Ana Gomes a O JOGO: "A lei que protege Rui Pinto já estava em vigor e não está a ser seguida"
A eurodeputada vai visitar o denunciante do Football Leaks à prisão da PJ
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Na terça-feira, o Parlamento Europeu aprovou uma diretiva que visa reforçar o apoio e proteção aos denunciantes de crimes, numa medida que, apesar de não se aplicar diretamente a Rui Pinto, pode ser positiva para o denunciante do Football Leaks, conforme clarificou a eurodeputada Ana Gomes, em conversa com O JOGO.
"Vai influenciar política e juridicamente o que se vai passar. Esta diretiva é, sobretudo, destinada a regular as pessoas que têm uma relação laboral com uma empresa, o que não é propriamente o caso do Rui Pinto", começa por contextualizar a socialista, com uma ressalva: "O espírito da lei está na proteção dos denunciantes, dos jornalistas e das suas fontes."
A intenção do parlamento era, sublinha Ana Gomes, que esta diretiva "muito importante "fosse ainda mais alargada, para que, de forma mais explícita, cobrisse pessoas como o Rui Pinto, fora das organizações". No entanto, a eurodeputada explica que já existe jurisdição europeia perfeitamente adequada ao caso de Rui Pinto, que está detido em Lisboa.
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"Diretamente aplicável é uma norma que já está em vigor em Portugal e em todo o lado, que é o artigo 38 da quarta diretiva contra o branqueamento de capitais e o financiamento do terrorismo. Diz que os Estados-Membros estão obrigados a proteger e a criar mecanismos de proteção para os denunciantes. Protege pessoas que não estejam ligadas às empresas por laços laborais", explica Ana Gomes e lembrou que uma parte das revelações que Rui Pinto fez "tem implicações" no tipo de crimes que este artigo engloba.
Não obstante, a eurodeputada alerta que esta lei não está a ser seguida em Portugal: "Precisamente por isso é que chamo a atenção. Já é obrigatório em Portugal. O artigo é explícito."
Além disso, acrescenta Ana Gomes, norma europeia, aplicada no nosso país desde 2018, "está mal transposta", porque remete a obrigação da proteção às entidades e não aos Estados-Membros, conforme consta da diretiva original. "É uma questão que se discutirá noutro momento", conclui.
Por outro lado, a deputada ao Parlamento Europeu, a poucas semanas de terminar o mandato, vai entregar pessoalmente a Rui Pinto o prémio "Jornalistas, denunciantes e defensores do direito à informação", atribuído pela Esquerda parlamentar europeia esta terça-feira. O pedido foi feito por Antoine Deltour, denunciante do Lux Leaks, que representou o português na cerimónia.
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"Fui cumprimentá-lo e pediu-me se eu podia levar o prémio ao Rui Pinto, sabia que eu ia a Portugal. É evidente que eu disse que sim. Não vou já, porque tenho as eleições na Ucrânia [21 de abril], mas vou na semana a seguir. Já tinha pensado em visitar o Rui Pinto e agora é mais uma razão para o fazer", revelou Ana Gomes, que garantiu nunca ter falado com o denunciante do Football Leaks.
Leia na íntegra o Artigo 38º da quarta diretiva a que se refere Ana Gomes:
Artigo 38.
1. Os Estados-Membros asseguram que as pessoas, incluindo os funcionários e representantes da entidade obrigada, que comunicam suspeitas de branqueamento de capitais ou de financiamento do terrorismo, quer internamente, quer à UIF [Unidade de Informação Financeira], são protegidas juridicamente de ameaças, atos retaliatórios ou hostis, nomeadamente de medidas laborais desfavoráveis ou discriminatórias.
2. Os Estados-Membros asseguram que as pessoas que estão expostas a ameaças, atos retaliatórios ou hostis, ou a medidas laborais desfavoráveis ou discriminatórias por comunicarem suspeitas de branqueamento de capitais ou de
financiamento do terrorismo, quer internamente, quer à UIF, têm o direito de apresentar, em segurança, uma queixa às respetivas autoridades competentes. Sem prejuízo da confidencialidade da informação recolhida pela UIF, os Estados-Membros asseguram também que essas pessoas têm direito à ação judicial para salvaguardar os seus direitos ao abrigo do presente número.