temporada ganhámos tudo menos a Taça da Liga", explica Sereno quanto à prova na qual os dragões não passaram sequer a fase de grupos.
Já Miguel Lopes vê ambição atualmente: "Acho que depois da chegada do Sérgio Conceição ao FC Porto, as coisas mudaram. Representa um título para os jogadores e para o clube, que fica sempre bem no palmarés de qualquer treinador."
Assis vê justificação conveniente
Nuno Assis (na foto) saiu do Benfica em 2008/09. Ajudou à celebração em 2005, campeonato ganho 11 anos depois, e diz que o clube nunca fez "distinção entre provas" e que o "discurso era claro: vencer." O ex-médio deixa farpas à suposta desvalorização azul e branca: "As pessoas vão buscar esse tipo de diálogo, que serve de desculpa. Quando alguém está longe de ganhar o campeonato, já passa a valorizar a Taça da Liga. Todos querem ganhar." Já Quim lembra a ideia de Bruno de Carvalho por protesto às arbitragens: "O Sporting até falou em levar juniores."
Formato de final-four engrandece prova
Apesar da sobrecarga de jogos que muitos apontam na fase de grupos da competição, o formato de final-four é elogiado. "Ficou mais interessante", diz Andrés Madrid. "A organização foi promovida e cuidada", assevera Rui Águas. A menor rotação de elementos das principais equipas é também um dado elogiado pelos entrevistados.
Quatro grandes em estreia diferente
Os quatro primeiros da Liga estão na final-four da Taça da Liga e nas meias-finais da Taça de Portugal, o que nunca acontecera em simultâneo. Para Rui Águas, isso "representa capacidade", em "coincidência difícil de repetir." O experiente ex-jogador, agora selecionador de Cabo Verde, concretiza: "Esta situação mostra o poder dos quatro emblemas que comandam o futebol nacional."
Quim: "O que os estrangeiro mais estranham é a Taça da Liga não dar direito às competições europeias."
Estrangeiros queriam vaga europeia
A Taça de Portugal dá ao vencedor uma vaga para a fase de grupos da Liga Europa, um fator aliciante, naturalmente, para qualquer clube. A Taça da Liga nada concede; ao contrário do que se verifica em Inglaterra, por exemplo, no qual uma vitória garante o acesso aos grupos da segunda prova da UEFA. Mais do que a festa emblemática do Jamor, Quim vê nesta a grande diferença entre provas: "Os estrangeiros já sabem que existem as duas competições e que no Jamor se dá uma festa fantástica, sem paralelo. Mas o que mais estranham é a Taça da Liga não dar direito às competições europeias."
Unanimidade quanto ao crescimento
À12.ª edição, questionam-se os modelos da competição e a sobrecarga em várias fases da época. Já não se levantam, porém, as dúvidas iniciais quanto à extinção da prova. "Já entrou no quadro competitivo", diz Jesualdo Ferreira.