Superou operações aos ligamentos cruzados e à rótula de um joelho, que o levaram a pensar em voltar às origens, mas sofreu com as críticas pela falta de golos. Agora é o jogador mais caro em Portugal
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Darwin Núñez é o exemplo perfeito do contraste que a vida de futebolista pode proporcionar. Depois das dificuldades na infância, é agora a contratação mais cara de sempre em Portugal, fruto dos 24 milhões investidos pelo Benfica.
Após a fome na infância, esteve perto de desistir devido às graves lesões
Para trás ficaram os dias em que o pai trabalhava na construção civil e a mãe, governanta, ainda saía depois do trabalho à rua para recolher garrafas de vidro e ganhar assim um dinheiro extra. Tudo para lutar contra a fome.
Muito ligado à família e às origens, Darwin teve de lutar contra as saudades da sua terra natal, Artigas, a norte do país, junto à fronteira com o Brasil, mas também contra lesões graves, que quase o fizeram abandonar o sonho de se tornar futebolista e voltar à "base".
Depois de apenas 24 jogos pelo Peñarol, e quatro golos, Darwin teve a oportunidade de dar o salto para a Europa em 2019 e tudo fez para consegui-lo. O objetivo era claro: recompensar a família pelo esforço. Por isso, comprou uma casa nova aos pais com o prémio da transferência para o Almería. "Estou-lhes agradecido, sempre lutaram para dar-me coisas. Agora vou poder ajudar a minha família", explicou.
"Cheguei a ir para a cama com o estômago vazio, mas a minha mãe foi deitar-se mais vezes sem comer para que nós estivéssemos alimentados. Não me esqueço disso", disse há um ano em entrevista ao "El Observador", frisando: "Quando não tinha o que comer, passava o dia todo na escola e quando saía ia treinar."
O novo camisola 9 da Luz, que não escondeu as lágrimas na visita à Luz, a apresentação, tentou a aventura no Peñarol aos 14 anos, em 2013. Alto e magro, convenceu o olheiro do Peñarol, José Perdomo, pela forma como driblava os adversários quando este foi observá-lo a Artigas, mas apesar da recomendação só à segunda, no ano seguinte, passou nos testes no clube e ficou de vez.
O futebol estava no sangue. O irmão mais velho, Júnior, já tinha sido "agarrado" pelo Peñarol. Silvia Ribeiro, mãe de Darwin, não queria ver mais um filho a 600 quilómetros de casa. Darwin foi, mas Júnior voltaria. O irmão, médio, com tanto potencial como o reforço encarnado, não resistiu à distância e desistiu: tornou-se polícia.
Tentado pelo Benfica, Cavani é uma "referência" para Darwin
Darwin, desde cedo, destacou-se pelo seu físico. De tal forma que essa estampa lhe permitia impor o respeito aos adversários e... aos colegas. Apesar da timidez nos primeiros tempos no clube de Montevideu, foi-se adaptando e integrando. Jovem, apesar de o Peñarol não ter registos de indisciplina, ainda pregava algumas partidas ou até mentiras, aproveitando por vezes para se escapar à escola.
Avançado desde sempre - teve uma breve "aventura" como médio -, Darwin sentiu, porém, problemas para conviver com as críticas quando a seca de golos foi maior. Superado já mais de ano e meio de paragem por operações num joelho para debelar lesões nos ligamentos cruzados e na rótula, esta no regresso após recuperação da primeira lesão - o irmão impediu-o de desistir do futebol -, o ponta de lança travou na falta de pontaria.
Acusava o peso das críticas nas redes sociais e refugiava-se no quarto - o pai, Bibiano Núñez, defendia-o e chegava a ameaçar os críticos. Tudo mudou com ajuda do psicólogo dos sub-20 do Uruguai. Voltaram os golos e o salto para Espanha não demorou. Agora terá de saber conviver com outra realidade e o facto de ser o reforço mais caro das águias, que diz não o incomodar.
Também o ex-Benfica e ex-FC Porto "Cebolla" Rodríguez o marcou
"É um orgulho para mim, não é um peso, é uma responsabilidade", frisou na apresentação, ele que já assumiu no passado ter "Cavani como referência" enquanto jogador ou Cebolla Rodríguez, ex-Benfica e ex-FC Porto, e agora figura no Peñarol.
Ofereceu cabazes alimentares na pandemia
Agora já noutra situação, Darwin não esquece que, quando a família já estava em Montevideu, a apoiá-lo, chegou a perder a casa fruto das cheias no rio Quaraí. Tudo recuperado, é ainda a base da família, mas durante a pandemia o avançado fez questão de ajudar. Ofereceu mil cabazes alimentares aos mais necessitados, juntando-se à onda solidária dos internacionais uruguaios.
Seleção: estreia a marcar com muita ansiedade à mistura
A 15 de outubro de 2019, Darwin estreou-se pela seleção principal do Uruguai. E logo com um golo. Lançado aos 75", marcou aos 80" e evitou a derrota (1-1) com o Peru, no jogo 200 de Oscar Tábarez como selecionador. Antes, assumiu a "ansiedade e nervosismo" por estar "ao lado de monstros", algo com que havia "sonhado" em criança. E a família sempre a par e passo de todas as emoções.